EQUIPA DA ADF
Peter Kiano, um professor de matemática do Sudão do Sul, tinha acabado de tomar o pequeno-almoço no Souq Abu Hamama, em Cartum, quando chegaram os combatentes das Forças de Apoio Rápido (RSF).
Momentos depois, com as Forças Armadas do Sudão (SAF) por perto, os combatentes das RSF disseram a toda a gente para se deitar no chão. Kiano optou por fugir. Um combatente das RSF atingiu-o duas vezes na cabeça quando ele fugia, matando-o.
Kiano foi um dos milhares de civis sudaneses apanhados na violência implacável entre as SAF dirigidas pelo General Abdel Fattah al-Burhan, o líder de facto do Sudão, e o seu rival das RSF, conhecido como Hemedti.
Desde Abril, os dois homens têm lutado pelo controlo do país, deixando um rasto de morte, violações, bombardeamentos indiscriminados, violência étnica e outras atrocidades. Embora os dois lados estejam equiparados em termos de pessoal, as SAF dominam os céus e utilizam artilharia pesada. As RSF são constituídas por forças terrestres armadas com armas antiaéreas, incluindo algumas contrabandeadas da Líbia pelos mercenários russos do Grupo Wagner.
Mais de 9.000 civis sudaneses foram mortos e quase 5 milhões fugiram das suas casas. Mais de um milhão de pessoas estão refugiadas em países vizinhos, como o Chade. Recentemente, registaram-se confrontos entre as SAF e as RSF nas zonas circundantes do campo de deslocados de Hasahisa, no Darfur Central, que o impediram de receber ajuda.
Cada uma das partes acusa a outra de cometer actos de brutalidade contra civis, enquanto afirma que as suas próprias acções são justificadas. Por exemplo, al-Burhan e Hemedti trocaram culpas pelo bombardeamento da embaixada da Etiópia em Cartum, no início de Outubro.
Este mês, o Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas iniciou uma investigação sobre a escala e o alcance da violência.
Os defensores dos direitos humanos afirmam que cada uma das partes é responsável pelas atrocidades cometidas. As RSF foram acusadas de agressões sexuais e as SAF são acusadas de bombardear mercados, edifícios residenciais e outras áreas onde os combatentes das RSF se refugiaram na cidade. Um dos ataques mais mortíferos foi um ataque aéreo ao mercado de Quoro, em Cartum, que matou 46 pessoas.
“Os civis do Sudão estão a suportar o peso do conflito devastador em curso entre as Forças Armadas do Sudão e as Forças de Apoio Rápido e as milícias suas aliadas,” Erika Guevara-Rosas, directora sénior da Amnistia Internacional para a investigação, defesa, política e campanhas, disse num comunicado.
“As partes em conflito também cometeram crimes de guerra, incluindo violência sexual e ataques a comunidades com base na sua identidade étnica,” acrescentou.
A Amnistia Internacional é apenas um dos grupos de defesa de direitos humanos que documentam as atrocidades cometidas no Sudão. A Islamic Relief é outra.
“As famílias não têm acesso a alimentos ou medicamentos, as mulheres e as raparigas vivem com medo constante de ataques e as comunidades estão presas na pobreza e na dívida,” Elsadig Elnour, director nacional da Islamic Relief no Sudão, disse ao jornal queniano, The East African.
Na região de Darfur, os combatentes das RSF atacaram comunidades não árabes, nalguns casos, enquanto as forças das SAF se mantinham à espera. Em El Geneina, a capital do Darfur Ocidental, os combatentes das RSF entraram na clínica Medical Rescue Center e mataram o Dr. Adam Zakaria Is’haq, juntamente com 13 outras pessoas que eram pacientes no local, disseram testemunhas à Amnistia Internacional.
“Ele estava a tratar pessoas doentes numa pequena clínica quando foi morto, porque o hospital principal em El Geneina foi destruído pela mesma milícia armada e pelas RSF no final de Abril,” disse um dos colegas do médico à Amnistia Internacional. “Foi atingido no peito. Deixou a mulher e dois filhos pequenos de quatro e seis anos.”