Especialistas dizem que o recente anúncio de um governo sudanês paralelo liderado pelo Ceneral Mohamed Hamdan “Hemedti” Dagalo, chefe das Forças de Apoio Rápido paramilitares, provavelmente levará a mais violência, o que poderia resultar numa divisão semelhante à da Líbia, que levaria anos para ser resolvida.
Hemedti e as suas forças, conhecidas como RSF, anunciaram o governo paralelo com sede em Nyala, no Darfur do Sul, no final de Agosto. Até agora, o lançamento do chamado “Governo da Esperança” tem sido mais simbólico do que substancial. Muitos dos principais intervenientes vivem fora do país devastado pela guerra e partiram após o anúncio, de acordo com relatos.
Nenhum outro governo reconheceu o sistema liderado pelas RSF, que os opositores rejeitaram como um “governo fantasma.” Os especialistas descrevem-no como um desafio directo ao governo internacionalmente reconhecido liderado pelo General Abdel Fattah al-Burhan, das Forças Armadas do Sudão (SAF), que lutam contra as RSF desde 2023.
“Isso não deve ser subestimado, pois o que aconteceu há alguns dias é um ponto de viragem na história do Sudão,” o analista Elbashir Idris disse à emissora pública turca TRT.
Idris comparou a situação actual ao referendo de 2011 que dividiu o país em Sudão e Sudão do Sul. Outros alertam que o Sudão pode degenerar numa situação semelhante à da Líbia, onde dois governos passaram mais de uma década a competir pelo controlo do país.
Angola é mais um exemplo de um futuro potencial para um Sudão dividido. A guerra civil entre os governos paralelos daquele país durou 27 anos, terminando finalmente em 2002.
“Os governos paralelos, como se vê em todo o mundo, muitas vezes, minam os esforços de paz, exacerbam as crises e resultam num Estado frágil e enfraquecido,” o analista Gehad Ahmed escreveu para a Democracy in Africa. “Para o Sudão, esta medida corre o risco de prolongar a guerra em vez de terminá-la.”
Após mais de dois anos de combates, os lados em conflito parecem estar num impasse. Apesar dos esforços internacionais para resolver a crise, al-Burhan anunciou no início deste ano que não negociaria com Hemedti até que as RSF depusessem as armas.
O governo de al-Burhan recebe ajuda militar da Turquia, incluindo vários drones Bayraktar TB-2, que ajudaram as SAF a retomar a capital nacional, Cartum, e outros territórios na parte oriental do Sudão. Isso deixa as SAF no controlo dos Estados do norte e leste do Sudão e as RSF e os seus aliados a controlar grande parte dos Estados do sul e oeste do país. As RSF, que recebem ajuda dos Emirados Árabes Unidos, assumiram recentemente o controlo do triângulo fronteiriço noroeste com a Líbia e o Egipto, garantindo uma rota comercial crucial a partir do sul da Líbia.
O norte de Darfur e partes da região de Cordofão permanecem fora do controlo das RSF e são palco de intensos combates. El-Fasher, a capital do Darfur do Norte, está sitiada há um ano e agora está cercada por postos de controlo das RSF e um aterro de terra com 31 quilómetros de extensão, aprisionando os 260.000 residentes da cidade e isolando-os dos recursos externos. Aqueles que tentam fugir são baleados. Aqueles que permanecem estão a passar fome.
A sede das RSF em Nyala tem sido alvo de repetidos ataques das SAF. Os ataques com drones das SAF no início deste ano tiveram como alvo o aeroporto de Nyala e destruíram um avião de carga pertencente aos Emirados Árabes Unidos. Esse ataque também matou dezenas de combatentes das RSF.
Os ataques das SAF a Nyala podem tornar impraticável o funcionamento de um governo a partir daí, de acordo com Shewit Woldemichael, analista sénior do Sudão para o International Crisis Group.
O Ministro das Relações Exteriores do Sudão, Omar Mohamed Ahmed Siddig, disse à TRT que é improvável que o sistema paralelo das RSF conquiste o apoio popular ou o reconhecimento internacional devido às pesadas baixas civis que infligiu à população sob o seu controlo.
“Não creio que exista qualquer governo racional que possa dar qualquer tipo de reconhecimento a este chamado governo paralelo em Nyala,” afirmou Siddig.