As redes sociais tornaram-se uma ferramenta de comunicação fundamental para os grupos terroristas em toda a África, colocando os governos perante um desafio: como restringir a propaganda terrorista e, ao mesmo tempo, proteger a liberdade de expressão.
A rápida disseminação da internet em África tornou-se uma miscelânea de regulamentações nacionais, regionais e continentais que causam confusão, sobretudo quando os governos pedem às empresas das redes sociais que fechem canais ligados a organizações terroristas, como o al-Shabaab na Somália ou o Boko Haram na Nigéria.
“Um desafio fundamental é que a falta de clareza sobre o que constitui ‘conteúdo terrorista online’ e que medidas devem ser tomadas pelas partes interessadas que podem resultar na classificação inadequada de conteúdos online,” a investigadora Brenda Mwale escreveu recentemente no Journal of Policing, Intelligence and Counter Terrorism.
Além disso, as empresas das redes sociais carecem de moderadores que compreendam suficientemente bem as línguas africanas para saber quando um comentário pode ser considerado conteúdo terrorista. Grupos terroristas como o al-Shabaab aproveitam essas lacunas para expandir a sua audiência.
O al-Shabaab é o criador mais prolífico de conteúdo terrorista online em África. O grupo é responsável por cerca de 25% de todo o conteúdo terrorista actualmente disponível na internet, de acordo com a Tech Against Terrorism, uma organização independente online lançada pelas Nações Unidas em 2016.
Para complicar ainda mais as coisas, o conteúdo que pode ser considerado terrorista num país pode ser permitido por outro, criando um emaranhado regulatório para as empresas das redes sociais que tentam fazer cumprir as normas da comunidade. Sem uma definição firme de conteúdo terrorista online, conteúdos não terroristas podem ser punidos e expressões legítimas criminalizadas, de acordo com Mwale.
O resultado, de acordo com o director-executivo da Tech Against Terrorism, Adam Hadley, tem sido uma explosão de conteúdos relacionados ao terrorismo na internet, com poucas tentativas de removê-los.
“Encontramos regularmente material não editado produzido por organizações terroristas partilhado nas principais plataformas, onde, historicamente, esse conteúdo era pelo menos ofuscado para evitar mecanismos de detecção,” Hadley disse num discurso no Fórum de Governança da Internet em 2024. “Redes de actores alinhados com extremistas operam abertamente nas principais plataformas das redes sociais, muitas vezes, com intervenção mínima.”
A solução, de acordo com Mwale e outros investigadores, é criar uma definição padrão de conteúdo terrorista online que possa resolver a confusão e facilitar o funcionamento das redes sociais além-fronteiras.
Na sua análise, Mwale recomendou definir conteúdo terrorista online como qualquer material que:
- Retrata actos terroristas e como realizá-los.
- Partilha as ideologias de um grupo terrorista.
- Incita, apoia ou solicita uma pessoa a cometer um acto terrorista.
A definição de Mwale incluiria isenções para jornalistas, educadores, artistas e investigadores.
Como exemplo da dificuldade de regulamentar o conteúdo terrorista online, considerem-se os três países mais conectados de África — Quénia, Nigéria e África do Sul. Todos os três têm leis que criminalizam actividades terroristas, incluindo a posse ou distribuição de materiais destinados a incitar a violência. No entanto, nenhuma das leis especifica como é o conteúdo terrorista online, observa Mwale. Essa falta de especificidade faz com que as empresas de internet sejam relutantes em agir, enquanto dá aos governos ampla liberdade para determinar por si próprios o que constitui conteúdo terrorista online — uma situação que convida à violação dos direitos humanos, segundo especialistas.
Enquanto os governos lutam para definir o conteúdo terrorista online, os grupos terroristas estão a usar a inteligência artificial generativa para criar mais conteúdo. Na Nigéria, o Boko Haram e a Província do Estado Islâmico na África Ocidental implantam a IA para editar vídeos, produzir notícias falsas, fazer-se passar por funcionários do governo e escapar dos moderadores de conteúdo, de acordo com Mwale.
Muitos governos estão mal equipados para combater o conteúdo terrorista criado pela IA, Mwale escreveu recentemente para a Rede Global sobre Extremismo e Tecnologia. No entanto, a mesma tecnologia de IA que os grupos terroristas estão a utilizar pode ser usada contra eles para detectar e encerrar conteúdo extremista. Hadley estima que o seu grupo encontra apenas 1% do conteúdo terrorista disponível online. O uso da IA pode melhorar tanto a capacidade quanto a precisão na detecção de conteúdo terrorista online, explicou.
Em última análise, controlar o conteúdo terrorista online exigirá que os países africanos produzam uma definição comum de conteúdo proibido, ao mesmo tempo em que protegem a liberdade de expressão. Grupos económicos regionais podem fornecer a base para uma frente unida contra os terroristas, assim como a União Africana, observam os analistas.
“A luta contra o terrorismo online é uma luta que nenhuma organização pode vencer sozinha,” recomendou Hadley. “A questão que se coloca não é se podemos impedir completamente os terroristas de usar a internet, mas sim o que podemos alcançar juntos.”