A “Procura Insaciável” de Madeira Rara na China Leva à Destruição de Florestas

EQUIPA DA ADF

Desde o início de 2020, o Mali proibiu a exportação de pau-rosa, também conhecido como kosso. Apesar disso, quase 150.000 toneladas da madeira – correspondente a 220.000 árvores – foram enviadas para fora do país nos últimos dois anos, tudo isto com um único destino: a China.

“O Pau-rosa é uma espécie tradicionalmente e culturalmente valorizada pelos chineses, por isso existe uma procura insaciável”, explicou Haibing Ma, especialista em política asiática da Agência de Investigação Ambiental (AIA) sedeada em Londres, à Voice of America.

A sede da China por pau-rosa e outros recursos florestais, tais como o pau preto (ébano) e a teca, está a despojar as florestas, prejudicando tanto os ecossistemas como as comunidades humanas que deles dependem.

Neste processo, o comércio e abate ilegais de árvores priva as nações de receitas muito necessárias, impulsiona a corrupção a todos os níveis do governo e, em alguns casos, financia grupos terroristas como o Boko Haram.

O relatório recente da AIA, “Madeira Abatida Ilegalmente”, detalha a destruição ambiental, económica e social causada pelo apoio generalizado da China ao abate ilegal de árvores em toda a África.

O Programa Nacional de Protecção das Florestas da China de 1998 colocou controlos apertados na colheita doméstica de pau-rosa e outras madeiras nobres muito procuradas, depois da procura desenfreada ter devastado os seus próprios recursos.

A busca da China por fornecimentos estrangeiros de pau-rosa rapidamente a levou à Gâmbia e ao Benin. Volvida uma década, em 2011, a Gâmbia declarou as suas reservas de pau-rosa praticamente extintas. Ao longo do tempo, as actividades de abate de árvores financiadas pela China espalharam-se por dezenas de países africanos.

Em Moçambique, em 2017, o então Ministro do Ambiente Celso Correia disse que o abate ilegal de árvores lesa o seu país em meio bilião de dólares por ano em receitas perdidas. Uma rusga em 120 estaleiros de madeira encontrou operações ilegais em mais de metade deles. Nesse mesmo ano, Moçambique exportou quase um milhão de toneladas métricas de toros para a China.

Quase 90% do abate ilegal de árvores está a acontecer em países como a Nigéria, que há muito proibiram a exportação de toros. A Nigéria está entre os principais exportadores de pau-rosa e outras madeiras do continente, tendo enviado quase 1,4 mil milhões de dólares em toros entre 2014 e 2018, apesar desta prática ter sido proibida em 1976.

Segundo a AIA, “As importações de toros em grande escala pela China – frequentemente em contravenção às leis nacionais africanas – estão a impedir a reforma dos sectores florestais nacionais e o desenvolvimento das economias locais”.

Muitos dos dados sobre o abate ilegal de madeira nobre em África provêm de registos de importação chineses que detalham a chegada de toros oriundos do continente africano.

Algumas dessas árvores na Nigéria foram cortadas em áreas controladas pelo Boko Haram, que poderá ter beneficiado do abate, de acordo com a AIA.

O Pau-rosa e outras espécies são protegidas ao abrigo da CITES, a Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas de Extinção, que limita a quantidade de toros que um país pode colher e exportar, garantindo ao mesmo tempo a sobrevivência da espécie. A CITES coloca o ónus sobre os países receptores de detectar violações da CITES.

No caso da madeira africana associada à China, os responsáveis pelo abate ilegal têm várias formas de contornar os limites impostos pela CITES. Podem classificar erroneamente os toros, que são transportados em contentores. Podem também subornar funcionários aduaneiros e inspectores para olharem para o outro lado. Em alguns casos, os troncos recentemente abatidos são disfarçados de madeira velha cortada antes da proibição de exportação

A necessidade de usar estradas e equipamento pesado significa que os actores governamentais estão frequentemente envolvidos nas operações de abate ilegal de árvores pela China.

A destruição das florestas da Gâmbia pode ter prejudicado o país, mas não prejudicou o ex-Presidente Yahya Jammeh. Ele criou empresas para coordenar o seu envolvimento no transporte de milhões de dólares em madeira extraída ilegalmente na Guiné-Bissau para ser enviada a partir do porto do seu país, de acordo com um relatório da Iniciativa Global contra o Crime Organizado Transnacional.

No leste da Namíbia, que proibiu a exportação de toros em 2018, os investigadores do Projecto de Denúncia do Crime Organizado e da Corrupção encontraram muitos acampamentos e serrações ilegais, mas nenhuma árvore em pé.

O operário Jacobus Oma ajudou a carregar camiões chineses com troncos antigos de pau-rosa, ainda que lamentasse esta perda significava para a sua terra e para o seu povo. Oma explicou que as vagens de sementes de pau-rosa são um alimento tradicional para o seu povo, os San, durante a estação seca.

“As crianças nunca mais verão árvores como esta nas suas vidas”, disse Oma.

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