EQUIPA DA ADF
O recente surto de golpes de Estado, na África Ocidental, chamou a atenção para a algumas das deficiências na transição de volta à democracia.
Desde 2020, as juntas militares tomaram o poder no Mali (2021 e 2022), no Burquina Faso (duas vezes em 2022) e na Guiné. Quatro tentativas de golpe de Estado fracassadas também ocorreram na África Ocidental, em 2022.
Nenhuma das três juntas no poder pretende ceder o controlo do governo em 2023.
Duas investigadoras do Instituto de Estudos de Segurança (ISS), um grupo de reflexão da África do Sul, encontram-se entre os especialistas que apelam para uma nova abordagem para a gestão das transições militares da África Ocidental de volta à democracia.
A investigadora Aïssatou Kanté e Lori-Anne Théroux-Bénoni, directora regional do Gabinete do ISS para África Ocidental, Sahel e Bacia do Lago Chade, argumentaram que pressionar para um regresso rápido para a democracia não tem sido eficaz.
“Até agora, as respostas dos parceiros regionais e multilaterais revelaram-se mal enquadradas,” escreveram as investigadoras, em Março de 2023. “A Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), a União Africana, as Nações Unidas e outros actores externos tiveram dificuldades em pressionar as autoridades militares para manterem as transições curtas e dirigidas por civis.
“As opções disponíveis para os actores regionais são limitadas, mas incluem a optimização dos resultados do processo, centrando-se na substância das transições em vez da sua duração.”
As investigadoras disseram que estas organizações devem centrar-se em aprender das dinâmicas internas, transições anteriores e fraca governação que estabelecem o estágio para intervenções militares.
Elas observaram que os líderes depostos anteriormente no Burquina Faso, na Guiné e no Mali vieram ao poder através de golpes de Estado ou eleições pós-transição, depois de uma mudança inconstitucional de governo.
Naqueles casos, os líderes civis foram eleitos dentro de 16 meses em média.
Ornella Moderan, uma analista política e de segurança, baseada em Bamako, Mali, disse que a democracia em partes da África Ocidental tem sido prejudicada por décadas de governação ineficaz e uma falta de políticas transformacionais que podem reconquistar a confiança.
O resultado foi uma falta de fé nos processos democráticos, em alguns países. Ela citou um inquérito realizado nas zonas urbanas do Mali, em Maio de 2022, que concluiu que apenas 3% dos inquiridos queriam que os seus líderes de transição priorizassem as eleições.
Moderan também levantou a questão dos chefes de Estado que primam pelo autoritarismo.
“Os protocolos [da CEDEAO] para a democracia e boa governação condenam mudanças inconstitucionais de governo, como golpes de Estado militares, mas não as manipulações constitucionais feitas pelos detentores de poder, desejando permanecer mais tempo no poder,” escreveu ela, num editorial de 2022, do jornal nigeriano, Premium Times.
“Este aparente padrão duplo enfraquece a alta moral da CEDEAO quando se trata de fazer cumprir as normas e os valores democráticos na região.”
Na Guiné e no Mali, os governos de transição escolhidos a dedo pelos líderes da junta prenderam líderes da oposição, baniram jornalistas e organizações da imprensa e influenciaram o diálogo com campanhas tradicionais e das redes sociais.
Este constitui um alarme sonante para os organismos regionais como a CEDEAO serem proactivos ao abordar as questões fundamentais por detrás dos golpes de Estado.
“As organizações regionais podem ajudar, demonstrando consistência no seu apoio pelas normas e valores democráticos,” escreveu Moderan. “Isso exige que se assuma uma posição firme contra as manipulações constitucionais assim como contra as tomadas de poder pelo exército.”
A análise do ISS destacou a necessidade de os cidadãos, os mediadores e outros actores regionais desempenharem papéis importantes para moldar políticas que protejam as instituições democráticas.
A chave está em realizar mudanças sociais que podem levar à estabilidade e ao crescimento sem favorecer os golpes de Estado.
“O regresso à ordem constitucional deve continuar a ser um objectivo fundamental,” concluíram as investigadoras do ISS. “Mas não pode ser apenas o jogo final e o único determinante do sucesso.”