EQUIPA DA ADF
Um novo relatório descreve em pormenor as medidas extremas que a China irá adoptar para recolher informações sobre os países a que empresta dinheiro.
Uma investigação da Reuters, publicada no dia 24 de Maio, revelou que piratas informáticos chineses se envolveram numa campanha generalizada de três anos de ataques cibernéticos contra o governo queniano, relacionados com a dívida que este tinha para com a China e muitas outras questões.
“Foram roubados muitos documentos do Ministério dos Negócios Estrangeiros e também do Ministério das Finanças,” disse ao serviço noticioso um especialista queniano em cibersegurança.
Duas das fontes em que a Reuters se baseou na sua investigação afirmaram que os ataques informáticos mostram que a China está disposta a utilizar a espionagem e as violações ilegais do ciberespaço para vigiar os governos e proteger os seus interesses económicos e estratégicos.
Um analista dos serviços secretos da África Oriental disse à Reuters que a campanha de ataques informáticos começou no final de 2019 e continuou até, pelo menos, 2022.
Tudo começou quando um funcionário do governo queniano descarregou inadvertidamente um documento infectado com malware que permitiu aos piratas informáticos infiltrarem-se num servidor utilizado exclusivamente pela principal agência de espionagem do Quénia, o Serviço Nacional de Inteligência (NIS, no acrónimo inglês), e obterem acesso a outras agências.
O incidente foi documentado num relatório de uma empresa privada de defesa que foi analisada pela Reuters.
“O Quénia está actualmente a sentir a pressão destes encargos da dívida… uma vez que muitos dos projectos financiados por empréstimos chineses ainda não estão a gerar receitas suficientes para se pagarem a si próprios,” afirma o relatório.
“Poderão ocorrer novos compromissos à medida que se torne necessário compreender as estratégias de reembolso futuras.”
Os documentos revelam que os piratas informáticos visaram o gabinete do presidente do Quénia e sete outros departamentos governamentais com espionagem cibernética persistente e prolongada.
O analista partilhou com a Reuters documentos de investigação que incluíam a cronologia dos ataques, os alvos e dados técnicos.
Por seu lado, o gabinete presidencial do Quénia nega que tenha sido alvo de ataque informático e a China nega as alegações de pirataria informática.
Para além do gabinete do presidente, os piratas informáticos chineses terão entrado em sete ministérios: defesa, finanças, negócios estrangeiros, informação, saúde, terra e interior.
A Reuters também encontrou actividade mais recente.
“Uma análise dos registos da Internet [que descrevem] a actividade de espionagem digital chinesa mostrou que um servidor controlado pelos piratas informáticos chineses também acedeu a um serviço de webmail partilhado pelo governo queniano mais recentemente, de Dezembro de 2022 a Fevereiro deste ano,” afirma o relatório de investigação.
A China tem um historial de ataques cibernéticos em África.
Em 2017, foram encontrados dispositivos de escuta na sede da União Africana, construída em Adis Abeba, na Etiópia, em 2012, como uma prenda de 200 milhões de dólares oferecida pelos chineses. As investigações revelaram que dados confidenciais tinham sido copiados para servidores em Xangai durante cinco anos. A China negou qualquer envolvimento.
O analista de investimentos, Aly-Khan Satchu, que vive em Nairobi, no Quénia, disse que o ataque cibernético à UA foi “muito alarmante,” porque mostrou que “os países africanos não têm qualquer influência sobre a China.”
“Há uma teoria em África de que a China é o Pai Natal. Não o é,” disse ao jornal Financial Times. “Os nossos líderes precisam de se libertar dessa noção.”
O Quénia está a tentar reduzir a sua dívida à China. Em Março de 2023, devia 6,31 bilhões de dólares, contra um máximo de 7,06 bilhões de dólares em Junho de 2021.
O Presidente William Ruto, que tomou posse em Setembro de 2022, comprometeu-se a reduzir os empréstimos externos. Ao mesmo tempo, a China adoptou uma abordagem mais cautelosa em relação à concessão de empréstimos no continente, depois de a pandemia da COVID-19 ter abalado a sua economia.
“Há já algum tempo que é evidente que a carteira de empréstimos da China em África atingiu o seu limite máximo e que a China está a ser extremamente parcimoniosa em termos de novo dinheiro líquido,” disse Satchu à revista African Business.
“O Presidente Ruto herdou um balanço que estava a ficar vazio, com o serviço da dívida a consumir mais de 50% das receitas do Estado e uma economia que foi correctamente descrita como estando em risco elevado de endividamento.”