EQUIPA DA ADF
As forças de segurança etíopes mataram pelo menos 45 civis nas suas casas no Estado de Amhara no final de Janeiro, de acordo com a Comissão Etíope dos Direitos Humanos (EHRC), afiliada ao Estado.
A comissão declarou em comunicado que as vítimas da cidade de Merawi, no norte do país, foram mortas por alegadamente apoiarem os Fano, palavra amárica que significa “combatentes voluntários.” Entre as vítimas encontrava-se uma mulher grávida. “É de supor que o número de vítimas seja ainda mais elevado,” afirmou a comissão.
Testemunhas disseram à BBC que agentes de segurança etíopes uniformizados realizaram buscas de casa em casa após várias horas de combates entre as forças etíopes e os combatentes Fano, no dia 29 de Janeiro. “Eles entraram na casa do meu irmão,” disse um sobrevivente anónimo à BBC. “Trouxeram-no a ele e a outros 12 para a rua e dispararam contra eles.”
A maioria das vítimas eram homens jovens. Uma mulher disse que estava de luto pela morte do seu irmão mais novo, um funcionário público. “Ele estava com o filho,” disse à BBC. “Disseram-me para segurar a criança. Pegaram no [meu irmão] e mataram-no.”
Um homem escapou à rusga, mas regressou e deparou-se com uma visão macabra. “Quando saí no dia seguinte, vi corpos estendidos nas estradas,” disse.
Um funcionário público de Bure, outra cidade do Estado de Amhara que tem assistido a frequentes confrontos entre as forças etíopes e os Fano, disse em meados de Fevereiro que os escritórios do governo não estavam a funcionar em pleno há meses devido ao conflito.
“Armas pesadas são disparadas aleatoriamente e, por vezes, [a violência] prolonga-se durante horas,” disse o trabalhador à BBC.
Os combates coincidem com um aumento da utilização de drones mortíferos.
Em Dezembro de 2023, Tewodrose Tirfe, presidente da Associação Amhara da América, disse à Al Jazeera que a sua organização tinha recolhido informações sobre cerca de 70 ataques de drones que mataram civis em Amhara desde Maio. O exército etíope é o único operador de drones armados no país.
Os ataques de drones atingiram alvos civis em Amhara, incluindo um complexo escolar e uma estação de autocarros, em Dezembro, segundo as Nações Unidas. O governo da Etiópia negou ter como alvo civis, mas prometeu erradicar os “extremistas.”
A violência em Amhara tem origem num acordo de paz de 2021 assinado pelo governo etíope e pela Frente de Libertação do Povo de Tigré (TPLF) para pôr fim a um conflito na região vizinha de Tigré. Embora as forças especiais de Amhara e os combatentes Fano tenham lutado pelo exército federal em Tigré, os Amharas foram excluídos das negociações, noticiou a BBC.
Os Amharas desconfiaram do acordo, uma vez que as regiões têm desde há muito disputas fronteiriças.
A ala juvenil da TPLF chacinou cerca de 1.560 Amharas durante um período de quatro dias em 2020. A TPLF também é acusada de massacrar pelo menos 750 civis em Amhara e na região de Afar no segundo semestre de 2021, de acordo com a EHRC.
Algumas das forças especiais Amhara que combateram em Tigré foram, entretanto, integradas no exército federal e nas forças policiais, tal como proposto pelo Primeiro-Ministro da Etiópia, Abiy Ahmed. Mas muitos outros desertaram para os Fano.Os combates intensificaram-se no ano passado, depois de o governo de Abiy ter lançado uma campanha de desarmamento. A milícia, que normalmente se esconde nas montanhas e em pequenas aldeias, não quis depor as armas por recear ataques de Tigré e de outras regiões.
Os Fano reagiram à campanha de desarmamento com ataques a postos governamentais e militares e tentaram estabelecer as suas próprias administrações em algumas áreas.
A milícia controlou durante algum tempo o aeroporto de Lalibela e avançou sobre Bahir Dar e Gondar, as maiores cidades regionais, bem como sobre a cidade industrial de Debrebirhan. Os combatentes também roubaram armas e munições das esquadras da polícia e invadiram uma prisão em Bahir Dar, libertando milhares de reclusos, segundo a BBC.
O aumento da violência levou o governo etíope a impor, em Agosto de 2023, o estado de emergência em Amhara. Foi prorrogado por quatro meses dias após o massacre de Merawi. O governo é acusado de ter utilizado o estado de emergência para deter arbitrariamente cinco políticos e três jornalistas.
“O governo etíope tem de deixar de recorrer a velhas tácticas de negação de direitos básicos a pretexto de leis de emergência,” Tigere Chagutah, director regional da Amnistia Internacional para a África Oriental e Austral, disse na página da internet da organização.
“Os etíopes enfrentam um outro conflito armado na região de Amhara, uma grave crise humanitária em Tigré, uma situação de segurança terrível em Oromia e uma impunidade generalizada em todo o país,” acrescentou Chagutah.