EQUIPA DA ADF
Em Setembro, os terroristas dispararam três mísseis contra um barco no rio Níger, matando 49 pessoas. Testemunhas disseram que as vítimas, todas civis, se afogaram ou morreram queimadas. Os terroristas eram alegadamente membros do grupo ligado à al-Qaeda conhecido como Jama’at Nusrat al-Islam wa al-Muslimeen (JNIM).
Na mesma altura, as forças malianas lançaram ataques de contra-insurgência em três aldeias das regiões de Nara e Tombuctu. Num dos ataques, as autoridades prenderam e mataram 16 homens e um rapaz, tendo os seus corpos sido encontrados mais tarde fora da aldeia. Testemunhas disseram que as forças armadas incluíam homens brancos armados estrangeiros, alegadamente mercenários do Grupo Wagner da Rússia.
A Human Rights Watch informou em Novembro que os combatentes da JNIM mataram mais de 160 civis, incluindo 24 crianças, desde o início de Abril. As Forças Armadas do Mali, segundo o grupo de investigação, mataram cerca de 40 civis, incluindo pelo menos 16 crianças, durante as operações de contra-insurgência nesse período.
Ambos os lados do conflito foram igualmente acusados de violações, pilhagens e execuções sumárias. Os soldados do governo e os terroristas têm como alvo os civis por supostamente colaborarem com o outro lado.
“O exército (…) mata pessoas sem temer quaisquer consequências,” um aldeão disse à Human Rights Watch. “Os jihadistas também matam, raptam e queimam sem medo de serem responsabilizados. E nós, os civis, somos apanhados entre a espada e a parede no nosso próprio país.”
O Mali tornou-se independente em 1960 e viveu décadas de turbulência até ao início da década de 1990, altura em que a democracia se estabilizou e permitiu algum progresso económico e social, de acordo com a Mali Rising Foundation. Era um país pacífico e relativamente democrático, numa região frequentemente conturbada, até que um golpe militar em 2012 e uma revolta no norte do país deram início aos problemas actuais.
“O derrube do governo democraticamente eleito abriu um vazio de poder que os grupos extremistas violentos exploraram e que as Forças Armadas do Mali — com o apoio da ONU, da União Europeia e dos Estados Unidos — têm dificuldades para controlar desde então,” informou o Instituto da Paz dos Estados Unidos.
O Projecto de Localização de Conflitos Armados e Dados de Eventos (ACLED) calculou recentemente que a violência contra civis no Mali, entre Janeiro e Agosto deste ano, aumentou 38% em relação a 2022. Segundo o projecto, o Estado Islâmico no Grande Sahara, a JNIM, as Forças Armadas do Mali e o Grupo Wagner são as principais forças responsáveis.
Os combates também obrigaram os civis a abandonarem as suas residências. O Comité Internacional da Cruz Vermelha refere que, no final de 2022, mais de 400.000 pessoas tinham sido deslocadas internamente no Mali, “obrigadas a deixar as suas casas, o seu gado e os seus meios de subsistência.” O grupo de investigação Integral Human Development informou que 200.471 refugiados saíram do Mali em 2022, tendo a maioria sido registada na Mauritânia, Níger, Burquina Faso, Itália e França.
Após oito anos a tentar reprimir os terroristas no Mali, a França retirou as suas forças em 2022. A missão de manutenção da paz das Nações Unidas no Mali, que no seu auge tinha 15.000 soldados e polícias no país, vai retirar-se até ao final deste ano, por insistência da junta. Mais de 180 membros da força de manutenção da paz morreram durante a missão.
As autoridades disseram que a missão da ONU estava presa numa situação sem saída. “Se sairmos, teremos anarquia e guerra civil, especialmente contra os civis e os fracos,” disse Ahmedou Ould-Abdallah, antigo Ministro dos Negócios Estrangeiros da Mauritânia, segundo a Reuters. “Se ficarmos, estamos quase desacreditados.”
Outra organização político-militar, o Exército Nacional de Azawad, também conhecido como CSP, juntou-se aos combates. O movimento é constituído maioritariamente por combatentes de etnia Tuaregue e informou recentemente que esteve envolvido em “combates vigorosos” contra uma coluna de soldados malianos e mercenários do Grupo Wagner, segundo a Voz da América.
O ACLED relata que, à medida que as hostilidades aumentam entre as Forças Armadas do Mali, o Grupo Wagner, a JNIM e o CSP, “os civis enfrentam um risco acrescido de serem apanhados no fogo cruzado e deslocados.” O projecto alertou para a possibilidade de uma “guerra civil em grande escala.”
“Além disso, o governo de transição do Mali enfrenta tanto uma rebelião Tuaregue reavivada como uma insurgência jihadista crescente, o que representa uma ameaça maior para a estabilidade e a segurança das zonas civis em todo o Mali,” concluiu o ACLED.
A ONU também deu o alarme, afirmando que “o aumento devastador dos ataques terroristas contra alvos civis e militares” já teve “consequências humanitárias alarmantes,” segundo a Al-Jazeera.