Nas regiões setentrionais da Costa do Marfim, do Gana e do Togo, reina uma paz relativa, quando comparada com a terrível situação no vizinho Burquina Faso, onde grupos terroristas tomaram o controlo de grande parte do país.
Ao contrário dos seus vizinhos, o Gana ainda não sofreu qualquer ataque terrorista. No entanto, a sul da fronteira com o Burquina Faso, os prósperos mercados de comércio ilícito ajudam a apoiar financeiramente os grupos insurgentes e proporcionam oportunidades de recrutamento de combatentes.
Afiliada à al-Qaeda, a Jama’at Nusrat al-Islam wal-Muslimin (JNIM) é o grupo terrorista mais activo na zona e lança uma vasta rede de recrutamento de homens e rapazes para combater no Burquina Faso.
“Alguns lutam pela jihad, outros fazem-no por negócios,” disse um dos três homens ganeses com quem a BBC falou recentemente, sob condição de anonimato.
O negócio a que os três homens se dedicam é o contrabando de gado do Burquina Faso e o comércio em mercados de gado no norte do Gana. É uma das muitas fontes de financiamento do terrorismo no Sahel.
Durante um exercício de mapeamento das economias ilícitas na África Ocidental, a Iniciativa Global contra o Crime Organizado Transnacional identificou o roubo de gado como um “mercado acelerador” ligado à instabilidade e influenciado por ela.
“O roubo de gado é um fenómeno crescente que anda de mãos dadas com a expansão de grupos extremistas violentos, em particular a JNIM, afiliada à al-Qaeda,” declarou a iniciativa em 2024.
As três fontes da BBC disseram ter atravessado a porosa fronteira de 550 quilómetros entre os dois países e lutado no Burquina Faso várias vezes desde 2018. Um deles foi motivado pela ideologia extremista, outro pela necessidade de defender as comunidades familiares.
“O meu irmão mais velho, a sua mulher e os seus filhos foram todos mortos pelo exército [burquinabê],” disse um dos homens. “Isso magoa-me muito. Os militares chegaram à sua comunidade na floresta. Mataram-nos a todos, uma família inteira, que incluía 29 pessoas.”
Em 2022, os grupos terroristas do Sahel recrutaram entre 200 e 300 ganeses, de acordo com a investigação da organização não-governamental francesa Promediation, especializada na mitigação e prevenção de conflitos.
Um relatório de Julho de 2024 do grupo de reflexão holandês sobre relações internacionais Clingendael indicou que a JNIM tentou utilizar as divisões sociais, a estigmatização e a discriminação para recrutar e incitar os ganeses Fulani, um grupo étnico seminómada da África Ocidental profundamente ligado à criação de gado.
“Para a JNIM, o Gana funciona actualmente como uma linha de abastecimento onde os militantes obtêm alimentos, bens não perecíveis (por exemplo, dinamite, combustível, gado, motociclos), recrutas e encontram um local para descansar e se esconderem,” afirma o relatório. “Assim, a ausência de ataques reais em solo ganês parece resultar do cálculo da JNIM de não perturbar as linhas de abastecimento e os locais de descanso, bem como de não provocar um exército relativamente forte.”
O grupo Clingendael disse que a JNIM teve um “sucesso mínimo” no recrutamento no Gana. Mas as fontes da BBC discordaram, dizendo que pessoas de “todas as partes do Gana” e de muitos grupos étnicos estavam a juntar-se à luta no Burquina Faso. Uma delas descreveu a forma como os ataques no Burquina Faso ajudam a abastecer os mercados de gado no norte do Gana, dizendo: “Quando atacamos uma comunidade, levamos os seus animais: por vezes 50, por vezes 100.”
Os homens disseram que é possível que a insurgência continue a expandir-se para os Estados costeiros da Costa do Marfim, do Gana e do Togo.
“Esta coisa pode ir para qualquer sítio, ou para qualquer país,” disse um deles. “Não existia no Togo, mas agora os ataques estão a acontecer lá. Se eles podem ir para o Togo, podem ir para o país mais pacífico, o Gana. Esta coisa é perigosa e é poderosa.”