Violência Étnica Ameaça o Processo de Paz da Etiópia

EQUIPA DA ADF

A Etiópia está inundada de violência étnica.

Numa altura em que a possibilidade de conversações de paz para acabar com a guerra civil sangrenta entre o governo federal e a região separatista de Tigré está a materializar-se, antigas feridas foram abertas no oeste.

“Muito antes do conflito com Tigré, no norte da Etiópia, houve impunidade generalizada por contínuas violações de direitos na região de Oromia, da Etiópia, incluindo em zonas que já sofreram de conflito,” disse a organização internacional, Human Rights Watch (HRW), no relatório do dia 4 de Julho. “Muitas destas violações ainda persistem e requerem atenção internacional urgente.”

Dois massacres, ocorridos em Junho último e no início de Julho, tiveram como alvo os Amhara, o segundo maior grupo étnico, mas a minoria na região de Oromia. O Oromo é o maior grupo étnico da Etiópia.

Relatos sobre o número de mortes do ataque do dia 25 de Junho variam de 340 a mais de 1.500, fazendo com que este seja um dos incidentes mais mortais de violência étnica da Etiópia em muitos anos.

Pouco mais de uma semana depois, aconteceu de novo na zona de Kellem Wollega, cerca de 400 quilómetros a oeste da capital, Adis Abeba.

O Primeiro-Ministro Abiy Ahmed culpou o Exército de Libertação de Oromo (OLA), um grupo dissidente do partido Frente de Libertação de Oromo (OLF).

“Iremos perseguir este grupo terrorista até ao fim e eliminá-lo,” escreveu Abiy numa série de publicações no Twitter depois do segundo massacre, no dia 4 de Julho. “Existe tolerância zero para os actos horrendos que dizimaram vidas recentemente … perpetrados por elementos cujo objectivo principal é aterrorizar as comunidades.”

O porta-voz do OLA, Odaa Tarbii, desmentiu as acusações de Abiy e culpou as milícias aliadas ao governo, alegando que as forças federais destacadas para as cidades ficaram paradas e não reagiram.

“As acusações do Primeiro-Ministro são uma tentativa do regime de desviar a atenção do facto de este ter dificuldades para manter a ordem nas suas próprias forças,” disse à agência de notícias, Reuters.

Um deputado do Partido de Prosperidade, de Abiy, Hangaasa Ahmed Ibraahim, apoiou a afirmação de Tarbii, dizendo que durante um vídeo transmitido ao vivo, nas redes sociais, no dia 5 de Julho, oficiais seniores do governo, em Oromia, ajudaram a organizar os ataques.

Ibraahim disse que aqueles oficiais incluíam o líder da região e o comissário da polícia.

“Estamos cansados de ver declarações de ‘descanse em paz’ e ‘condolências’,” disse, dirigindo a sua ira à Abiy. “Faça o seu trabalho de liderar o país.”

Confusão e relatórios conflituantes tornaram-se uma norma por causa de um apagão nas comunicações, imposto pelo governo de Oromia, limitando o acesso aos meios de comunicação e aos grupos de direitos.

A HRW disse que “uma campanha abusiva do governo no combate à insurgência contra o [OLA],” incluindo atrocidades, violações de direitos e detenções em massa, foi parte do problema.

“Os civis [são] encontrados no meio de sofrimento de vários abusos,” comunicou a HRW, acrescentando que as forças de segurança governamentais, de forma rotineira, prendem jovens Oromos, coloca-os sob custódia e acusam-nos de apoiar o OLA sem julgamento.

Contudo, Nagessa Dube, antigo procurador-geral da região de Oromia, disse, em Julho de 2021, que o “OLA aparentemente tem atacado funcionários civis do governo para causar medo no público.”

O conflito remonta a 1973 quando a OLF e o seu braço armado, o OLA, foram formados para lutar contra o império etíope e criar uma Oromia independente. Desde um acordo de paz de 2018, a Etiópia considera a OLF um partido político legalmente constituído.

Mas o OLA, que o governo federal agora chama de Shene, foi designado de grupo terrorista em Maio de 2021, depois de este ter-se aliado às forças tigrenhas.

Depois do ataque de Julho, o chefe da Comissão da União Africana assim como o chefe da Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas apelaram para uma investigação. No dia 6 de Julho, parlamentares etíopes criaram um comité exactamente para fazer isso.

Os dois massacres despertaram condenação internacional e questionamentos quanto à responsabilidade do governo e a sua capacidade de combater a violência causada por motivos étnicos.

“Um problema repete-se centenas de vezes, porque não há responsabilização,” Ministro do Estado para a Paz, Taye Dendea, escreveu numa publicação do Facebook, do dia 4 de Julho, respondendo ao segundo ataque. “Resolver um quebra-cabeças, através da responsabilização agora é uma questão de sobrevivência! Se isso continuar, o perigo ficará fora do controlo.”

A solução de erradicação preferida por Abiy não persuadiu os parlamentares que o questionaram no dia 7 de Julho.

“As mortes que ocorreram na Etiópia não devem ser consideradas, conforme alguns estão a descrever, como tendo sido devidas à negligência, que é porque o governo não fez o seu trabalho ou que o governo não exerce a sua responsabilidade,” respondeu Abiy.

“Este governo está a procurar proteger os seus cidadãos 24 horas por dia.”

No seu relatório anual divulgado no dia 8 de Julho, a Comissão Etíope de Direitos Humanos (EHRC), indicada pelo Estado, culpou a “todos os partidos” pela violência étnica que assola o país.

O comissário-chefe da EHRC, Dr. Daniel Bekele, respondeu aos recentes massacres em Oromia, reiterando a demanda de formação de forças de segurança do governo para proteger os cidadãos.

“A contínua insegurança na região e aquilo que parece mortes de residentes que visam atingir deliberadamente certos grupos étnicos deve chegar ao fim imediatamente,” escreveu no Twitter, no dia 4 de Julho.

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