EQUIPA DA ADF
Milicianos agitaram as suas armas no ar e cantaram triunfantes sobre os corpos sem vida de cinco jovens, todos irmãos, no campo de deslocados de Kassab, no oeste do Sudão.
Descritos por um agricultor local como trabalhadores, os irmãos Suleiman incluíam um aluno de 14 anos, dois alfaiates e um pastor de gado. Eram membros do grupo étnico Zaghawa, não estavam envolvidos na guerra civil em curso no país e estavam a viver com a mãe quando o ataque ocorreu.
“Vi um jovem, com cerca de 16 anos, forçar a porta da casa deles e entrar, com vários soldados atrás dele, chamando-lhes ‘escravos núbios,’” disse uma testemunha que falou sob anonimato numa reportagem co-publicada por LeMonde, Lighthouse Reports, Sky News e The Washington Post.
Outra testemunha disse ter visto a mãe dos Suleimans a suplicar aos milicianos que não matassem os seus filhos.
“Momentos depois, ouvi-os dizer: ‘Matem-na,’” disse a testemunha.
Os Suleimans contam-se entre as 73 pessoas mortas no massacre de Junho de 2023 em Kassab e na vizinha Kutum. Os sobreviventes afirmam que a agressão teve motivações étnicas.
As imagens de vídeo obtidas no âmbito da investigação conjunta parecem confirmar essas afirmações. Um vídeo mostrava um combatente com um turbante branco de pé sobre dois cadáveres.“Tire fotografias!,” o miliciano disse numa reportagem do Washington Post. “Esta é uma vitória para os árabes! Esta é uma vitória para os árabes!”Cerca de 70% dos sudaneses identificam-se como árabes, enquanto os restantes pertencem principalmente a grupos como Beja, Fallata, Fur, Nubian e Zaghawa. As Forças de Apoio Rápido (RSF) disputam o controlo do país com as Forças Armadas do Sudão (SAF) desde Abril de 2023. Ambos os lados são acusados de cometerem atrocidades contra civis.
Outras imagens da investigação conjunta mostram os membros da milícia a troçar das vítimas moribundas.Testemunhas e vídeos de propaganda das RSF revelaram que comandantes superiores das RSF se encontravam em Kutum, a cerca de 120 quilómetros de al-Fasher, no Estado do Darfur do Norte, durante o massacre.
Pouco antes do ataque ao campo de Kassab, as tensões locais aumentaram depois de um oficial árabe das RSF ter sido morto, de uma base das RSF ter sido saqueada e de alguns estabelecimentos comerciais árabes terem sido atacados, segundo o The Washington Post. O massacre teve lugar cinco dias mais tarde.
Uma mulher chamada Huwaida limpou as lágrimas do rosto ao recordar o ataque do ano passado em Kutum, que matou pelo menos 73 pessoas. “A minha filha de 13 anos continua desaparecida desde o dia em que fugimos,” Huwaida disse num vídeo da Sky News. “Não tenho mãe, nem irmão. Não consigo encontrar ninguém.”
Um outro sobrevivente disse que as RSF saquearam casas e torturaram homens.
“Nunca entraram em casas árabes no bairro,” disse o homem. “Eles só vão às casas dos negros, arrombam e saqueiam.”
Uma outra testemunha disse que o seu vizinho foi atacado pelas RSF quando ia buscar água a um poço.
“Acordámos com o som de balas, muitas balas,” disse. “De repente, os árabes entraram na cidade e começaram a matar pessoas nas ruas. Entraram nas casas, mataram e violaram pessoas.”
Um activista local disse ao The Washington Post que as pessoas deslocadas em Kassab tentaram fugir, mas o tiroteio de centenas de combatentes das RSF e milicianos fardados em motas e camiões era demasiado intenso.
A violência evocou memórias do genocídio de Darfur de 2003, quando grupos rebeldes atacaram os grupos étnicos Fur, Masalit e Zaghawa. Os combates que se seguiram mataram cerca de 200.000 pessoas entre 2003 e 2005.
Sobreviventes do massacre de Junho de 2023 disseram que alguns membros das SAF fugiram da zona antes do assalto.
“Desta vez, estes tipos conquistam o exército e depois vêm atrás dos civis,” disse um homem chamado Yousif no vídeo da Sky News. “Se tiveres um carro, eles levam-no. Levam tudo o que tiveres em casa. Se tiveres irmãs bonitas, eles violam-nas.”