Juntas Transformam o Sahel num ‘Deserto de Informação’

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EQUIPA DA ADF

Quando, no final de Abril, surgiram notícias de que o exército burquinabê tinha massacrado centenas de civis, o governo liderado pelos militares entrou em acção.

Suspendeu uma série de meios de comunicação social, bloqueou sites da internet e encerrou as emissões de rádio e televisão, tendo avisado as redes internacionais de comunicação social para não noticiarem o sucedido.

O tratamento cruel dado pelo Burquina Faso aos jornalistas faz parte de uma tendência mais alargada no Sahel, visto que as juntas militares suspenderam ou forçaram o encerramento de mais de uma dezena de meios de comunicação social nos últimos três anos.

Os observadores dizem que a região está a tornar-se um “deserto de informação.”

“As restrições à liberdade dos meios de comunicação social e ao espaço cívico devem cessar imediatamente,” as Nações Unidas disseram num comunicado de 26 de Abril. “A liberdade de expressão, incluindo o direito de acesso à informação, é crucial em qualquer sociedade, e ainda mais no contexto da transição no Burquina Faso.”

A organização internacional sem fins lucrativos Repórteres Sem Fronteiras (RSF) publicou recentemente o seu Índice Mundial da Liberdade de Imprensa 2024 e manifestou a sua preocupação com o aumento da violência e das ameaças contra os jornalistas nos Estados do Sahel sob controlo militar.

Camille Montagu, da RSF para a África Subsariana, qualificou o Sahel como uma “zona de não informação livre.”

“A informação patriótica sobrepôs-se ao jornalismo independente e de qualidade,” afirmou numa conferência de imprensa em Dakar, capital do Senegal, no dia 3 de Maio.

A classificação do Burquina Faso no Índice Mundial de Liberdade de Imprensa desceu 28 lugares para 86, enquanto o vizinho Mali ficou em 114.º lugar entre 180 países.

A junta do Burquina Faso tem visado e detido jornalistas nos últimos meses, forçando alguns a servir em grupos de milícias civis na linha da frente da feroz batalha do país contra grupos extremistas violentos ligados ao grupo do Estado Islâmico e à al-Qaeda.

Montagu denunciou a junta do Burquina Faso por silenciar jornalistas e outros críticos. “A convocação, a requisição e a detenção têm um objectivo: criar um clima de medo e encorajar a autocensura,” afirmou.

Outro factor no Sahel é a presença crescente da Rússia, que estabeleceu parcerias com autoritários em toda a África. Os mercenários russos e os conselheiros militares contratados para proteger os líderes da junta trouxeram para o Sahel o estilo notório do seu país de supressão dos meios de comunicação social, desinformação e propaganda. Quando os meios de comunicação independentes são sufocados, a desinformação pode prosperar.

Um relatório de Março, do Centro de Estudos Estratégicos de África, que se baseou no trabalho de mais de 30 investigadores e organizações africanas, identificou a Rússia como o principal patrocinador da desinformação no continente.

“A Rússia está ligada a 80 das 189 campanhas que identificámos e mapeámos, o que representa 40% destas campanhas de desinformação,” um dos autores do relatório, Mark Duerksen, disse à ADF.

Em Abril, mais de 80 partidos políticos e grupos civis do Mali emitiram declarações conjuntas, apelando à realização de eleições presidenciais e ao fim do regime militar.

A junta do Mali respondeu com mais opressão, suspendendo todas as actividades políticas e impedindo os meios de comunicação social de cobrir assuntos políticos — medidas que alegou serem necessárias “por razões de ordem pública.”

Duerksen disse que a repressão da junta compromete a sua própria narrativa de representar a vontade do povo.

“Como é que se pode dizer que se é popular quando se está a encerrar partidos políticos da oposição, quando se está a encerrar qualquer tipo de reportagem sobre o encerramento de partidos políticos?” questionou. “Se dizem que são tão populares, porque é que sentem a necessidade de silenciar as vozes discordantes, se elas são a minoria?”

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