EQUIPA DA ADF
Uma oceanógrafa pioneira apelou os líderes mundiais para banirem a pesca industrial nas águas internacionais a fim de preservar as unidades populacionais de peixe e manter os meios de subsistência das pequenas comunidades de pescadores.
Sylvia Earle, de 86 anos de idade, fez os comentários durante a Cop26, uma conferência anual das Nações Unidas sobre as mudanças climáticas, havida em Novembro, em Glasgow, Escócia.
“Apenas um pequeno segmento da população humana realmente depende do oceano para o seu sustento,” disse Earle, numa reportagem do jornal britânico, The Guardian. “Muitos outros dependem dele para a obtenção de dinheiro, utilizando animais selvagens como uma fonte de rendimento.”
As palavras de Earle ressoaram em África, onde a pesca ilegal está a causar um grande impacto em termos económicos e ambientais. A prática ameaça os meios de subsistência de milhares de pessoas que trabalham no sector das pescas. Embora uma proibição total seja pouco provável, reduzir a pesca industrial pode reverter alguns destes declínios.
“Ao invés de ser encontrado por uma dezena de países no alto mar, a colheita pode ser partilhada de forma mais equitativa,” biólogo marinho, Daniel Pauly, disse numa recente entrevista. “Se a captura não estivesse a ser feita por estas frotas estrangeiras, estaria a ser feita pelos países das regiões costeiras.”
A China possui a maior frota de pesca em águas longínquas (PAL) do mundo e há muitos anos ela teve como alvo a África Ocidental. Os arrastões industriais chineses têm a fama de praticarem a pesca ilegal em águas protegidas e de utilizarem uma variedade de tácticas ilícitas para capturarem muito mais peixe do que o permitido. A China é o pior infractor da pesca ilegal, não declarada e não regulamentada (INN) do mundo, de acordo com o Índice de Pesca INN.
A China e o Taiwan representaram cerca de 60% de todas as actividades de PAL, a nível mundial, nas águas de outros países, de 2015 a 2017, com o Japão, a Coreia do Sul e a Espanha cada um deles a representar cerca de 10% da PAL, de acordo com um relatório feito pelo Stimson Center, um grupo de reflexão.
A frota de PAL da China começou a lançar redes pelo mundo depois de o país ter praticado a pesca excessiva nas suas próprias águas, uma situação que não eliminou a sua fome de mariscos. O país de 1,4 bilhões de habitantes consome 38% da produção de peixe do mundo e possui uma das taxas mais elevadas de consumo de peixe e mariscos, situando-se em 37,8 quilogramas por pessoa por ano, de acordo com um comunicado da Foreign Policy.
A Ficar Sem Peixe
As práticas comerciais marítimas ilegais custam aos países da África Ocidental aproximadamente 1,95 bilhões de dólares em toda a cadeia de valores pesqueiros e 593 milhões de dólares por ano em rendimento familiar. A pesca INN na região também esteve ligada a outros crimes tais como a pirataria, os raptos e o tráfico de drogas.
Gerações de senegaleses dependeram de actividades relacionadas com a pesca para a obtenção de rendimento, mas 90% dos locais de pesca daquele país agora encontram-se totalmente explorados ou à beira do colapso, de acordo com a ONU. O peixe do Senegal é na sua maioria pescado por arrastões chineses e exportado para a Ásia e a Europa, muitas vezes, como farinha de peixe ou óleo de peixe produzidos por empresas de proprietários chineses.
No Gana, a pesca ilícita ameaça destruir as unidades populacionais de peixe pelágico pequeno, como a sardinela, que reduziu em 80% nas passadas duas décadas, informou a Fundação para a Justiça Ambiental.
A pesca marítima do Gana serve de suporte para os meios de subsistência de mais de 2,7 milhões de pessoas — cerca de 10% da população. Mais de 100.000 pescadores e 11.000 canoas operam no país, mas por causa da sobrepesca e das tácticas INN, houve uma queda no rendimento médio anual em cerca de 40% por canoa artesanal nos últimos 15 anos, de acordo com a fundação.
Os países africanos podem ser mais proactivos no combate aos crimes marinhos, aderindo às negociações da Organização Mundial de Comércio para acabar com os subsídios das pescas e cooperando uns com os outros para acabar com a pesca INN, pesquisadores do Instituto de Estudos de Segurança (ISS, na signa inglesa), em Pretória, África do Sul, argumentaram num recente relatório.
O relatório do ISS observou que a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental, a Comissão Sub-Regional de Pescas e o Comité das Pescas do Centro-Oeste do Golfo da Guiné registaram progresso na luta contra crimes marítimos.
Para além disso, os países que “aplicam de forma robusta” o Acordo da FAO sobre as Medidas dos Estados do Porto (PSMA) detêm de forma eficaz as actividades de pesca ilegal, não autorizando o acesso das embarcações ilegais aos portos e restringindo o seu acesso a mercados internacionais, lê-se no relatório do ISS.
“Felizmente, 12 de 27 Estados africanos que fazem parte do PSMA são da África Ocidental,” escreveram os pesquisadores do ISS. “Contudo, para que tenha um impacto genuíno, a Nigéria — um dos maiores actores a nível regional — também deve ratificar o acordo.”