EQUIPA DA ADF
Cinco dias depois de liderar uma revolta falhada contra o Estado russo, Yevgeny Prigozhin e os seus principais oficiais do Grupo Wagner sentaram-se frente a frente com o Presidente da Rússia, Vladimir Putin, para uma reunião de três horas, a 29 de Junho.
Apesar de ter apelidado o seu antigo conselheiro próximo de traidor e de ter prometido um castigo severo, Putin terá concedido imunidade ao pessoal do Grupo Wagner. Também concordou em deixar Prigozhin manter parte do seu vasto e obscuro império em África.
Rama Yade, director sénior do Centro Africano do Conselho do Atlântico, é um dos muitos observadores que ainda tentam compreender o motim e as suas consequências.
“Sem dúvida que esta rebelião terá impacto no teatro de operações africano, particularmente no Mali, na República Centro-Africana (RCA), na Líbia e no Sudão, onde o Grupo Wagner instalou as suas tropas,” afirmou no site do grupo de reflexão.
“Enquanto até agora os interesses do governo russo e do Grupo Wagner estavam alinhados, agora será necessário que estes países negoceiem com dois actores russos com interesses rivais. Esta rivalidade colocará os seus aliados africanos numa posição difícil.”
Os especialistas não sabem exactamente o que está para vir para a organização mercenária que era o representante favorito da Rússia para espalhar influência e contrabandear recursos naturais. Mas eles sabem que Putin está empenhado em manter o controlo das operações altamente lucrativas do Grupo Wagner em África.
“O Grupo Wagner vai ficar em África, isso é certo,” Sergei Markov, um consultor político com ligações estreitas ao Kremlin, disse à Bloomberg News. “Mas ainda não foi decidido a quem vai responder, se a Prigozhin ou a outro oligarca.”
Várias centenas de combatentes do Grupo Wagner terão abandonado a RCA recentemente, tendo algumas testemunhas afirmado que alguns venderam bens, sinal de que não tencionam regressar.
Embora o governo da RCA tenha classificado, a 8 de Julho, os movimentos como uma rotação e “não uma partida definitiva,” várias centenas de soldados do Grupo Wagner chegaram à Bielorrússia dias depois.
Um grupo de activistas bielorrussos informou que uma coluna de mais de 100 veículos com insígnias do Grupo Wagner viajou, no dia 17 de Julho, da Rússia para um campo de concentração criado para os mercenários pelas autoridades bielorrussas. Foi uma das três colunas que chegaram numa semana.
Independentemente de a Rússia colocar o Grupo Wagner sob a alçada das suas forças armadas, exilar Prigozhin na Bielorrússia, transferir o grupo para outro líder ou mudar a sua marca, é provável que os países africanos venham a experimentar as mesmas tácticas que incluem a violência dirigida a civis, a pilhagem de recursos naturais e a captura do Estado.
Alia Brahimi, especialista em mercenários, do Conselho do Atlântico, disse que os laços profundos de Prigozhin com os militares e empresários do Grupo Wagner no continente tornariam as escolhas difíceis se o grupo de mercenários fosse dividido.
“Eles [os comandantes do Grupo Wagner em África] terão de conciliar a dívida pessoal que têm para com Prigozhin e a sua identidade tribal como operacionais privados em vez de soldados públicos com um controlo mais centralizado do Kremlin,” disse ao jornal The Guardian.
“Do lado do Kremlin, o objectivo e a vantagem de deixar o Grupo Wagner à solta em África era o facto de ser uma força negável. Agora, os crimes e abusos horríveis, bem como a predação económica, terão um endereço do remetente claro.”
Na prossecução dos objectivos da política externa russa, o Grupo Wagner criou um labirinto de representantes e empresas fantasmas que conduzem campanhas de desinformação para regimes africanos autoritários, enquanto extraem recursos naturais preciosos.
Enormes quantidades de dinheiro e de contrabando foram reenviadas para a Rússia, ajudando o país a financiar a sua guerra contra a Ucrânia e a resistir às sanções internacionais.
Contudo, os mercenários do Grupo Wagner em África também foram acusados de atrocidades e violações dos direitos humanos em vários países.
Uma mudança na liderança do Grupo Wagner provavelmente não alteraria o status quo mortal em África, disse Charles Bouessel, analista sénior sobre a RCA, no Grupo Internacional de Crise.
“Penso que o método de prestação de contas com o Grupo Wagner não vai mudar substancialmente, as actividades serão certamente mantidas sob esta forma,” disse à Al-Jazeera.
“Quer se trate de Prigozhin ou de outro empresário de guerra, não importa. É mais uma questão de saber quem vai controlar a empresa.”
Enrica Picco, directora do projecto sobre a RCA, no Crisis Group, acredita que as participações do Grupo Wagner foram construídas para resistir à turbulência.
“Com o Grupo Wagner, a Rússia conseguiu criar uma máquina de negócios muito poderosa e uma ferramenta de influência em África,” disse à Bloomberg. “Por isso, o sistema não falhará mesmo que haja lutas internas na Rússia.
“O Kremlin não vai deixar o sistema falhar — é demasiado importante para eles.”