Há uma nova frente na guerra contra o terrorismo na região do Lago Chade: a plataforma de vídeos online TikTok.
Há muito tempo que os grupos terroristas utilizam as redes sociais em todo o mundo como arma para recrutamento, financiamento e comunicação. Na Bacia do Lago Chade, onde uma violenta insurgência extremista assola desde 2009, o Boko Haram e a Província do Estado Islâmico na África Ocidental (ISWAP) passaram a usar o TikTok, a plataforma de vídeo desenvolvida na China, conhecida tanto pelas suas vulnerabilidades de segurança quanto pela sua popularidade entre os jovens.
Após meses de ganhos pelas forças de segurança nigerianas, Abril viu ambos os grupos ressurgirem com ataques mortais em todo o Estado de Borno. Pelo menos 100 pessoas foram mortas, e o governador do Estado reclamou ter sido invadido.
Nesse mesmo mês, a Agence France-Presse analisou vídeos facilmente acessíveis no TikTok nos quais “aparentes jihadistas e seus apoiantes exibiam espingardas, granadas e pilhas de dinheiro.”
O analista de segurança Bulama Bukarti, investigador sénior do Tony Blair Institute for Global Change, alertou que a ISWAP e o Boko Haram estão a ganhar popularidade no TikTok.
“Neste momento, quando se entra no TikTok, vêem-se contas de membros do Boko Haram,” disse numa entrevista à Channels Television, no dia 20 de Abril. “Eles apresentam programas e shows ao vivo onde propagam a ideologia do Boko Haram. Eles justificam a violência do grupo, o que fazem na língua Hausa. Eles respondem a perguntas do público e comentários escritos.

“Ainda esta semana, um membro do Boko Haram publicou um vídeo de 10 minutos no TikTok a atacar-me por me ter pronunciado contra o aumento da violência do grupo.”
Bukarti afirmou que o grupo está a “criar um sentimento perturbador de comunidade virtual.”
“Alguns dos seus vídeos pré-gravados têm centenas de milhares de visualizações,” escreveu numa publicação de 17 de Abril na plataforma de redes sociais X. “A este ritmo, é apenas uma questão de tempo até que comecem a transmitir ataques ao vivo.”
Os grupos armados adoptaram o TikTok depois de as forças de segurança terem reprimido o aplicativo de mensagens encriptadas Telegram, de acordo com o antigo terrorista Saddiku Muhammad.
“Os jihadistas perceberam que, para capturar as mentes dos jovens, precisam de falar com eles na linguagem que eles entendem, em vez dos estilos didácticos e demagógicos tradicionais, que são enfadonhos e pouco atraentes para eles,” disse à AFP. “Tudo indica que está a dar resultado. Eles estão a chegar a potenciais jovens recrutas.”
A abordagem da ISWAP ao TikTok revela uma estratégia de comunicação mais polida e coordenada do que a do Boko Haram, segundo Malik Samuel, analista de segurança da Good Governance Africa, com sede em Abuja. Acrescentou que usar membros jovens para espalhar propaganda é uma táctica comum do Boko Haram.
“Acredito que mostrar os seus rostos é estratégico, para mostrar que não têm medo e para que o seu alvo saiba que estão a interagir com pessoas reais,” disse à AFP.
Um porta-voz do TikTok disse à AFP que as suas directrizes comunitárias “não permitem a presença de organizações ou indivíduos violentos e odiosos” e que desactivou um número não especificado de contas ligadas a organizações terroristas. Mas o Boko Haram e a ISWAP estão claramente a prosperar lá.
A empresa-mãe do TikTok, ByteDance, embora não seja directamente detida pelo governo chinês, está sujeita às leis chinesas, incluindo aquelas que exigem que as empresas cooperem com os esforços de inteligência do governo. A probabilidade de Pequim aceder aos dados privados dos utilizadores do TikTok tem sido motivo de preocupação de governos de todo o mundo.
Zagazola Makama, especialista em combate ao terrorismo baseado no Estado de Borno que faz reportagens sobre a região do Lago Chade, disse que a proliferação do Boko Haram e da ISWAP no TikTok é “uma tendência perigosa capaz de influenciar mentes vulneráveis, incitar o ódio contra o Estado e revigorar os canais de recrutamento do terrorismo, principalmente entre simpatizantes urbanos.”
Ele instou as autoridades nigerianas a expandir a sua capacidade de monitorar e derrubar a presença dos grupos na internet.
“O facto de simpatizantes do terrorismo poderem divulgar tais mensagens sem controlo é uma acusação flagrante às nossas actuais capacidades de resposta digital”, escreveu no seu site, no dia 18 de Maio. “Esses indivíduos devem ser rastreados, as suas plataformas desmanteladas e o conteúdo removido sem demora.
“Devemos investir em ferramentas de vigilância e inteligência artificial de ponta para identificar esses propagandistas digitais. Eles são tão perigosos quanto atiradores em campo. A frente de batalha mudou; a guerra moderna agora é travada com balas e largura da banda.”