EQUIPA DA ADF
Homens armados chegaram de motorizadas do lado de fora da escola secundária para rapazes, em Kankara, na Nigéria.
Eles alvejaram o guarda da escola e as crianças acordaram assustadas. Os atacantes arrancaram os bens das crianças e ordenaram-nas a marcharem, passando pelo portão da escola em direcção à floresta onde o grupo estava acampado. Ao todo, mais de 340 rapazes em idade escolar foram raptados.
“Eles comandavam as multidões como um pastor guia as suas ovelhas,” uma das pessoas que escapou contou à CNN.
Nos dias que se seguiram, os membros do grupo divulgaram um vídeo exigindo um resgate pela libertação dos rapazes. Afirmaram que faziam parte de um grupo terrorista brutal, chamado Boko Haram. Numa mensagem de áudio não confirmada, Abubakr Shekau, o líder de uma facção do grupo terrorista, reconheceu a afiliação e reivindicou o ataque.
O incidente terminou sem violência. As forças de segurança cercaram o esconderijo da Floresta de Rugu e os raptores, em número reduzido, viram-se obrigados a libertar os rapazes.
Mas a ligação com o Boko Haram preocupa os observadores. Os raptores eram, em termos gerais, bandidos conhecidos pelas autoridades, os quais se envolviam no roubo de gado e outros tipos de crime. Anteriormente, não se acreditava que eram extremistas.
Os raptos estão a causar o medo de uma crescente aliança entre os bandidos e os grupos terroristas.
Eles “carregam a pegada operacional do grupo Boko Haram que já aperfeiçoou o acto através de raptos anteriores de alunas de Chibok e Dapchi, no nordeste da Nigéria,” Oluwole Ojewale, do Instituto de Estudos de Segurança, escreveu para o Brookings Institution. “O incidente dá crédito às tentativas perpétuas dos jihadistas de forjarem uma aliança com grupos terroristas separatistas do nordeste.”
Na maior parte da região noroeste da Nigéria, o termo “bandido” é utilizado para descrever jovens pastores de origem Fulani que se envolveram em rixas de gado. Nos últimos anos, a prática ficou mais violenta e passou a incluir ataques a aldeias e raptos. Confrontos entre agricultores e pastores tornaram-se cada vez mais sangrentos, com mais de 1.000 pessoas mortas anualmente, principalmente no Cinturão Central e no Noroeste da Nigéria.
Quando a violência aumentou, os grupos de bandidos procuraram ajuda e viajaram para territórios do nordeste da Nigéria, controlados pelo Boko Haram, e regiões dominadas por terroristas de países vizinhos, à procura de armas.
O Boko Haram considera a crescente aliança como uma oportunidade para criar uma divisão entre os grupos étnicos do noroeste. Ansaru, uma facção do Boko Haram, enviou clérigos radicais para aquela região para pregarem contra a democracia e para denunciarem os esforços de paz orientados pelo governo, comunicou o Centro de Estudos Estratégicos de África.
Em Junho de 2019, o Major-General Jide Ogunlade, comandante do teatro da Operação Hadarin Daji, do noroeste da Nigéria, alertou que os terroristas, já reforçados, entraram na região e estavam a infiltrar as fileiras dos bandidos. “O banditismo agora está a resultar no terrorismo,” disse.
O analista nigeriano Audu Bulama Bukarti acredita que todos os lados podem beneficiar da aliança. O Boko Haram ganha mais homens e pode expandir-se para partes do noroeste do país. Os bandidos ganham mais dinheiro e armamento do grupo terrorista bem financiado e uma nova forma de justificar os seus ataques.
“As gangues ganham uma justificação moral para os seus crimes, enquadrando as suas acções como parte de uma jihad aprovada por Allah e seus ganhos como despojos de guerra permitidos pelo Islão,” Bukarti escreveu para a página da internet do African Arguments. “Isso pode fazer com que sejam mais ferozes e permitir que recrutem mais jovens.”
Outra preocupação ainda maior é a possibilidade de que as alianças bandidos-terroristas possam dar ao Boko Haram uma “ponte terrestre” que permita a ligação entre o seu território do noroeste da Nigéria e os grupos que já operam nas zonas saelianas do Burkina Faso, de Mali e do Níger.
Bukarti acredita que a resposta do governo deve ser imediata e multidimensional para evitar que as alianças se aprofundem. Isso inclui esforços do exército e da polícia, mas também programas de emprego, infra-estrutura e um confronto activo da “interpretação perversa do islamismo” oferecida por grupos extremistas.
“O rapto de Kankara já deu um sinal inconfundível ao governo nigeriano e aos seus parceiros de que agora deve pegar neste desafio de longa data que o Boko Haram representa,” escreveu Bukarti. “Apenas uma abordagem holística localizada poderá ser bem-sucedida.”