EQUIPA DA ADF
Assim que a República Democrática do Congo (RDC) estava a terminar o seu maior e mais prolongado surto do vírus Ébola nas províncias orientais, um outro emergia no nordeste, no início de Junho.
O 10° surto do vírus mortal na RDC começou em Agosto de 2018 e foi eliminado no dia 25 de Junho de 2020. Em 23 meses, houve 3.470 casos e 2.287 mortes, incluindo 41 funcionários do sector de saúde.
O 11° surto foi anunciado no dia 1 de Junho depois de um conjunto de casos ter sido descoberto em Mbandaka, a cidade capital da Província do Equador, e seus arredores. Até hoje, a Organização Mundial de Saúde (OMS) reportou 124 casos e 50 mortes.No dia 9 de Junho, a OMS declarou não haver ligação entre o 10° e o 11° surtos, acrescentando que o vírus do novo surto é diferente daquele que circulou na província do Equador durante o nono surto do país em 2018.
“Com 100 casos do Ébola em menos de 100 dias, o surto na Província do Equador está a evoluir de uma forma preocupante,” disse a Dra. Matshindiso Moeti, directora regional da Organização Mundial de Saúde (OMS) para África, na página da internet daquela organização. “O vírus está a propagar-se numa região extensa e irregular que exige intervenções dispendiosas, e estando os recursos e a atenção virados para a COVID-19, é difícil dar maior ênfase às operações.”
A OMS disse que o surto já se propagou para 12 zonas de saúde da província – numa extensão de cerca de 290 quilómetros de floresta densa, fazendo com que seja difícil alcançar as aldeias afectadas e ainda mais difícil investigar a sua origem.
A organização Médicos Sem Fronteiras (MSF) possui equipas a trabalhar em cinco das 18 zonas de saúde da província do Equador, em nove instalações de tratamento e isolamento.
Na sua página da internet, a MSF comunica que existem desafios enormes para poder alcançar as zonas de saúde remotas. Somente existe um helicóptero disponível na região. Atravessar estradas e trilhos com florestas densas, muitas vezes, requer andar de motorizada durante horas numa velocidade apenas um pouco mais rápida do que a que se faz a pé. Muitas zonas apenas são acessíveis de canoa, atravessando rios e lagos.
Esses cursos de água, utilizados por milhares de pessoas todas as semanas, são uma grande preocupação em termos de alastramento deste surto para Kinshasa, a cidade capital da RDC, assim como para os países vizinhos.
Mbandaka, um dos principais portos ao longo do rio Congo, com 1 milhão de residentes, liga-se a Kinshasa, uma mega cidade de mais de 14 milhões de habitantes, por meio de uma rota no rio e com tráfico muito denso.
Mesmo do outro lado do rio, partindo de Kinshasa, encontra-se Brazzaville, a capital da República do Congo, com mais de 2,4 milhões de habitantes. Ao longo de toda a Província do Equador, a fronteira é porosa e com um comércio robusto.
A MSF também aponta a existência de problemas relacionados com a necessidade de educar as comunidades rurais sobre as práticas adequadas para combater a epidemia, tais como isolar, informar e testar as mortes na comunidade bem como ajustar os rituais fúnebres tradicionais para evitar a exposição.
Muitos dos instrumentos utilizados para reprimir o 10° surto do Ébola na RDC – a vacinação, o rastreamento de contactos e a educação cívica – dão esperança na luta para erradicar o mais novo surto do Ébola.
No dia 19 de Dezembro de 2019, a Agência Americana dos Medicamentos e da Alimentação (U.S. Food and Drug Administration) aprovou uma vacina para prevenir a estirpe mais mortal, o vírus do Ébola do Zaire. A OMS comunicou que 31.179 pessoas foram vacinadas desde 5 de Junho.
O Ministério de Saúde da República Democrática do Congo (RDC), a OMS e outras organizações parceiras rapidamente estabeleceram sistemas de avaliação. Quando a equipa da OMS chegou, em 2018, havia 153 contactos alistados para rastreamento. Duas semanas depois, estavam alistados 400 contactos, com 94% a passar por uma monitoria regular.
“Para erradicar o surto do Ébola, é necessário quebrar a cadeia de transmissão, e fazer o rastreamento de contactos é a única forma de quebrar a cadeia de transmissão,” disse o especialista em questões de Ébola, Pierre Rollin, do Centro de Controlo e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos, na página da internet da OMS.
O governo e as organizações parceiras também desenvolveram um plano eficaz para aceder às comunidades remotas. Epidemiologistas e equipas de funcionários do sector de saúde trabalham com os líderes locais, criam confiança, realizam testes para ver se existem casos de infecção e dissipam casos de desinformação — a principal causa da existência de risco de segurança nas províncias do oeste controladas por milícias.
Felizmente, não existe esse tipo de instabilidade no nordeste. Mas os agentes de intervenção primária de saúde devem, muitas vezes, vencer a falta de confiança profunda em aldeias remotas.
“Nós aprendemos, depois de anos de trabalho com o Ébola na RDC, a importância de envolver e mobilizar as comunidades,” disse a porta-voz da OMS, Fidélia Chaib, na página da internet da organização. “A OMS está a trabalhar com o UNICEF no envolvimento de religiosos, jovens e líderes comunitários para realizar campanhas de sensibilização sobre o Ébola.”
Para combater o 11° surto, a Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional, no dia 7 de Setembro, anunciou um apoio de 15 milhões de dólares para ajudar a erradicar o surto. A OMS doou 2,3 milhões de dólares.
Apesar destas contribuições, o financiamento é uma preocupação constante.
“Sem apoio adicional, as equipas no terreno terão dificuldades de combater o vírus,” disse Moeti. “A COVID-19 não é a única emergência que precisa de um apoio robusto. Conforme sabemos através da nossa recente história, nós ignoramos o Ébola para a nossa própria desgraça.”