EQUIPA DA ADF
O nível das águas na Grande Barragem do Renascimento Etíope (GERD) aumentou de novo em Julho, e as tensões entre a Etiópia e os seus vizinhos a jusante também.
A Etiópia anunciou, no dia 20 de Julho, que tinha concluído o segundo enchimento da enorme barragem hidroeléctrica no Nilo Azul, a sul da fronteira com o Sudão.
O Primeiro-Ministro, Abiy Ahmed, fez o anúncio, acrescentando que o enchimento “não prejudicaria os países a jusante.”
As declarações de Ahmed pouco fizeram para apaziguar o Sudão e o Egipto, que consideram o projecto da Etiópia como uma ameaça ao seu acesso à água doce.
“O que a Etiópia está a fazer é uma agressão e uma clara ameaça à segurança do Egipto e do Sudão,” antigo Ministro de Irrigações do Egipto, Mohammed Nasr Allam, disse ao Al-Monitor. “O problema não está no enchimento da barragem, mas sim na falta de um acordo que satisfaz os interesses de todas as partes.”
Na Declaração de Princípios de 2015 em relação à barragem, a Etiópia concordou, entre outras coisas, em evitar causar prejuízos significativos aos seus vizinhos a jusante. Contudo, os três países, várias vezes, não conseguiram chegar a um acordo quanto à gestão da barragem e do seu fluxo a jusante, principalmente durante a época seca.
A Etiópia afirma que tem o direito de utilizar as suas águas territoriais conforme o desejar — neste caso, para gerar electricidade para impulsionar o desenvolvimento, tirar os seus cidadãos da pobreza e garantir a segurança alimentar. Menos da metade da população da Etiópia possui acesso à electricidade confiável, de acordo com o Banco Mundial.
O objectivo do segundo enchimento é de ter água suficiente para colocar duas turbinas geradoras de electricidade. O Sudão procurou adquirir 1.000 megawatts de electricidade da Etiópia no início de Agosto. Não está claro se essa electricidade virá ou não da GERD. O Sudão já recebe 200 megawatts, cerca de 10% do seu fornecimento de electricidade, da Etiópia.
O Egipto, que obtém aproximadamente toda a sua água doce a partir do Nilo, afirma que a barragem ameaça a estabilidade dos seus fornecimentos de água e, por extensão, o seu futuro.
Tanto Egipto como o Sudão baixaram o nível das suas próprias reservas de água durante a época das chuvas para acomodar os altos níveis de água do Nilo. Caso a Etiópia liberte unilateralmente a água da barragem para gerar electricidade, o fluxo adicional que disso resultar pode danificar as estruturas ou causar inundações a jusante, de acordo com Allam.
Ele sugeriu ao Al-Monitor que as recentes inundações no Sudão estejam ligadas ao enchimento da barragem.
“A GERD reflecte as narrativas contraditórias… relacionadas com o uso das águas, segurança e energia na Etiópia, Egipto, Sudão e na mais ampla região do Corno de África,” diplomata gabonês, Parfait Onanga-Ayanga, enviado especial das Nações Unidas para o Corno de África, disse num relatório dirigido à ONU.
A barragem está cerca de 80% completa e espera-se que esteja concluída em 2023. O enchimento da barragem pode durar mais quatro anos depois que a construção terminar.
Quando estiver cheia, a barragem será o maior projecto hidroeléctrico de África, potencialmente capaz de gerar mais de 5.000 megawatts de electricidade, mais do que o dobro da capacidade do país.
A União Africana continua a procurar uma solução, com o dirigente máximo actual, Felix Tshisekedi, presidente da República Democrática do Congo, a assumir as tarefas de mediação, depois do antigo dirigente máximo da União Africana, o presidente sul-africano, Cyril Ramaphosa.
Apesar dos encontros ministeriais virtuais e da diplomacia de vaivém de Tshisekedi, as partes continuam em desacordo.
“Certamente que deve ser feito mais, visto que as recentes negociações produziram pouco progresso,” disse Onanga-Ayanga.
A Etiópia desistiu de um acordo que foi intermediado pelos EUA no ano passado.
Em Fevereiro, o Sudão propôs que se fizesse um apelo à UA, Nações Unidas, União Europeia e aos Estados Unidos para ajudar a encontrar uma solução aceitável. A Etiópia também rejeitou esta proposta.
Em Junho, a Liga Árabe fez um apelo para que a Etiópia parasse de encher a barragem sem consultar o Egipto e o Sudão. Mais uma vez, a Etiópia recusou-se a atender a esta solicitação, afirmando que a barragem é uma questão africana que os três países devem resolver entre si.
Onanga-Ayanga apelou a todas as partes a continuarem a procurar por uma solução justa e pacífica para este impasse.
“Cada um dos países que partilha as águas do Nilo possui direitos e responsabilidades,” disse. “O uso e a gestão deste recurso natural requerem o compromisso contínuo de todos os países envolvidos em boa-fé.”