O Irão e a Rússia estão a tentar aproveitar-se do caos no Sudão, procurando novos locais para estabelecer bases militares.
Ambos os países são apoiantes de longa data do regime sírio liderado por Bashar al-Assad, que os rebeldes derrubaram em Dezembro. O Irão e a Rússia tinham bases militares na Síria que utilizavam para projectar influência regional. Os países começaram a negociar com o Sudão no ano passado, quando os rebeldes começaram a inverter a maré da guerra na Síria.
O Irão e a Rússia apoiam as Forças Armadas do Sudão (SAF), que lutam pelo controlo do país contra as Forças de Apoio Rápido (RSF) paramilitares desde Abril de 2023. As negociações de cessar-fogo fracassaram no meio de uma crise humanitária em espiral.
No entanto, a grande interferência estrangeira está a prolongar a guerra, segundo Emadeddin Badi, investigador não residente dos Programas para o Médio Oriente no Atlantic Council.
“Embora os actores estrangeiros contribuam para o sofrimento do Sudão, um esforço internacional para pôr fim à guerra — e levar a ajuda necessária ao povo do Sudão — tem faltado,” escreveu Badi. “Desvendar a teia de interesses externos é essencial para cultivar uma resposta internacional adequada a esta crise.”
A Rússia, que tem grandes interesses na extracção de ouro e no contrabando no Sudão, há anos que faz pressão para que seja instalada uma base militar em Port Sudan, que é controlado pelas SAF. Durante o regime de Assad, a Rússia operou a base aérea síria de Khmeimim, que foi crucial para facilitar a transferência de forças e armas pesadas para África. Agora, Moscovo tem de reestruturar as suas vias de apoio.
O Sudão aceitou a ideia e negou relatos de que teria rejeitado a proposta de Moscovo. Em troca de uma base militar, a Rússia terá oferecido ao Sudão equipamento militar avançado, incluindo o sistema de defesa antimíssil S-400.
“Não é uma vergonha dar uma base militar a qualquer país do Mar Vermelho com o qual tenhamos parcerias económicas,” Yasir El Atta, vice-comandante-chefe das SAF, disse ao jornal saudita Al Hadath News, no ano passado.
O Irão procurou estabelecer um porta-helicópteros na costa do Sudão. O Sudão ainda não concordou com isso, mas os analistas do Instituto Robert Lansing de Estudos sobre Ameaças Globais e Democracias acreditam que as SAF podem abrandar essa posição à medida que a guerra brutal continua.
O Irão e o Sudão têm uma longa história de relações bilaterais, nem sempre positivas. Em 2016, Cartum cortou as relações formais com Teerão. Desde então, os dois países participaram em reuniões multilaterais sobre questões como a cooperação no domínio da agricultura, mas as relações nunca recuperaram totalmente.
No entanto, os observadores alertam para o facto de que abraçar o Irão poderá deixar o Sudão ainda mais isolado quando a guerra terminar. “Quando o actual conflito terminar, o Sudão precisará de ajuda, e não de obstáculos, para a sua reconstrução, e terá de procurar assistência para além do Irão,” Andrew McGregor escreveu para a revista Terrorism Monitor. “Todos estes factores são contrários ao estabelecimento de uma instalação naval iraniana no Sudão ou a uma aliança formal.”
A Rússia e o Irão estão também a fornecer armas e equipamento militar às SAF. Os drones iranianos Mohajer-6 têm sido amplamente utilizados pelas SAF para retomar partes de Omdurman, muitas vezes, causando vítimas civis.
Esta “assistência às SAF também se enquadra numa dinâmica anterior à guerra e, mais uma vez, está relacionada com a batalha do Irão pela influência com a Arábia Saudita,” Eric Lob, da Universidade Internacional da Florida, escreveu no The Conversation.
O armamento das SAF também beneficia os objectivos geopolíticos mais amplos do Irão, no contexto de uma maior concorrência com Israel e os Emirados Árabes Unidos.
“Ao mesmo tempo, pode revelar-se uma fonte de rendimento lucrativa para a economia iraniana, bem como uma montra para a tecnologia do país,” escreveu Lob.
De acordo com a Amnistia Internacional, a Rússia exportou variantes de armas ligeiras, como as espingardas de atirador designado Tigr ou as espingardas Saiga-MK, que são normalmente comercializadas a proprietários de armas civis, para traficantes de armas com fortes ligações às SAF. A Rússia também vendeu ao exército milhões de barris de combustível.