Os laços crescentes entre os rebeldes Houthis do Iémen e os grupos terroristas somalis ameaçam alimentar uma maior insegurança na Somália e perturbar ainda mais o transporte marítimo no Golfo de Áden e no Mar Vermelho.
Aries D. Russell, da Aries Intelligence, disse que há “provas credíveis” de que redes ligadas ao Irão e aos Houthis estão a usar portos somalis e rotas de contrabando para transportar armas para a África Oriental e há indícios de que também oferecem consultoria e formação.
“O que estamos a ver é mais uma influência e presença logística do que um envio directo de tropas Houthis para África,” Russell disse à ADF.
Russell caracterizou os Houthis, bem como os combatentes jihadistas do Iraque e da Síria, como empresas militares privados, ou EMP, do “mercado negro.” São entidades organizadas e operacionais que oferecem serviços de estilo militar, como formação, aconselhamento e apoio táctico, embora possam ter uma estrutura informal ou uma gestão pouco rígida.
“Embora estes grupos sejam ideológicos e interligados, em vez de empresas que maximizam os lucros no sentido ocidental, eles comportam-se como contratantes ou subcontratantes num ecossistema militante,” afirmou. “Eles diferem dos mercenários convencionais na sua orientação ideológica e transaccional; nem sempre lutam apenas por dinheiro.”
Os Houthis, apoiados pelo Irão, fornecem aos grupos terroristas drones armados, mísseis terra-ar e outros materiais que foram rastreados até aos arsenais iranianos. As armas são enviadas para o al-Shabaab, o grupo terrorista afiliado à al-Qaeda que controla áreas do centro e sul da Somália, e para o Estado Islâmico na Somália (ISSOM), que opera principalmente nas regiões montanhosas da Puntlândia.
“Tal como no Iémen, os Houthis estão a usar armas e, sobretudo, promessas de acesso a VANT [veículos aéreos não tripulados] e conhecimentos militares, como forma de obter apoio de grupos na Somália,” o analista Michael Horton escreveu para o Combatting Terrorism Center de West Point. “Os Houthis, em cooperação com o Irão, também estão a usar o fornecimento de armas como forma de garantir cadeias de abastecimento para os seus programas de drones e mísseis.”
Os analistas alertam que a expansão das rotas de abastecimento de munições e armamento iraniano e chinês pode aumentar o alcance de grupos terroristas que poderiam atacar alvos no Djibouti, na Etiópia e no Quénia. De acordo com Horton, o comércio de armas entre os Houthis e a Somália é bastante lucrativo.
“Por exemplo, uma caixa de AK-47 fabricadas na China ou no Irão pode ser vendida na Somália por cerca de cinco vezes o seu custo de aquisição no Iémen,” escreveu. “As margens para outras armas e materiais, como espingardas de precisão, RPG-7, morteiros portáteis e dispositivos de visão nocturna, são consideravelmente melhores. Os VANT comerciais e militares modificáveis têm preços ainda mais elevados.”
As forças de segurança somalis e internacionais têm tentado conter o fluxo de armas para o país, mas os grupos terroristas têm demonstrado capacidade para utilizar armas de alta tecnologia. Em Janeiro, o ISSOM realizou dois ataques com drones contra as forças de segurança da Puntlândia, a sua
desta tecnologia, de acordo com o Projecto de Localização de Conflitos Armados e Dados de Eventos.
O grupo terrorista al-Shabaab destacou mais drones e recuperou territórios significativos do governo somali no início de 2025. A sua rede de combatentes, partidários e contrabandistas em toda a Somália e norte do Quénia oferece aos Houthis maiores oportunidades de enviar armas para fora do Oceano Índico ou por terra para o Golfo de Áden.
O al-Shabaab também partilha com os Houthis a sua rede de inteligência costeira e anos de experiência em pirataria, reforçando a capacidade do grupo iemenita de ameaçar o tráfego marítimo regional. Um aumento nos ataques marítimos reforça as finanças de ambos os grupos. De acordo com o Centro de Estudos Estratégicos de África, os Houthis ganham cerca de 180 milhões de dólares por mês com as taxas pagas pelos agentes marítimos para garantir uma passagem segura pela região.
A crescente insegurança teve efeitos económicos directos nos países continentais costeiros e no comércio global. O The Africa Center informou que o desvio de navios comerciais ao redor do Cabo da Boa Esperança, na África do Sul, aumentou 420% e acrescentou até duas semanas e 6.000 milhas náuticas às suas viagens. O Egipto viu as suas receitas anuais de quase 10 bilhões de dólares provenientes do tráfego do Canal de Suez caírem mais de 70%, resultando numa perda mensal de 800 milhões de dólares.
No dia 7 de Julho, os Houthis atacaram um navio de carga com bandeira liberiana no Mar Vermelho com drones e granadas propulsadas por foguetes. O ataque matou pelo menos quatro marinheiros e deixou outros 15 desaparecidos. Os rebeldes divulgaram um vídeo que mostrava explosões no navio antes de ele afundar. Os Houthis reivindicaram a responsabilidade pelo afundamento de outro navio de carga no Mar Vermelho no dia anterior. Esses foram os primeiros ataques a navios no Mar Vermelho desde o final de 2024, possivelmente indicando uma nova campanha armada.
Os ataques dos Houthis no Mar Vermelho no ano passado coincidiram com o ressurgimento da pirataria somali. Conforme relatado pelo Hiiran Online da Somália, não está claro se o aumento da pirataria reflectiu oportunismo ou coordenação directa com os Houthis. No entanto, analistas afirmam que o al-Shabaab chegou a um acordo no ano passado para fornecer protecção aos piratas somalis em troca de 30% de todos os rendimentos de resgates e uma parte de qualquer saque.
Horton não espera que a relação entre os Houthis e os grupos nas zonas de conflito africanas termine tão cedo.
“As guerras e insurgências em curso no Sudão, Etiópia e Somália e a natureza febril da política no Corno de África proporcionarão aos Houthis amplas oportunidades para expandir o seu alcance,” escreveu.