EQUIPA DA ADF
Numa região da África Ocidental conhecida pela proliferação de organizações extremistas violentas, a Mauritânia destaca-se pela sua falta de ataques terroristas nos últimos anos.
Especialistas e observadores afirmam que muito pode ser aprendido a partir da abordagem que as autoridades da Mauritânia seguem com os líderes islamitas radicais: eles os incluem num diálogo contínuo.
“A República Islâmica da Mauritânia adoptou uma abordagem integrada e exaustiva para lidar com o terrorismo, que não estava limitada às dimensões militares e de desenvolvimento, mas também englobava a dimensão ideológica no centro da estrutura geral deste fenómeno,” o Presidente Mohamed Ould Ghazouani disse num discurso de abertura da Segunda Conferência Africana para a Promoção da Paz, organizada pela Mauritânia, em Fevereiro de 2022.
“O extremismo de ideias é, na maior parte dos casos, a raiz do extremismo e da violência nos actos.”
Centenas de líderes políticos e religiosos de 40 países africanos reuniram-se na capital, Nouakchott, para uma conferência de três dias, com o objectivo primário de assumir a responsabilidade pela prevenção do extremismo e do terrorismo.
Nestes últimos anos, a Mauritânia foi bem-sucedida com uma abordagem multidimensional que envolve os líderes tradicionais e religiosos, abordando a radicalização, o extremismo violento e a reintegração de militantes na sociedade.
Para um país que enfrentou uma onda de ataques de 2005 a 2011 e nenhum grande ataque desde então, o sucesso da Mauritânia pode servir como modelo para outros países africanos que se debatem com grupos terroristas.
Em 2010, a Mauritânia criou uma comissão para elaborar uma estratégia de combate ao terrorismo. Os seus líderes decidiram abordar as principais causas da radicalização religiosa, iniciando um diálogo ideológico com 70 detentos extremistas.
Os objectivos eram de compreender as suas razões para se juntarem aos grupos extremistas, reabilitá-los e reintegrá-los bem como saber como desencorajar os outros.
Como resultado destes debates, 47 detidos juraram que iriam desarmar-se e renunciar ao extremismo. Eles foram perdoados e beneficiaram de redução de sentenças, formação vocacional e acesso a subvenções para ajudá-los a reintegrarem-se económica e socialmente.
Pesquisas do Instituto de Estudos de Segurança (ISS) concluíram que as crenças religiosas não são a única razão pela qual os civis se juntam a grupos terroristas sahelianos.
O investigador sénior do ISS, Hassane Koné, e Ornella Moderan, directora do seu Programa do Sahel, disseram que muitos factores motivam o extremismo na Mauritânia: aumento da pobreza, diferenças sociais profundas, corrupção, autoritarismo, bases de grupos terroristas e campos de batalha no vizinho Mali.
Muitos juntam-se para se protegerem a si próprios e as suas famílias ou os seus meios de subsistência ou para retaliar contra abusos feitos pelas forças armadas nacionais, escreveram num artigo de Abril de 2022, na página da internet do ISS.
“Estes motivos, muitas vezes, reflectem frustrações sobre injustiças sociais, falta de oportunidades e fraco acesso a serviços básicos como água, educação e saúde. Estes problemas são agravados pelos graves défices nos serviços de segurança do governo e nos sistemas de justiça.”
As autoridades da Mauritânia realizaram campanhas de sensibilização e enviaram professores e imames para prisões para falarem com os combatentes detidos, persuadindo muitos a renunciarem à violência.
O Estado também recrutou centenas de estudantes de escolas corânicas para o sector público para impedir que estejam expostos a propagandas extremistas. O governo criou várias pequenas cidades com estradas e serviços utilitários, escolas e centros de saúde em zonas remotas que anteriormente estavam ocupadas por terroristas.
“O que se pretende é ocupar o território para dizer às populações nómadas que não sentiam que tinham lugar no Estado: ‘o vosso país cuida de vós, vos protege, preocupa-se convosco e educa os vossos filhos,’” jornalista da Mauritânia, Isselmou Ould Salihi, disse à Agência France-Presse.
Ainda existe muito trabalho a fazer, mas a Mauritânia continua comprometida em envolver os cidadãos e militantes. O seu longo período de paz relativa pode inspirar outros países da África Ocidental a adoptarem programas semelhantes.
O antigo poder colonial, a França, estava a opor-se ao diálogo com líderes de grupos militantes extremistas, mas as suas forças estão a retirar-se do Mali e a mudarem a sua presença para o sul.
O diálogo com algumas das muitas facções islamitas ajudou a levar ao cessar-fogo local no Níger, Burquina Faso, Mali e Nigéria.
Konè e Moderan recomendam uma colaboração regional organizada.
“Embora o diálogo com detidos tenha reduzido a crise emergente da Mauritânia, pode não ser o caso no centro do Sahel que é o lugar onde vários grupos se encontram e possui níveis muito mais elevados de violência,” escreveram. “Para que funcione naquele ponto, o diálogo precisará de estar a expandir-se para os líderes, os combatentes activos e os indivíduos associados aos grupos extremistas violentos — homens e mulheres.”