EQUIPA DA ADF
Os atacantes vieram em seis canoas de madeira. Uma delas com um pequeno motor rebocava as outras.
No escurecer do dia, eles chegaram à Ilha de Matemo, bem próximo da costa da província de Cabo Delgado, no norte de Moçambique.
Os atacantes mataram pelo menos dois aldeões, incendiaram dezenas de casas e pilharam lojas em busca de alimentos e medicamentos durante toda a noite de 1 de Fevereiro.
Bem cientes de que a posição militar mais próxima se encontrava 10 quilómetros ao sul, na capital distrital, Ilha do Ibo, eles gritavam um para o outro para “fazerem rápido antes que cheguem os porcos [os militares] e seus ajudantes,” de acordo com o site de notícias, Moz24Horas.
Um atacante deixou uma mensagem escrita que dizia: “Não pensem que estes porcos que vos protegem irão vos ajudar. Nem mesmo aqueles da SADC [Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral] e do Ruanda.”
Os militantes fugiram de manhã antes das forças de segurança aparecerem em helicópteros sobrevoando a ilha. Nas redes sociais, um grupo afiliado do Estado Islâmico, chamado Província do Estado Islâmico da África Central, reivindicou o ataque.
Embora tenha havido muitas indicações sobre o sucesso do exército naquele país, ataques como estes demonstram que a insurgência que remonta desde 2017 está longe de chegar ao fim. Especialistas alertam que os terroristas agora estejam a adaptar tácticas de guerrilha de pequena escala.
“A insurgência não foi derrotada,” analista em matérias de segurança, Jasmine Opperman, disse à Newzroom Afrika, no dia 5 de Fevereiro. “O impulso ainda não foi rompido. Pelo contrário, está a piorar.”
As operações de combate aos insurgentes começaram em Julho de 2021 quando as Forças Armadas de Moçambique (FADM) começaram a realizar operações conjuntas com as Forças de Segurança do Ruanda, e a SADC destacou a sua Missão da Força de Intervenção em Moçambique (SAMIM).
As três forças comunicaram uma série de missões bem-sucedidas de alta categoria, recuperando cidades e povoados, desmantelando bases, reestabelecendo uma rota de comércio fundamental na província e reivindicando ter restaurado a normalidade.
“As operações das forças de segurança estão a surtir um efeito. Os terroristas estão a enfraquecer,” o Comandante Geral da Polícia de Moçambique, Bernardino Rafael, falou no canal de rádio nacional, no dia 31 de Janeiro, afirmando que sete líderes dos insurgentes foram mortos nos meses de Dezembro e Janeiro.
Nestas últimas semanas, o presidente moçambicano, Filipe Nyusi, viajou pela província de Cabo Delgado com uma mensagem de estabilidade e optimismo. O presidente sul-africano, Cyril Ramaphosa, também visitou a província e teve um encontro com as tropas da SAMIM juntamente com Nyusi num acampamento militar, no dia 3 de Fevereiro.
Apesar dos destaques e pronunciamentos positivos, os esforços de combate aos insurgentes continuam a enfrentar problemas de comunicação, colaboração e logística.
O número de soldados não é o problema, disse Opperman, estimando que a força da SAMIM seja de 1.300 homens, incluindo cerca de 600 soldados sul-africanos.
“O problema está na coordenação e na partilha de inteligência,” disse. “O Ruanda tende a ser proactivo, e as suas tropas são bem treinados. Possui uma área bem fixa, que faz com que seja fácil para os seus aproximadamente 2.500 soldados.
“Para a SAMIM, existe uma área vasta por cobrir … num campo de batalha altamente difícil. A falta de inteligência significa que não podem ser proactivos, e estão confinados às principais vias de acesso.”
Enquanto as forças do Ruanda ajudam a garantir a segurança das reservas de gás natural de Moçambique, próximo da cidade de Palma, na Península de Afungi, as actividades dos terroristas aumentam em direcção à costa oeste.
O observatório do conflito, Cabo Ligado, que monitoriza e analisa a violência política em Cabo Delgado, noticiou a ocorrência de dezenas de ataques nos distritos de Nangade e Mueda — um claro desvio em relação ao distrito de Palma. As actividades dos terroristas também aumentaram na parte oeste de Cabo Delgado, na província do Niassa, onde dezenas de milhares de pessoas deslocadas vulneráveis procuram refúgio.
Foram feitos esforços para lidar com as tácticas de guerrilha.
Os três exércitos criaram um Comité de Operação Conjunta para organizar as colaborações e a partilha de inteligência. A missão de formação da União Europeia está a trabalhar com as FADM para criar uma força de reacção rápida.
Mas os efeitos destas medidas não estão claros, e os relatos locais continuam a destacar a natureza desarticulada e lenta das operações de combate aos insurgentes no geral.
Opperman chamou esta situação de ambiente ideal para que os terroristas executem pequenos ataques.
“Esta foi uma preocupação desde o começo,” disse. “A militarização é necessária para criar a estabilidade, mas se não houver cooperação entre as diferentes forças, haverá grupos de soldados a correr em direcções opostas.”