EQUIPA DA ADF
Pouco depois de a COVID-19 ser declarada uma pandemia, em Março de 2020, o Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, apelou para a paz para que o mundo possa centrar as suas atenções em derrotar o vírus.
“O vírus não se preocupa com a nacionalidade ou etnia, facção ou fé. Ele ataca a todos, sem tréguas,” disse ele. “A fúria do vírus ilustra a loucura da guerra.”
Dois novos relatórios afirmam que, apesar da COVID-19, certas regiões em África continuaram a ser assoladas pela violência.
Os conflitos reduziram a nível global, de acordo com o relatório anual de 2020, feito pelo projecto de Localização de Conflitos Armados e Dados de Eventos (ACLED).
“A violência política diminuiu em aproximadamente 22%,” lê-se no relatório, destacando África como uma excepção. “As mortes resultantes da violência política diminuíram em 19%… em todas as regiões, exceptuando a África.”
Outra organização, o Centro Africano para a Resolução Construtiva de Litígios (ACCORD), tem estado a comunicar, desde Abril de 2020, sobre como a pandemia afecta os conflitos continentais. Correlaciona os elevados números de infecção pela COVID-19 na África Subsaariana com as zonas de instabilidade, como a Etiópia, Moçambique e Nigéria.
Escrevendo para o ACCORD, o pesquisador Rui Saraiva recentemente examinou Cabo Delgado, uma província do norte de Moçambique, onde casos cada vez mais crescentes de COVID-19 coincidiram com um aumento na violência perpetrada por insurgentes islamitas com ligações com o ISIS.
Ao deixar mais de 670.000 pessoas deslocadas, os ataques perpetrados pelo Ansar al-Sunna exacerbaram o impacto da pandemia.
As forças de segurança “são ineficientes em abordar a raiz deste problema a curto ou a longo prazo,” escreveu. “Abordagens paragramáticas, adaptativas e holísticas focalizadas na resiliência têm maiores probabilidades de abordar de forma eficaz a interacção entre o extremismo violento e as ameaças de segurança humana, como a crise da COVID-19.”
Embora a pandemia da COVID-19 tenha feito 131.000 vítimas mortais em África e infectado mais de 4,8 milhões de pessoas nos passados 14 meses, também providenciou uma cobertura para as forças governamentais, insurgentes, militares e organizações criminosas para reprimir ou atacar os civis.
“Os eventos extremos como a pandemia do coronavírus tiveram um impacto directo e significativo na desordem,” director de pesquisas do ACLED, Roudabeh Kishi, escreveu num artigo, de Julho de 2020, para a revista Foreign Policy. “Os governos podem adoptar legislação imediata para limitar a actividade dos cidadãos, e os actores estatais e não estatais podem de igual maneira explorar a instabilidade à volta da pandemia, das calamidades naturais ou de eventos semelhantes, para avançarem as suas prioridades políticas.”
O relatório de 2020, do ACLED, divulgado em Março de 2021, enfatizou alguns desenvolvimentos surpreendentes.
Os ataques contra civis diminuíram em todo o mundo, de 2019 a 2020, excepto os raptos, que aumentaram na Nigéria em 169% e na República Democrática do Congo em 21%.
A violência política em África aumentou em 4.328 incidentes, causando 9.298 mortes. O relatório também observou o aumento na identidade das milícias, que estão organizados por factores, tais como religião, região ou etnia, em África no ano passado, “com um aumento de 46% no número de identidades de militantes activos distintos e nomeados em 2020, em comparação com 2019.”
As organizações extremistas violentas claramente tiraram vantagens da pandemia, enquanto o Boko Haram continuava a aterrorizar a Nigéria e as partes circunvizinhas da região do Lago Chade, o al-Shabaab desencadeava ataques regulares na Somália e os extremistas lutavam contra as forças estatais e da coligação no Sahel.
O apelo de Guterres para a paz, entretanto, continua.
“Será essencial para os países africanos sustentarem os seus esforços para silenciar as armas e combater o extremismo violento,” disse. “Eu felicito o apoio dos africanos ao meu apelo para um cessar-fogo global.”