Os burros são animais de carga essenciais em muitas comunidades rurais africanas. São trabalhadores silenciosos que transportam água potável e lenha, levam as crianças à escola, as mães às unidades sanitárias e as mercadorias ao mercado.
No entanto, os burros estão a desaparecer e a sua cotação está a subir devido à procura pelas suas peles por parte de chineses. Wiebke Plasse, do grupo alemão de bem-estar animal Welttierschutzgesellschaft, visitou recentemente um mercado na cidade de Bisil, no sudoeste do Quénia, a cerca de 60 quilómetros da fronteira com a Tanzânia. Plasse viu várias centenas de burros no mercado, e um comerciante disse que outros estavam a chegar.
“Quando se pergunta, descobre-se: Todos estes burros estão reservados para um único comprador, que nem sequer está aqui,” Plasse disse ao The Revelator, uma plataforma online de notícias e ideias ambientais gerida pelo Centro para a Diversidade Biológica.
Muitos dos burros de Bisil seriam abatidos ilegalmente. As suas peles seriam removidas, secas e embaladas em contentores de transporte com destino à província chinesa de Shandong. Lá, as peles seriam fervidas para produzir uma gelatina conhecida como ejiao, usada na medicina tradicional chinesa.
Embora não haja evidências da sua eficácia, o ejiao tem sido historicamente usado para prevenir abortos espontâneos, tratar problemas circulatórios e reverter o envelhecimento precoce. O marketing moderno alimenta a procura por ejiao. Ele tornou-se um produto de estilo de vida que é moído em pó, comprimidos ou líquido, ou adicionado à comida, informou o The Revelator.
A China já teve cerca de 11 milhões de burros, a maior população do mundo, de acordo com o Animal Welfare Institute. A procura por ejiao reduziu a população de burros da China para apenas 3 milhões, levando a indústria de ejiao a mirar a África, onde vivem cerca de dois terços dos 53 milhões de burros do mundo. Agora, as populações continentais de burros caíram drasticamente, e 41% dos proprietários de burros africanos pesquisados pelo The Donkey Sanctuary disseram que tiveram animais roubados.
Nos arredores de Nairobi, no Quénia, um vendedor de água chamado Steve dependia de burros para puxar a sua carroça com bidões até aos seus clientes. Certa manhã, Steve foi ao campo buscar os seus animais.
“Não os pude ver,” disse à BBC. “Procurei durante todo o dia, toda a noite e no dia seguinte.”
Dias depois, um amigo disse a Steve que tinha encontrado os esqueletos dos burros.
“Eles tinham sido mortos, abatidos, a pele deles não estava lá,” disse Steve, que estava a poupar dinheiro para estudar medicina. Mas sem os seus burros, ele não pode entregar água.
Os preços em alta significam que muitas famílias não têm condições financeiras para substituir um burro roubado. Quando os rendimentos caem devido ao roubo de burros, as meninas, muitas vezes, são forçadas a abandonar a escola e as mulheres sofrem física e emocionalmente ao terem de realizar trabalhos pesados.
“Quando uma família perde o seu sustento… as mulheres ficam sozinhas para carregar fardos pesados,” Anne Odari Onditi, proprietária de burros e tesoureira da Associação de Proprietários de Burros do Quénia, disse ao The Donkey Sanctuary. “É doloroso ver a rapidez com que os nossos burros estão a desaparecer e o quanto essa perda é sentida.”
Em resposta aos roubos, Botswana, Burquina Faso, Etiópia, Gâmbia, Gana, Quénia, Mali, Níger, Senegal, Tanzânia e Uganda proibiram ou restringiram severamente o abate comercial de burros e a exportação das suas peles.
Em Junho, mais de 200 líderes africanos reuniram-se na Cimeira Pan-Africana sobre Burros, com duração de dois dias, na Costa do Marfim, onde se comprometeram a apoiar a Estratégia Pan-Africana para os Burros, desenvolvida pelo Gabinete Interafricano para os Recursos Animais da União Africana. A estratégia apela à aplicação da proibição da UA de 2024 ao comércio de peles de burro, à integração do bem-estar dos burros nas políticas nacionais e a investimentos em cadeias de valor, serviços veterinários e sistemas de dados.
”Transformámos a moratória num trampolim para a acção,” Moses Vilakati, comissário da UA para a Agricultura, Desenvolvimento Rural, Economia Azul e Ambiente Sustentável, disse num relatório da agência noticiosa Capital FM do Quénia. “Agora, é hora de implementar — através da lei, da sensibilização da comunidade e da vigilância.”
