Trabalhadores Senegaleses Lutam Contra Fábricas de Farinha de Peixe

EQUIPA DA ADF

As pessoas que dependem de peixe para a sua alimentação e renda, no Senegal, estão cada vez mais preocupadas com a proliferação de fábricas de farinha de peixe e de óleo de peixe, de propriedade chinesa, que abriram recentemente.

As fábricas de farinha de peixe pulverizam peixe transformando-o em pó para servir de ração para a piscicultura, como camarão, assim como para porcos, galinhas e outros animais. A China é o maior importador de farinha de peixe do mundo e um dos maiores exportadores de camarão.

As fábricas representam uma grande ameaça à segurança alimentar porque geralmente elas são fornecidas por grandes arrastões estrangeiros que pescam toneladas de peixe por dia – muito mais do que as canoas artesanais – por vezes de forma ilegal. De acordo com as Nações Unidas, 90% dos locais de pesca do Senegal estão totalmente explorados ou próximos de um colapso.

“No Senegal, tínhamos duas ou três fábricas que processavam apenas aparas de peixe, mas agora na última década eles começaram a construir novas fábricas. Existem cerca de nove fábricas construídas, mas, devido à pressão das comunidades e [organizações não governamentais], apenas três ou quatro continuam operacionais hoje,” Dr. Ibrahima Cissé, gestor de campanha dos oceanos da Greenpeace Africa, em Dakar, Senegal, disse à ADF num e-mail. “Estas fábricas não deviam utilizar peixe fresco, mas para serem lucrativas, elas simplesmente não podem depender apenas das aparas.”

No Senegal, o peixe representa cerca de 70% da proteína animal consumida, de acordo com um relatório da Greenpeace, divulgado em 2019.

“É muito difícil substituir a proteína do peixe porque representa proteína animal barata, e os programas do governo para lutar contra a má nutrição sempre são imperfeitos,” disse Cissé. “A melhor solução é simplesmente permitir que as pessoas tenham acesso ao peixe em vez de utilizar grandes quantidades de peixe para o processamento e transformá-lo em ração para animais de estimação ou para o gado em outros cantos do mundo.”

Conservacionistas e associações de pescadores artesanais da África Ocidental dizem que as fábricas também estão a destruir os ecossistemas, devastando o meio ambiente e prejudicando o turismo.

No Senegal, o peixe representa 70% da proteína animal consumida. Esse total é mais de 50% na Gâmbia, de acordo com um relatório de 2019, divulgado pela Greenpeace, um grupo de conservação global. A Greenpeace possui 50 fábricas de farinha de peixe e de óleo de peixe registadas no Senegal e na região da África Ocidental, maior parte das quais na Mauritânia.

Fatou Samba, uma processadora de peixe num local próximo de Dakar, Senegal, está entre os trabalhadores da indústria pesqueira do país que clama ao governo para encerrar as fábricas. O sector das pescas do Senegal empregou mais de 600.000 pessoas em 2019; muitos empregos de processamento de peixe na região são ocupados por mulheres.

Antes de as fábricas abrirem, os pescadores vendiam peixe para ser convertido em farinha de peixe para os mercados locais.Agora, os processadores de peixe são incapazes de concorrer com os preços pagos pelas fábricas de farinha de peixe por uma caixa de peixe, sendo que “nós temos menor acesso ao peixe,” disse Samba à Greenpeace.

“Este é um desastre para a população porque precisamos de peixe, precisamos de trabalhar assim como precisam todos aqueles que dependem das actividades nos portos, locais de processamento e mercados locais,” disse ela. “O Estado tem de obrigar as fábricas de farinha de peixe e óleo de peixe a não comprarem peixe para o processamento para a aquacultura industrial e ração para alimentar gado ou aves. Este peixe é uma necessidade para aqueles que vivem no Senegal e na região da África Ocidental como uma fonte de alimentação e meio de subsistência.”

Na cidade setentrional de Gandiol, os residentes exigiram que as autoridades encerrassem a Sea Production, uma fábrica de farinha de peixe chinesa, alegadamente porque o ar naquela zona rural tem sido difícil de respirar desde que a fábrica abriu em 2016, de acordo com Afrik21, que produz relatórios sobre assuntos ligados ao meio ambiente em África.

“Desde que a fábrica começou as suas actividades, o ensino das crianças ficou ameaçado na nossa aldeia,” a professora Ndatté Diallo disse à Afrik21. “Os nossos alunos têm o direito de aprender num ambiente saudável. Por isso, apelamos ao Estado e pedimos o encerramento completo desta fábrica.”

Abdoulaye Ndiaye, gestor de campanhas do oceano da Greenpeace, acrescentou que a poluição da fábrica “também tem um impacto negativo sobre a vida ambiental da população da zona e sobre as suas actividades, desde a pesca até a agricultura e a pastorícia.”

Os residentes locais apelaram ao governo para interromper o licenciamento de arrastões estrangeiros, conhecidos pela sua pesca ilegal, não declarada e não regulamentada (INN) em zonas proibidas. A China é o pior infractor do mundo quando se trata de pesca INN, de acordo com um índice desenvolvido por uma instituição denominada Gestão de Recursos Aquáticos Poseidon e pela Iniciativa Global Contra o Crime Organizado Transnacional.

No ano passado, o Ministro das Pescas do Senegal rejeitou publicamente os pedidos de licença de 52 arrastões, mas a pressafrik.com, um jornal online sediado em Dakar, comunicou que o governo tinha emitido licenças para três embarcações de pesca da frota Fu Yuan Yu, da China. Barcos da frota foram expulsos pela guarda costeira do Djibouti, em 2017, depois de pescadores locais terem protestado contra a sua presença.

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