EQUIPA DA ADF
A cada segunda-feira, em quatro das nove províncias da África do Sul, um técnico do sistema de tratamento de águas de esgoto enche uma pequena garrafa com águas residuais para testar, no laboratório, a presença de COVID-19.
É uma tarefa que envolve mexer com sujidade, sem dúvidas, mas os benefícios superam muito o desconforto.
Cientistas de Holanda estiveram entre os primeiros a utilizarem este método. Eles encontraram o patogénico da doença num sistema de esgotos de uma cidade holandesa semanas antes de testes confirmarem o primeiro caso da cidade, no início de 2020.
A vigilância dos esgotos pode detectar de forma eficaz a presença do vírus 14 dias antes de os sintomas aparecerem entre a população. Notícias sobre uma nova ferramenta na luta contra a COVID-19 rapidamente espalharam-se pelo mundo como uma forma não evasiva de realizar testes em grande escala e antecipar surtos.
O Conselho de Pesquisas Médicas da África do Sul (SAMRC, sigla inglesa) entrou em acção.
“Quando a ideia de sistemas de alerta antecipado para a COVID-19, baseados nas águas residuais, na África do Sul, foi primeiramente sugerida no seio do SAMRC, houve um reconhecimento imediato do valor preventivo inerente em tais sistemas,” Sizwe Nkambule, da Unidade de Meio Ambiente e Pesquisa em Saúde, do SAMRC, disse à ADF. “O nosso programa de epidemiologia das águas de esgoto analisa mais de 70 áreas de captação de águas residuais na África do Sul e os resultados estão a ser utilizados por actores da área de saúde pública de várias formas.”
Uma das formas é informar o público quando os níveis de patogénicos subirem e encorajar uma adesão mais firme às directrizes.
Numa manchete, do dia 6 de Maio de 2021, da página da internet de notícias sul-africanas, Times Live, lê-se, “Cabo Ocidental ‘em alerta’ numa altura em que as zonas afluentes registam um aumento de testes positivos.” O artigo comunicou que o SAMRC tinha “produzido dados preocupantes sobre a Planície de Mitchells [uma das cidades mais populosas da África do Sul], onde os níveis de SARS-CoV-2 detectáveis são os mais elevados do que já foram este ano.”
Enquanto a primeira onda assolava o país, o SAMRC concluiu os seus estudos de validação de conceito, em Junho de 2020, e aumentou a monitoria das águas residuais, em Julho. Até Outubro, o sistema de alerta antecipado estava a fornecer actualizações semanais sobre as tendências de existência de COVID-19 nas águas residuais para as autoridades sanitárias.
Em Novembro de 2020, o conselho fez o lançamento de um painel de dados da COVID-19 nas águas residuais.
Com um novo lançamento em Junho de 2021, “os dados agora são apresentados em formatos que mais se ajustam às necessidades dos órgãos de tomada de decisão da saúde pública,” disse Nkambule. “O painel também é mais interactivo e mais fácil de utilizar pelo público em geral.”
A África do Sul continua a ser o país mais atingido, com cerca de 1,7 milhões de casos confirmados e mais de 57.000 mortes, de acordo com as estatísticas do dia 7 de Junho, do Centro Africano de Controlo e Prevenção de Doenças.
Um dos principais desafios que o SAMRC enfrenta é expandir a monitoria para mais províncias e municípios.
“Agregados familiares em ambientes urbanos, rurais e remotos nem sempre estão conectados com os sistemas de drenagem das águas de esgoto,” disse Nkambule.
De acordo com o censo de 2011, naquele país, 40% dos agregados familiares não possuíam uma casa de banho com água corrente ligada a um sistema de esgoto. Métodos para sistemas sem canais de esgoto ainda estão em desenvolvimento.
Em Pretória, o Conselho de Pesquisas de Águas da África do Sul está a trabalhar com uma empresa privada chamada Waterlab para expandir a testagem para comunidades sem canais de esgoto, através da recolha de amostras em rios e águas superficiais.
As autoridades fizeram o lançamento do programa piloto para monitorar as águas residuais para a COVID-19 em Lagos, Nigéria, e Nairobi, Quénia.
Trabalhar com esgotos pode ser uma dificuldade para muitos, mas Nkambule acha que vale a pena.
“Na verdade, é de grande valor para a saúde pública,” disse. “A epidemiologia das águas de esgoto já provou o seu valor para a sociedade no papel que desempenhou no combate à pólio. Em face da pandemia da COVID-19, as águas residuais estão, mais uma vez, a demonstrar o seu mérito como um fundamento para ajudar a prevenir doenças e mortes.”