EQUIPA DA ADF
El-Fasher, a capital sitiada do Darfur do Norte, continua nas mãos das Forças Armadas do Sudão (SAF) após mais de quatro meses de ataques das Forças de Apoio Rápido (RSF). A cidade tornou-se estratégica e simbolicamente importante na batalha pelo controlo de Darfur.
O Darfur do Norte, o maior Estado da região do Darfur Ocidental do Sudão, continua fora do controlo das RSF há mais de nove meses, depois de as suas forças terem conquistado outros Estados da região. El-Fasher, uma das maiores cidades do Sudão, tem estado sob constantes ataques das RSF desde Abril. As SAF e as milícias locais suas aliadas têm mantido as RSF à distância.
O Movimento/Exército de Libertação do Sudão, de Minni Minnawi, governador de Darfur, e o Movimento para a Justiça e a Igualdade (JEM), liderado por Jibril Ibrahim, abandonaram a sua neutralidade declarada no início deste ano e criaram a Força Conjunta dos Movimentos de Luta Armada para ajudar as SAF a defender el-Fasher e o Darfur do Norte.
O controlo governamental de el-Fasher transformou a cidade numa pedra angular da luta de 18 meses das SAF contra as RSF.
“Perder um centro urbano importante como el-Fasher pode agravar a instabilidade regional, potencialmente espalhando o conflito e a deslocação para países vizinhos como o Chade, o Níger e o Mali,” o analista Ibrahim Z. Bahreldin, professor associado da Universidade Rei Abdulaziz, da Arábia Saudita, escreveu recentemente para o The Conversation.
Cidade com quase 2 milhões de habitantes, el-Fasher alberga uma mistura diversificada de grupos étnicos, incluindo comunidades não árabes como os Fur, os Zaghawa e os Masalit. As RSF têm como alvo todas estas comunidades na actual guerra, tal como o antecessor das RSF, a Janjaweed, fez durante o genocídio do Darfur há 20 anos.
Em el-Fasher encontram-se também os campos de pessoas deslocadas de Abu Shouk, Zamzam e Al Salaam, criados durante os ataques da Janjaweed. A cidade tornou-se um refúgio para 500.000 pessoas que fugiram dos combates noutros Estados de Darfur e na região de Cartum, segundo as Nações Unidas.
“A cidade sitiada está a ficar sem alimentos, combustível e material médico, o que amplia o sofrimento dos residentes, que têm poucos lugares para onde fugir ou esconder-se,” o Sudan War Monitor escreveu recentemente.
Os especialistas temem que a queda de el-Fasher possa levar a uma repetição do massacre que ocorreu no início da década de 2000. Também daria ao líder das RSF, o General Mohamed Hamdan “Hemedti” Dagalo, o controlo total do Sudão Ocidental.
Nesse cenário, Hemedti poderia transformar Darfur no seu centro de poder, criando essencialmente um Estado dentro de um Estado que fragmentaria ainda mais o Sudão, segundo a analista Teresa Noguiera Pinto. O Darfur foi em grande parte independente até 1916, altura em que os britânicos o integraram no Sudão.
Conseguir o controlo do Darfur do Norte também daria às RSF uma ligação incontestada aos seus aliados na Líbia. Ali, o líder militar do leste, o Marechal Khalifa Haftar, e os seus aliados mercenários do Grupo Wagner da Rússia forneceram às RSF mísseis terra-ar e outras armas logo após o início da guerra, em Abril de 2023.
Segundo os especialistas, o controlo do Darfur do Norte daria às RSF uma ponte para o Estado do Norte do Sudão, que continua sob o controlo das SAF, juntamente com os Estados do Rio Nilo e do Mar Vermelho.
Na sua tentativa de conquistar o Darfur do Norte, os combatentes das RSF enfrentam as SAF e os seus aliados em áreas para além de el-Fasher. Os combatentes das RSF tomaram o controlo da cidade de Mellit, cerca de 60 quilómetros a norte de el-Fasher, e queimaram várias aldeias Zaghawa na região. De acordo com o Projecto de Localização de Conflitos Armados e Dados de Eventos, os combates ocorreram perto de bastiões das RSF, como al-Zorg, onde se encontra um importante depósito de armas das RSF perto da fronteira com a Líbia, Wadi Arambaa e Umm Baar.
Desde que as RSF iniciaram o assalto a el-Fasher, centenas de habitantes morreram e milhares de outros ficaram feridos. Os hospitais locais estão sobrecarregados com a escassez de material médico.
“As pessoas chegam com lesões abdominais, feridas no peito, traumatismo craniano e fracturas expostas. Alguns têm ferimentos de bala, outros foram feridos por fragmentos de bombas e outros foram feridos por bombardeamentos,” Claire Nicolet, chefe dos programas de emergência da organização Médicos Sem Fronteiras, disse num comunicado em Maio. Na altura, o Hospital do Sul de el-Fasher tinha apenas um cirurgião.
À medida que as RSF consolidaram o seu controlo sobre o resto do Darfur, grupos humanitários como o Centro Raoul Wallenberg afirmam que há provas claras de um regresso às suas anteriores tácticas de genocídio em el-Geneina, a capital do Darfur Ocidental, e Nyala, a capital do Darfur do Sul.
Os observadores receiam que o mesmo, ou pior, possa acontecer no Darfur do Norte se as RSF tomarem el-Fasher.
“Receia-se agora que, se as RSF se apoderarem de el-Fasher, lancem represálias mortíferas contra civis que consideram estar alinhados com o exército e os grupos armados,” Ahmed Gouja, defensor dos direitos humanos do Darfur do Sul, escreveu recentemente para o The New Humanitarian. “As pessoas da comunidade Zaghawa estão especialmente em risco.”