EQUIPA DA ADF
Através da sua Iniciativa do Cinturão e Rota (ICR), a China colocou dezenas de milhares de trabalhadores em África para construírem os projectos de infra-estruturas ICR financiados por chineses em todo o continente.
Agora, num esforço para proteger os seus trabalhadores, a China está a recorrer a empresas militares privadas (EMPs).
As EMPs chinesas apareceram pela primeira vez em África, em 2010, para proteger navios chineses de piratas somalis. Desde essa altura, as empresas de segurança chinesas tornaram-se uma presença pequena, mas crescente. Pelo menos nove empresas de segurança chinesas operam na África Subsaariana, onde dezenas de projectos de ICR produzem mais de 50 bilhões de dólares em rendimento, por ano, para empresas estatais chinesas, de acordo com o analista Paul Nantulya, do Centro de Estudos Estratégicos de África (CEEA).
As EMPs da China operam num espaço jurídico incerto. Embora as Nações Unidas e a União Africana tenham banido o uso de mercenários, as restrições não dizem nada sobre as EMPs. Alguns especialistas, como Sean McFate, do Conselho Atlântico, argumentam que não existe diferença entre os dois grupos.
“’Empresa militar privada’ é um termo de arte que é um código para mercenário,” disse McFate, autor do “The Modern Mercenary” (O Mercenário Moderno), à CNBC.
A Beijing DeWe Security Service tem cerca de 2.000 contratados de segurança, no Quénia, para proteger a Linha Férrea de Bitola Padrão, construída pelos chineses e avaliada em 3,6 bilhões de dólares, que liga Mombaça e Naivasha. A mesma empresa protege os projectos de gás natural, apoiados por chineses, avaliados em 4 bilhões de dólares, partilhados com a Etiópia e o Djibouti. Outras empresas protegem as minas detidas por chineses na África do Sul, os projectos ICR na Somália e corredores de transporte no Golfo da Guiné e no Golfo de Áden.
A lei chinesa proíbe contratados de EMPs de transportarem armas internamente. Fora da China, as EMPs devem cumprir com as leis dos países onde operam. Mas elas, muitas vezes, encontram formas de contornar as restrições. Na África do Sul, onde a regulamentação de EMPs estrangeiras é rigorosa, as empresas chinesas operam através de subsidiárias locais criadas de forma especial. Em países com menos restrições, como Quénia, os contratados trabalham directamente com empresas de segurança locais, fornecendo um rendimento extra, equipamento e inteligência às empresas.
No Sudão e no Sudão do Sul, onde a China investiu pesadamente na produção de petróleo e as restrições sobre as EMPs são mínimas, os contratados chineses estiveram directamente envolvidos em operações militares. Os contratados chineses ajudaram os exércitos daqueles países a resgatarem nacionais chineses de raptos e quando estivessem ameaçados pela instabilidade.
Quando 300 trabalhadores das instalações de extracção de petróleo ficaram encurralados entre facções rivais, no Sudão do Sul, em 2016, os contratados da DeWe foram enviados para recuperá-los. Os soldados da manutenção da paz chineses, que poderiam ter feito o trabalho, permaneceram nos seus quartéis.
Mas a abordagem das EMPs chinesas já teve os seus problemas.
“Os contratados de segurança da China causaram a sua parte de problemas ao contornar as restrições de armamentos,” escreveu Nantulya, numa análise publicada pelo CEEA.
Na Zâmbia, onde as relações com chineses podem ser tensas, as autoridades prenderam cidadãos chineses, em 2018, por ilegalmente formarem forças de segurança locais, em matérias de tácticas militares. Os formandos foram disfarçados de membros da Autoridade de Protecção da Fauna Bravia da Zâmbia para evitar o escrutínio do governo. No Zimbabwe, as autoridades prenderam as forças de segurança chinesas por dispararem contra o filho de um deputado — depois de terem sido ordenados que fossem deportados, mas permaneceram no país de forma ilegal.
Em outros lugares, as autoridades prenderam contratantes chineses por posse de equipamento de grau militar e por possuírem sistemas de interceptação de comunicações.
Neste momento, as EMPs da China continuam centradas na protecção de projectos ICR e investimentos comerciais. Esta é uma abordagem diferente de uma outra grande EMP estrangeira em África, o Grupo Wagner, da Rússia, que se inseriu no conflito armado em países que incluem a República Centro-Africana, a Líbia e Moçambique.
Diferentemente das EMPs chinesas, que seguem os investimentos da China, o Grupo Wagner, muitas vezes, precede as suas empresas de mineração afiliadas que extraem recursos em troca dos serviços do grupo. Para além disso, diferentemente do Grupo Wagner, que recusa qualquer conexão com o governo russo, as EMPs chinesas devem ser parcialmente detidas pelo governo.
Enquanto os golpes e os conflitos internos interrompem a estabilidade política e económica de alguns países africanos, a China pode enviar mais unidades de EMPs para o continente para proteger os seus cidadãos e investimentos — mesmo numa altura em que os grupos da sociedade civil africana pressionam os governos para estabelecer limites rigorosos sobre os operadores de EMPs.
No Quénia e no Zimbabwe, os cidadãos processaram empresas estatais chinesas por causa das suas actividades. Aqueles processos também trouxeram uma luz para as acções das EMPs que garante a segurança das empresas chinesas naqueles países.
“Existe uma suspeita sempre presente das empresas de segurança estrangeiras nas organizações da sociedade civil africanas devido ao envolvimento de mercenários estrangeiros nas guerras civis mortais de África,” escreveu Nantulya. “Consequentemente, embora as empresas de segurança da China sejam menos visíveis do que outros actores externos, elas são vistas a partir de um ponto de vista igualmente negativo.”