Quando o Capitão Ibrahim Traoré tomou o poder no Burquina Faso em 2022, criticou a junta deposta por não ter conseguido derrotar a crescente onda de terrorismo e prometeu garantir a segurança do país em poucos meses.
Não tendo conseguido isso, o regime de Traoré tem tido muito mais sucesso em silenciar os críticos com sequestros, tortura e recrutamento forçado. A imprensa internacional foi expulsa do país, enquanto os jornalistas locais foram forçados a tomar muito cuidado.
“Hoje é difícil entrevistar pessoas na rua,” um jornalista local disse à Agence France-Presse. “Ninguém quer correr o risco de ser enviado para a frente de batalha por falar sobre assuntos triviais. As poucas pessoas dispostas a fazê-lo elogiam o governo.”
Comités de informantes civis rondam as ruas de Ouagadougou, capital do Burquina Faso, prontos para denunciar dissidentes, informou a AFP. Os jornalistas dizem que é extremamente raro alguém falar criticamente sem ter o anonimato garantido.
“Só se pode falar de desporto, cultura ou trivialidades,” um residente disse à AFP. “Assim que se começa a falar de política, todos ficam em silêncio.”
“Mesmo dentro das famílias, os irmãos tornaram-se cautelosos uns com os outros,” disse outro.
“No interior do país, são os terroristas que semeiam o terror,” disse um terceiro. “Nas grandes cidades, é o governo que aterroriza o povo.”
Nos últimos dois anos, houve inúmeros desaparecimentos forçados de jornalistas, activistas de direitos humanos, críticos da junta e oficiais militares — todos supostamente sequestrados por se oporem ao governo.
“A junta mostrou que vai esmagar qualquer oposição, seja da família, amigos, inimigos ou mesmo dos militares,” um analista de Ouagadougou, que pediu anonimato, disse à página de notícias The Africa Report. “Então, questiona-se por que pode raptar críticos, mas não realizar ataques precisos contra grupos terroristas.”
Militantes ligados à al-Qaeda e ao grupo Estado Islâmico mataram quase 16.000 burquinabês entre 2023 e 2024, de acordo com a organização de dados sobre conflitos ACLED. Grupos terroristas terão assumido o controlo de cerca de dois terços do território do país, enquanto a junta quebrou a sua promessa de uma transição de volta à democracia.
“Para Traoré, pode-se criticar o país, mas não o seu governo,” um analista de Bobo-Dioulasso disse ao The Africa Report. “Ele justifica a detenção de opositores rotulando-os de antipatriotas e uma ameaça à soberania nacional. É o manual da sua propaganda.”
Em Abril de 2023, oito anos após o início da luta contra o terrorismo generalizado, a junta liderada por Traoré declarou que os militares poderiam recrutar cidadãos com 18 anos ou mais. Grupos de direitos humanos e da sociedade civil acusaram que o recrutamento forçado fazia parte de um plano para silenciar sistematicamente a oposição interna. Semanas depois, um especialista em segurança cibernética percebeu que fotos e vídeos de críticos de Traoré desaparecidos estavam a circular online, com alguns aparecendo em uniformes militares.
“Mesmo homens dados como desaparecidos antes do decreto de recrutamento apareceram em fotos e vídeos nas redes sociais,” disse ao The Africa Report. “Ficou claro que a junta vinha a raptar e a recrutar pessoas antes da emissão do decreto.”
A Repórteres Sem Fronteiras, a Amnistia Internacional e a Human Rights Watch documentaram os raptos de dezenas de activistas, jornalistas e figuras da oposição pela junta. O The Africa Report verificou 21 casos, falando directamente com algumas vítimas, bem como com familiares, colegas e grupos da sociedade civil que ainda procuram a libertação de outras pessoas.
Em Abril, o Ministro da Segurança do Burquina Faso publicou uma lista de pessoas “procuradas por associação criminosa relacionada com uma organização terrorista” e exortou o público a fornecer informações sobre o seu paradeiro. A lista incluía jornalistas e activistas exilados, juntamente com líderes e combatentes terroristas.
“Quando não se concorda com [a junta], tem-se a escolha entre o exílio, a prisão ou a frente de batalha e, portanto, a morte,” o jornalista Newton Ahmed Barry disse ao site de notícias Jeune Afrique. “Por ter recusado o regime militar, sou visto como um inimigo do Burquina Faso, alguém que deve ser morto. Tive de fugir para salvar a minha vida. Mas estou longe de estar sozinho. Hoje, todos os jornalistas críticos têm de se exilar.”