EQUIPA DA ADF
As florestas e aldeias tranquilas do distrito de Foni Kansala, na Gâmbia, ficaram agitadas no dia 24 de Janeiro quando soldados perseguiram um camião cheio de madeira.
O que se seguiu foi o mais recente espasmo de violência na região da Casamança do Senegal, o local de um dos conflitos africanos com maior período de duração. Mas, desta vez, existe esperança de que possa haver paz.
“Na sua perseguição, os homens da quinta zona militar atravessaram, talvez sem se aperceberem, a fronteira com o Senegal — ‘uma linha na areia,’ descreve um habitual daquela região,” noticiou o jornal Le Monde. “Eles teriam então entrado numa das zonas de acantonamento [acampamento militar] do MFDC [Movimento da Forças Democráticas da Casamança], liderado no norte da Casamança por Salif Sadio, um líder rebelde histórico.
“Os soldados depois estiveram sob fogo de armas de pequeno porte e lançadores de mísseis, retribuíram fogo e posteriormente recuaram para a Gâmbia.”
Os soldados estavam a controlar o tráfico de madeira como parte do ECOMIG, uma missão de manutenção da paz na Gâmbia, do bloco regional da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO).
A batalha resultou na morte de quatro soldados senegaleses e um membro do MFDC. Sete soldados senegaleses foram levados como prisioneiros.
Os residentes estão preocupados de que os conflitos reiniciem as tensões que há muito se encontram conturbadas. Mas quando os soldados foram libertos ilesos, três semanas depois, alguns consideraram isso como um sinal de que a paz pode finalmente estar no horizonte.
Robert Sagna, o antigo presidente do conselho municipal da capital regional da Casamança, Ziguinchor, é um dos esperançosos.
“Existe uma verdadeira trégua,” disse ao Le Monde. “Não é ainda a paz, mas devemos a todo custo evitar o ressurgimento da guerra.”
Desde 1982, o MFDC esteve a lutar pelo controlo da região sudoeste entre a Gâmbia e a Guiné-Bissau. A população da Casamança é cultural e etnicamente distinta do resto da população do Senegal.
Os residentes de Casamança há muito se queixam de serem deixados para trás em termos de investimentos económicos e serviços sociais, chegando a fazer com que alguns estejam a favor da independência. Contudo, as tácticas violentas do grupo rebelde, incluindo raptos e execuções, assim como as suas ligações com o tráfico ilícito fizeram com que muitos civis deixassem de o apoiar.
Os conflitos deixaram mais de dez mil deslocados ao longo de 40 anos, enquanto milhares morreram, incluindo muitos civis alegadamente por causa de minas terrestres plantadas pelos rebeldes.
Os conflitos atingiram o ponto mais alto entre 1992 e 2001 com mais de 1.000 mortes relacionadas com as batalhas. A região tem experimentado desde essa altura tumultos esporádicos, acordos de cessar-fogo e tréguas, enquanto o MFDC se divide em facções.
Em Maio de 2014, Sadio propôs a paz com representantes do governo senegalês e declarou um cessar-fogo unilateral depois de a Comunidade de Sant’Egídio, uma associação católica leiga, organizar conversações secretas no Vaticano.
Com a maior parte das facções a apoiarem o cessar-fogo, o conflito foi descrito nestes últimos anos como sendo uma insurgência de intensidade baixa.
Depois de uma ofensiva senegalesa ter desactivado várias bases rebeldes no interior das florestas da Casamança em 2021, o governo virou as suas atenções para desmantelar o MFDC, fragilizando as suas fontes de receitas — abate ilegal de madeira e comercialização de cannabis.
Entre Setembro 2021 e Janeiro de 2022, as forças senegalesas destacadas para a zona da fronteira aumentaram as suas operações para destruir plantações de marijuana cultivadas pelo MFDC. Durante esse tempo, as tropas interceptaram 77 camiões que transportavam ilegalmente pau-rosa de grande valor, madeira de teca e outra madeira nobre das florestas da Casamança para serem exportadas a partir da Gâmbia, de acordo com o Exército.
Uma batalha foi inevitável, mas a paz continua a ser uma possibilidade.
Quando o MFDC libertou os sete soldados e os entregou à custódia da CEDEAO no dia 14 de Fevereiro, Sadio disse que o fez de forma “incondicional” para restaurar um “clima de confiança” com o governo senegalês.
“Este é claramente o confronto mais sangrento desde que foi declarada a trégua unilateral em 2012 pelo MFDC. Todos ficaram surpreendidos,” um líder da Sant’Egídio disse ao Le Monde. “No passado, o governo e o exército senegalês, muitas vezes, responderam com força a este tipo de eventos. Parece que todos hoje querem reduzir a pressão.”