Tráfico de Seres Humanos Ligado à Pesca Ilegal no Golfo da Guiné
EQUIPA DA ADF
Eles trabalham por tantas e dolorosas horas, sem água nem comida.
Dormem no convés das embarcações de pesca onde trabalham, expostos aos elementos.
Não existem medicamentos quando ficam doentes e rotineiramente são obrigados a trabalhar por muito tempo depois de os seus contratos terem expirado, sem qualquer pagamento adicional.
Isso é o que geralmente acontece com alguns dos trabalhadores, que são enganados ou forçados a trabalhar nas embarcações de pesca industrial estrangeiras e não têm qualquer forma de escapar. É uma forma de tráfico de seres humanos que muitas vezes passa despercebida pelas autoridades.
O tráfico de seres humanos é um dos muitos crimes ligados à pesca ilegal, não declarada e não regulamentada (INN). Em todo o Golfo da Guiné, as embarcações de pesca também são cada vez mais utilizadas para o tráfico de drogas e armas, roubo de petróleo e para cometerem actos de pirata. A maioria das embarcações de pesca industrial na África Ocidental são de proprietários chineses.
“Como criminosos, poderiam pensar por que não acrescentar mais uma ‘aventura’ a isso, como drogas, e por já estarem envolvidos em outras actividades criminosas, eles não achariam tão difícil ou errado manter pessoas contra a sua vontade, e movimentar pessoas de uma parte do mundo para a outra,” disse o especialista em segurança marítima, Nasir Saheed, que utilizou um pseudónimo quando falava ao jornal nigeriano, Vanguard.
Em Setembro de 2022, dezenas de vítimas de tráfico de seres humanos foram resgatadas de duas embarcações de pesca industrial, nas águas da Namíbia.
Das 60 pessoas resgatadas do MV Shang Fu e do Nata 2, em Walvis Bay, quatro eram moçambicanas, quatro angolanas e oito namibianas. As outras eram provenientes da Indonésia, Filipinas e Vietname, de acordo com o jornal The Namibian.
Algumas das vítimas resgatadas trabalharam nos navios por vários anos. Immanuel Festus, um coordenador regional do Sindicato de Trabalhadores da Mineração, da Metalúrgica, Marítimos e de Construção da Namíbia (MMMC), disse ao The Namibian que eles provavelmente tenham sido recrutados para mão-de-obra barata.
Algumas vítimas do tráfico nos arrastões de pesca ilegal são crianças. De acordo com o Centro de Pesquisa e Extensão Sobre Tráfico de Seres Humanos, mais de 13.000 crianças de 5 a 17 anos foram traficadas em Boké, Guiné, para trabalharem em embarcações de pesca, de Abril de 2020 a Abril de 2021.
Abusos Ligados a Embarcações Chinesas
Os arrastões chineses têm a fama de praticar o “flagging in,” para países africanos, significando que usam e abusam de regras locais para atribuir bandeira a embarcações detidas e operadas por estrangeiros, colocando-as num registo africano para pescar em águas locais. O flagging in é um sinal comum de que a embarcação está envolvida na pesca ilegal.
A China lidera a maior frota de pesca em águas longínquas do mundo e é o pior infractor de pesca ilegal do mundo, de acordo com o Índice de Pesca INN. Das 10 principais empresas envolvidas na pesca ilegal a nível mundial, oito são da China.
As actividades ilícitas das frotas chinesas são mais predominantes na África Ocidental, que agora é considerada o epicentro mundial da pesca INN. A prática rouba aproximadamente 2,3 a 9,4 bilhões de dólares anualmente dos governos locais, de acordo com a Financial Transparency Coalition.
Os trabalhadores têm-se queixado de abusos abordo de arrastões chineses durante anos.
Bright Tsai Kweku, do Gana, disse à BBC que ele testemunhou um membro da tripulação morrer de cólera, porque a tripulação chinesa não aceitou levá-lo para a costa para receber tratamentos. Ele viu um membro da tripulação morrer de queimaduras graves e outro perecer depois de ter sido ferido por uma hélice.
Musa Sila trabalhou no mar durante aproximadamente quatro décadas, mas nunca na sua carreira recebera tratamento tão péssimo quanto quando passou vários meses numa embarcação chinesa, no Oceano Índico.
Durante uma reunião com as autoridades marítimas quenianas, actores do sector das pescas e políticos,
Sila disse que foi obrigado a comer cobras e envolver-se no crime, de acordo com uma reportagem do jornal queniano, Daily Nation. Sila e outros pescadores disseram que os seus supervisores chineses disseram para que eles não reclamassem e ameaçaram lançá-los para fora do barco caso não cooperassem.
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