De acordo com um relatório recente, as empresas chinesas estão envolvidas num terço dos 231 portos comerciais de África, uma presença e influência significativamente maiores do que em qualquer outra parte do mundo, incluindo a Ásia.
O envolvimento da China suscita preocupações quanto ao montante da dívida contraída pelas nações africanas, à sua falta de soberania sobre os seus activos nacionais e ao receio de que possam ser arrastadas para grandes rivalidades geoestratégicas.
Em “Mapping China’s Strategic Port Development in Africa,” o investigador associado do Centro de Estudos Estratégicos de África, Paul Nantulya, escreve que várias empresas estatais actuam como “construtoras, financiadoras ou operadoras” em 78 portos de 32 países africanos. Quase metade desses empreendimentos portuários situa-se na África Ocidental.
Em alguns casos, estas empresas chinesas “dominam todo o empreendimento de desenvolvimento portuário, desde o financiamento à construção, operações e propriedade de acções,” Nantulya escreve no relatório de 10 de Março. Por vezes, um conglomerado chinês actua como empreiteiro principal e depois atribui subcontratos às suas subsidiárias.
Um dos portos mais movimentados da África Ocidental mostra como o envolvimento estrangeiro pode afectar uma nação anfitriã. A China Harbor Engineering Co. projectou e construiu o porto de águas profundas de Lekki, na Nigéria, com financiamento do Banco de Desenvolvimento da China. Depois, adquiriu uma participação financeira de 54% no porto e explora-o através de um contrato de arrendamento de 16 anos, escreveu Nantulya. Este facto suscita preocupações em matéria de segurança e soberania.
“Uma empresa que detém um contrato de arrendamento ou concessão operacional colhe não só os benefícios financeiros de todo o comércio que passa por esse porto, mas também pode controlar o acesso,” escreveu Nantulya. “O operador determina a atribuição de cais, aceita ou recusa escalas e pode oferecer tarifas e serviços preferenciais para os navios e a carga do seu país.”
Outra preocupação é o facto de a China utilizar o seu envolvimento portuário como um trampolim para o estabelecimento de uma base naval. A perspectiva não é isenta de precedentes em África. A China estabeleceu a sua primeira base militar estrangeira conhecida em Doraleh, no Djibouti, em 2017, depois de uma empresa chinesa ter construído o porto no local. Fica perto de outras bases militares que pertencem a França, Alemanha, Itália, Japão, Arábia Saudita, Espanha, Reino Unido e Estados Unidos.
A base de Djibouti posiciona a China no meio de uma das mais importantes rotas marítimas do mundo, entre dois pontos estratégicos de estrangulamento do Mar Vermelho: o Canal de Suez e o estreito de Bab el-Mandeb. Mais de um quarto do transporte marítimo mundial passa por este corredor vital.
“Pequim conseguiu apresentar a sua presença militar unilateral como parte do esforço internacional para combater a pirataria e proteger o comércio global que passa pelo Canal de Suez,” Michaël Tanchum, investigador principal do Conselho Europeu de Relações Externas, escreveu em Dezembro de 2021. “No entanto, o estabelecimento pela China de sua base em Djibouti, com uma doca supostamente capaz de acomodar porta-aviões e submarinos nucleares, também está de acordo com a sua jornada para consolidar uma presença de segurança em todo o continente.”
As preocupações com as bases militares chinesas em África têm persistido em rumores, suspeitas e relatos dos meios de comunicação social africanos que remontam, pelo menos, há Janeiro de 2015, quando o jornal The Namibian noticiou a negação pela China e pela Namíbia de planos para uma base naval chinesa em Walvis Bay. Não foi construída qualquer base deste tipo na Namíbia.
A Guiné Equatorial é outra nação da África Ocidental que, segundo os rumores, a China está a considerar para a construção de uma base militar. Nantulya considera a Guiné Equatorial uma das opções “menos adequadas” disponíveis. No entanto, aponta seis portos continentais, para além de Doraleh, que se prestam a uma utilização militar devido às suas características de concepção. Tais são Luanda, Angola; Mombaça, Quénia; Walvis Bay, Namíbia; Lekki, Nigéria; Victoria, Seychelles; e Dar-es-Salam, Tanzânia.
Uma presença naval chinesa ao longo das costas africanas pode ter ramificações catastróficas para qualquer nação que pretenda proteger os seus direitos de pesca nacionais. A frota de pesca em águas profundas da China já pilha as unidades populacionais de peixe ao longo da costa da África Ocidental.
À medida que as empresas chinesas investem nos portos africanos, as nações continentais tornaram-se dependentes das infra-estruturas de exportação para conduzir o seu comércio externo, escreveu Nantulya. Isso pode torná-las menos susceptíveis de se oporem à política chinesa.
“Olhando para o futuro, é de esperar que a China procure aumentar o seu papel na construção de portos africanos para expandir a sua propriedade e controlo operacional para fins comerciais, económicos e militares chineses.”