EQUIPA DA ADF
Os críticos estão a acusar uma empresa chinesa de extracção de ouro de ameaçar uma floresta protegida na República Democrática do Congo com poluição tóxica.
A Kimia Mining opera na Reserva de Vida Selvagem de Okapi. Património da Humanidade, alberga o okapi, em vias de extinção, que se assemelha a uma pequena girafa com pescoço curto; 17 espécies de primatas e 376 espécies de aves.
A reserva estende-se por mais de 13.000 quilómetros quadrados na província de Ituri, no nordeste do país, perto das fronteiras do Sudão do Sul e do Uganda. Faz parte da Bacia do Congo, um sumidouro de carbono que ajuda a atenuar as mudanças climáticas. É também o lar de tribos indígenas das florestas Mbuti e Efe que dependem dos recursos da floresta tropical.
Esses recursos diminuíram nos últimos oito anos, à medida que a Kimia Mining foi expandindo as suas operações ao abrigo de acordos opacos. Os habitantes locais e os defensores da conservação acusam a empresa de estar a destruir o ambiente.
“É alarmante que uma operação mineira semi-industrial esteja a ter rédea solta no que é suposto ser um local protegido do Património Mundial, que já estava na lista de perigo,” Joe Eisen, director-executivo da Rainforest Foundation UK, disse à The Associated Press.
Funcionários e especialistas em mineração dizem que a Kimia usa mercúrio para separar o ouro do minério. As Nações Unidas consideram que o mercúrio é um problema grave de saúde pública, dado que pode ter efeitos tóxicos nos sistemas nervoso e imunitário.
Uma mulher de 27 anos, que trabalhou como cozinheira para a Kimia durante seis meses e vive perto da mina, disse que o solo se tornou infértil. “(Está) envenenado por produtos químicos usados pelos chineses,” disse à AP.
Em 1997, as autoridades incluíram a reserva na lista de Patrimónios Mundiais em Perigo devido à
destruição causada pela exploração mineira artesanal, aos conflitos em torno das infra-estruturas e à caça furtiva de elefantes. Grupos armados operam na reserva, mas as divergências sobre os seus limites complicam a aplicação da lei.
John Lukas, presidente do Projecto de Conservação do Okapi, disse ao Mongabay, um site de notícias sobre conservação e ciência ambiental, que acredita que estas questões devem ser resolvidas a nível ministerial. O Ministério das Minas da RDC disse à AP que está a trabalhar para actualizar os limites e proteger o parque.
A Kimia concede um acesso limitado aos habitantes locais para minerar algumas áreas, mas mediante o pagamento de uma taxa que residentes como Muvunga Kakule, de 44 anos, não conseguem pagar. Kakule costumava praticar a mineração artesanal na reserva, ao mesmo tempo que vendia comida da sua quinta a outros mineiros. Disse que perdeu 95% dos seus rendimentos, porque já não pode extrair e os chineses não compram os seus produtos.
“A nossa vida não é a mesma desde que os chineses chegaram e nos expulsaram do mato,” Kalule disse à AP. “Já não podemos trabalhar nem mandar os nossos filhos para a escola.”
À medida que as operações mineiras aumentam, a desflorestação na reserva está a acelerar, particularmente ao longo do Rio Ituri, de acordo com dados da plataforma Global Forest Watch. As imagens de satélite revelam vastas manchas de terra castanha-avermelhada, estradas e buracos onde outrora existiam árvores.
A reserva perdeu 480 hectares de floresta primária — 4,8 quilómetros quadrados — entre Janeiro e Maio de 2024, de acordo com a Wildlife Conservation Society e agências governamentais. Perdeu cerca de 1.890 hectares de cobertura florestal em 2023, 1.350 hectares em 2022, 980 hectares em 2021 e 844 hectares em 2020, informou a Global Forest Watch.
A Kimia opera na exploração mineira de Muchacha, na parte sudoeste da reserva, ao longo do Rio Ituri. Um relatório de 2021 da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura alertou para o facto de o local estar a “transformar-se num colonato permanente.”
“A mina de [Muchacha] cresceu e agora tem estradas, edifícios, igrejas, escolas e bares,” Lukas disse ao site Mongabay. “É uma cidade e tem lá muita gente. Assim, as árvores foram todas cortadas e, claro, o rio foi bastante poluído devido aos produtos químicos utilizados durante o processo de extracção. É uma verdadeira confusão.”
Em 2022, 205 organizações da sociedade civil congolesa instaram o governo a rescindir as licenças da Kimia Mining e a pôr termo à desflorestação em curso e à poluição por mercúrio.
Adams Cassinga, fundador da organização sem fins lucrativos Conserv Congo, disse ao Mongabay que a intenção era chamar a atenção internacional e pressionar o governo congolês. No entanto, os registos do governo mostram que a Kimia Mining renovou as suas licenças até 2048, informou a AP.
Aime Vusike Kiruzi, director-geral da Epulu Radio, que opera a partir do interior da reserva, disse que quer que as autoridades congolesas protejam o parque para que as gerações futuras possam ver a sua vida selvagem.
“Já não estamos a ver algumas espécies que costumavam estar bem protegidas aqui,” Kiruzi disse à AP. “No nosso tempo, vimos espécies protegidas como o okapi, os elefantes e os antílopes. Até víamos macacos. Mas já não é fácil vê-los.”