EQUIPA DA ADF
Centenas de anos atrás, mulheres inocentes na Europa eram queimadas vivas por acusações de feitiçaria. O que motivava esses linchamentos eram as teorias de conspiração.
Hoje uma pandemia mortal continua a propagar-se no mundo inteiro e a desinformação nas redes sociais continua a ser o principal combustível da persistência da COVID-19. Os pesquisadores estão a utilizar a história como uma guia para responder e combater esta desinformação moderna.
“As redes sociais são uma força positiva, neutra e negativa,” professor da Universidade da Califórnia em Berkeley, Tim Tangherlini, disse à ADF. “Ela definitivamente oferece às pessoas uma boa forma de encontrar outras pessoas com interesses semelhantes, organizar-se e de permanecerem em contacto neste mundo cada vez mais disperso. Ao mesmo tempo, assim como os eventos do ano passado nos mostraram, podem ser um local para distorção e podem ser utilizadas como uma arma.”
Em África, as teorias de conspiração sobre a COVID-19 causam dúvida e medo sobre a doença, as suas origens, os sistemas de prestação de cuidados de saúde e sobre as medidas de protecção determinadas pelo governo.
Colocado de forma simples, a desinformação está a causar mortes que se podiam prevenir no continente. Mas Tangherlini e um grupo de pesquisadores de Engenharia Informática da Universidade de Califórnia em Los Angeles (UCLA) esperam que a ferramenta de inteligência artificial (IA) que desenvolveram possa ajudar os governos e as autoridades sanitárias a combater a perigosa desinformação.
Procurando atacar os motivos pelos quais as teorias falsas da COVID-19 ganham espaço, os pesquisadores fizeram o mapeamento das ligações que motivam a desinformação como uma forma de melhorar a compreensão das mesmas e desafiá-las.
Com narrativas do folclore dinamarquês como modelo, eles utilizaram a IA para analisar milhares de publicações das redes sociais do mundo inteiro e identificar histórias fundamentais e relações que compõem as teorias de conspiração.
Um nome que esteve sempre a aparecer nas conspirações sobre a COVID-19 foi Bill Gates, e os pesquisadores logo descobriram que as suas ligações com os computadores e com o atendimento médico no mundo inteiro explicam por que os criadores das teorias de conspiração ligavam a doença às redes e aos dispositivos de telecomunicação 5G.
Tangherlini, que é doutorado em folclore e literatura dinamarquesa, disse que Gates constitui um tema perfeito para os criadores de teorias de conspiração.
“Bill Gates pode facilmente ser alinhado em histórias com um vilão, tal como um feiticeiro,” disse. “Ele é demasiadamente rico, por isso, já não faz realmente parte da sociedade normal. Ele utiliza a tecnologia e, na verdade, controla a tecnologia de formas que para a maior parte das pessoas são incompreensíveis.”
Em toda a história, os avanços tecnológicos foram recebidos com medo e cepticismo. Numa tentativa de compreender a ameaça da COVID-19, as teorias da conspiração falsamente afirmam que os sinais de rádio 5G propagam a doença.
Enquanto as teorias de conspiração sobre 5G se propagam nas redes sociais, incidentes de fogo posto e vandalismo de equipamentos de telecomunicações aumentaram pelo mundo. Três torres de telefonia móvel foram destruídas próximo de Durban, África do Sul, em Janeiro de 2021.
“É lamentável que a infra-estrutura de redes tão necessária esteja a ser destruída,” então Ministra de Comunicações, Stella Ndabeni-Abrahams, disse à imprensa. “O incêndio das torres de telefonia móvel é a continuação de um ressurgimento de teorias de conspiração que ligam o surgimento da pandemia do coronavírus ao 5G.”
Tangherlini observou como a tecnologia 5G foi lançada ao mesmo tempo que a COVID-19 foi descoberta.
“Através da tecnologia, Gates é ligado a teorias de conspiração de 5G,” disse. “Ele possui uma fundação global que se encontra nos noticiários, particularmente em África, desde pesquisas de filantropia até ao atendimento médico a nível global.
“Isso pode fazer com que as pessoas perguntem, ‘Por que ele faz isso?’ Mesmo que os objectivos expressos sejam claramente altruístas. A resposta a esta pergunta é ainda mais complicada, principalmente em África. No contexto da história colonial global, não é surpreendente que isto seja percebido como uma ameaça.”
Uma vez que muitos países africanos têm populações que expressam desconfiança para com os seus governos e sistemas de saúde, os pesquisadores esperam que as autoridades possam utilizar as suas ferramentas de IA para identificar quem e o que as suas comunidades percebem como ameaças, por que e o que, se for o caso, as populações pretendem fazer em relação as mesmas.
“Muitas destas ameaças podem resultar em criação de políticas,” professor da UCLA, Vwani Roychowdhury, disse à ADF. “Proteger infra-estruturas fundamentais, por exemplo. Fazer campanhas de sensibilização pública. Alertar os médicos e hospitais quanto ao que se pode esperar e que não se deve prescrever medicamentos como Ivermitina e hidro-cloroquina que podem causar mais prejuízos do que fazer o bem.
“A IA e os seus algoritmos são necessários para incluir neste caldeirão gigantesco de histórias e eventos e transformá-los em pequenos pedaços e peças de informação para o consumo individual.”