À Medida Que a África do Sul Reabre, Cientistas Alertam Contra a Complacência
EQUIPA DA ADF
A África do Sul foi severamente afectada pela COVID-19, tendo registado o maior número de casos e de mortes no continente.
Até meados de Outubro, o país tinha registado aproximadamente 704.000 casos. Esse número representa 45% do total de 1,6 milhões de casos do continente. Com mais de 18.400 mortes registadas, a África do Sul também lidera o continente nesse aspecto, de acordo com o Centro Africano de Controlo e Prevenção de Doenças.
Dito isto, comparado a outros países com mesmas dimensões — Itália com 36.600 mortes ou França com aproximadamente 33.500 mortes, por exemplo — a experiência da África do Sul com a COVID-19 foi drasticamente diferente. Isso apesar de ter um grande número de cidadãos com outras doenças, como o HIV/SIDA, a tuberculose e a diabetes, sendo que todas elas podem fazer com que as pessoas sejam mais propensas a morrer pela COVID-19.
As autoridades de saúde pública continuam a especular sobre por que razão a África do Sul registou menor número de mortes do que alguns dos outros países. Poderia ser a idade relativamente jovem da população, que tem uma idade média de 27,6 anos? Talvez os confinamentos obrigatórios que ocorreram ainda cedo ou talvez seja produto da experiência com epidemias anteriores? Será que o melhor estabelecimento médico do continente estava melhor preparado para tratar dos pacientes?
“Uma possível explicação pode ser que tenha havido situações de informação de número de casos registados abaixo do real e realização de testes em número insuficiente no continente africano, devido a graves limitações de recursos disponíveis,” Professor Salim Abdool Karim, epidemiologista do Conselho de Pesquisa Médica da África do Sul e conselheiro do governo sul-africano, disse à ADF. “Entretanto, o internamento de pessoas com doenças respiratórias agudas em todos os países de África não se correlaciona com esta hipótese.”
O Professor Emérito, Jonny Myers, da Universidade da Cidade do Cabo, argumenta que embora a África do Sul esteja a recuperar, ela pode ter sido mais afectada pelo vírus do que muitos acreditam. A sua pesquisa sugere que o número de registo de mortes causadas pela COVID-19 na África do Sul é pior do que a contagem oficial. Myers é especialista de saúde pública e antigo director do Centro de Pesquisas Ambientais e de Saúde Ocupacional, no Departamento de Saúde Pública e Medicina Familiar daquela universidade.
Como é que ele chega à essa conclusão? Olhando para as mortes em excesso na África do Sul.
Mortes em excesso — o número de mortes acima do normal para um determinado período do ano — esconde-se em segundo plano de qualquer debate à volta da COVID-19. Elas são a sombra que se projecta sobre o número oficial assente nas certidões de óbito e em outros documentos do governo.
“Elas representam o padrão dourado de medições para as mortes pela COVID-19 e constituem um limite superior do número real de mortes pela COVID-19 durante o período epidémico,” escreveu Myers num artigo publicado num jornal online sul-africano, Daily Maverick.
Também são difíceis de calcular e exigem uma profundidade de manutenção de registos que poucos outros países africanos conseguiriam fazer, disse Myers à ADF.
De acordo com os números semanais registados pelo Conselho de Pesquisa Médica da África do Sul, até inícios de Outubro, a África do Sul tinha registado 45.701 mortes em excesso. A dimensão de mortes em excesso sugere que a África do Sul não se saiu tão bem no que diz respeito à pandemia, argumenta Myers.
Karim duvida disso. Ele indica que as mortes em excesso tiveram um declínio constante desde o seu pico em Julho. Embora Myers afirme que seja provável que a maior parte das mortes em excesso esteja ligada à COVID-19, Karim tem um ponto de vista diferente.
“Não seria sábio especular numa altura destas,” disse à ADF. “Não sabemos. Nas passadas duas semanas, as mortes em excesso reduziram para quase nenhuma, então, temos um número mínimo de casos.”
À medida que o hemisfério sul passa para os finais da primavera e do verão, Karim continua cautelosamente optimista de que a África do Sul possa ver as suas mortes pela COVID-19 a registarem um declínio ainda maior.
“Temos uma população jovem, e eu continuo com esperanças de que os sul-africanos irão comportar-se de forma responsável e observar de forma diligente o uso da máscara, o distanciamento social e a lavagem das mãos,” disse Karim. “Tem a ver com abraçar o novo normal para prevenir uma grave segunda vaga. Contudo, a complacência pode levar a uma segunda vaga.”
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