Marcadas pela Guerra, Libéria e Serra Leoa Oferecem Lições de Paz
EQUIPA DA ADF
Os observadores internacionais elogiaram a Libéria depois de aquele país da África Ocidental, com um historial sombrio de conflitos, ter realizado eleições presidenciais e legislativas bastante pacíficas no dia 10 de Outubro.
“Os liberianos puderam exercer livremente os seus direitos constitucionais,” o chefe da missão de observação da União Africana, Phumzile Mlambo-Ngcuka, disse num comunicado. “Apesar da atmosfera política exacerbada, o ambiente político foi geralmente pacífico, com um mínimo de violência durante o período da campanha.”
A calma e a ordem do processo contrastam fortemente com as regiões da África Ocidental e do Sahel onde se registaram golpes de Estado nos últimos anos.
Mais de 250.000 liberianos morreram em duas guerras civis entre 1989 e 2003. O seu vizinho a norte, a Serra Leoa, também realizou eleições pacíficas em Junho, reforçando a sua passagem de um passado sombrio para um presente mais luminoso.
Alan Doss testemunhou e estudou os dois exemplos como vice-chefe da missão de manutenção da paz das Nações Unidas na Serra Leoa e, mais tarde, como chefe da missão das Nações Unidas na Libéria.
Como países que essencialmente acabaram com os seus ciclos de violência através da liderança, reconciliação, reformas-chave do sector de segurança (SSR) e apoio externo, a Libéria e a Serra Leoa oferecem lições importantes para os países atormentados pela guerra, insurgência e tomada de poder pelos militares.
“Como é que a Serra Leoa e a Libéria desafiaram as probabilidades para escapar à armadilha do conflito?” escreveu num artigo de opinião para o site de notícias PassBlue.com. “Há quatro factores que se destacam. O mais crítico foi a liderança pós-conflito e a legitimidade do governo.”
Liderança: A Presidente da Libéria, Ellen Johnson-Sirleaf, e o Presidente da Serra Leoa, Ahmed Tejan Kabbah, foram líderes internacionalmente respeitados que venceram eleições amplamente credíveis. Nenhum deles desrespeitou os limites dos seus mandatos.
“Ambos enfrentaram sociedades profundamente fracturadas, traumatizadas por anos de violência brutal e má governação,” escreveu Doss. “Procuraram construir a coesão nacional, o que os seus antecessores não tinham conseguido fazer de forma evidente. Como resultado, ganharam e mantiveram uma grande parte do apoio nacional e a confiança (e recursos) da comunidade internacional.”
Reconciliação: Para fazer face às atrocidades das suas guerras, a Serra Leoa e a Libéria organizaram comissões de verdade e reconciliação (TRC), que reconheceram o testemunho das vítimas e dos perpetradores.
“A TRC é fundamental para garantir que não se regressa ao conflito,” David Sengeh, Primeiro-Ministro da Serra Leoa, disse à revista The Economist.
A Serra Leoa criou um tribunal especial e processou com êxito os infractores “mais responsáveis,” incluindo o antigo Presidente da Libéria, Charles Taylor.
A Libéria não processou nenhum indivíduo por crimes de guerra. Temendo uma nova violência, Johnson-Sirleaf ignorou a recomendação da TRC de criar um tribunal.
SSR: O êxito dos programas de desarmamento, desmobilização e reintegração dos grupos armados foi um passo fundamental que abriu caminho à reforma dos sectores de segurança dos países.
Foram oferecidas aos combatentes bolsas de desmobilização, formação e oportunidades educativas, disse Doss.
“Cerca de 180.000 combatentes entregaram as suas armas nos dois países,” escreveu o The Economist num artigo de 19 de Outubro. “Mas, ao contrário do que aconteceu noutros conflitos, não foram integrados em massa no exército regular.”
Na Serra Leoa, o exército foi reestruturado e reduzido, os seus quadros superiores foram despolitizados. O exército da Libéria foi desmantelado e reconstruído por um nigeriano, o Major-General Suraj Abdurrahman, colocado no comando por Johnson-Sirleaf.
A reconversão das forças de segurança, tanto militares como polícias, e a reconstrução das suas estruturas de apoio também foram fundamentais para alcançar a estabilidade. Em Junho de 2023, 62% dos liberianos disseram à sondagem da Afrobarómetro que confiavam no exército, contra 46% em 2012.
Apoio externo: Parceiros como a União Europeia, a África do Sul e os Estados Unidos fizeram grandes investimentos em equipamento, formação, controlo e logística para apoiar os objectivos de reforma a longo prazo.
A União Africana e a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) colaboraram estreitamente com a ONU nas suas missões de manutenção da paz até ao cumprimento dos seus mandatos.
Apesar dos modelos úteis da Libéria e da Serra Leoa, os peritos alertam para o facto de nem todas as lições poderem ser transpostas sem problemas para países maiores, com conflitos mais complexos e numerosos actores armados não estatais.
A CEDEAO foi capaz de facilitar uma mudança positiva na Libéria, mas “não pode fazer o mesmo no Mali,” Gyude Moore, um antigo ministro do governo pós-guerra na Libéria, disse ao The Economist.
Os extremistas religiosos, os insurgentes e os secessionistas são partes para as quais é mais difícil encontrar um ponto comum e um compromisso.
“As coisas boas levam tempo e um esforço incessante para se concretizarem,” escreveu o The Economist. “Para as pessoas famintas e esperançosas dos países que estão a tentar sair dos conflitos em África, esta é talvez a lição mais difícil de todas.”
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