O Boko Haram e a Província do Estado Islâmico na África Ocidental (ISWAP) usaram drones carregados com explosivos quando mataram 12 soldados camaronenses e feriram outros 10 num ataque em Março a uma base militar na cidade de Wulgo, no nordeste da Nigéria. Os soldados faziam parte da Força-Tarefa Conjunta Multinacional que combate o terrorismo na região.
As cadeias de abastecimento para este tipo de armamento são limitadas no Sahel, mas os grupos terroristas ligados à al-Qaeda e ao Estado Islâmico, muitas vezes, utilizam armamento militar apreendido durante ataques a forças armadas africanas para perpetrar mais violência.
Isso é o que afirma um novo relatório da Conflict Armament Research (CAR), que não encontrou evidências de que grupos terroristas possam aceder a armas como espingardas de assalto, espingardas de combate, lança-granadas, metralhadoras, morteiros e lança-foguetes directamente de fora da região central do Sahel. As Nações Unidas aprovaram vários mandatos que proíbem especificamente a venda ou o fornecimento de armas a países em conflito ou com histórico de violações de direitos humanos.
Após o ataque a Wulgo, o ISWAP divulgou fotos de drones, balas e metralhadoras apreendidos no ataque.
A análise da CAR das armas apreendidas de grupos terroristas do Sahel entre 2014 e 2023 revelou que pelo menos 20% delas foram desviadas dos exércitos nacionais de Burquina Faso, Chade, Costa do Marfim, Libéria, Líbia, Mali, Níger e Nigéria.
“Estas armas permitem aos grupos jihadistas salafistas construir os seus arsenais e reforçar as suas posições, permitindo-lhes assim expandir a sua autoridade sobre grandes porções de território e aumentando a ameaça à autoridade do Estado e às comunidades locais,” afirma o relatório.
De acordo com a CAR, os arsenais dos grupos terroristas que operam na região da tríplice fronteira de Liptako-Gourma, partilhada pelo Burquina Faso, Mali e Níger ocidental, e os da região do Lago Chade são semelhantes. As espingardas de assalto representaram 78% das armas recuperadas na região de Liptako-Gourma e 85% em torno do Lago Chade. A maior parte das munições recuperadas dos grupos era de calibre militar.
Matthew Steadman, co-autor do relatório da CAR, disse à Agence France-Presse que a aquisição de material de calibre militar por grupos terroristas do Sahel criou um “círculo vicioso.”
“À medida que se tornam mais poderosos, à medida que apreendem mais armas, à medida que atacam mais postos avançados, a sua capacidade de continuar a fazê-lo aumenta exponencialmente,” afirmou Steadman.
Outra fonte importante de armas para estes grupos foram as armas de fogo que sobraram de conflitos anteriores, segundo o relatório. Os grupos terroristas nas áreas fronteiriças de Liptako-Gourma e do Lago Chade geralmente utilizam espingardas de assalto com décadas de idade, em particular as fabricadas nas décadas de 1960 e 1970. Muitas vezes, adquirem as chamadas “armas antigas” através do acesso a mercados ilícitos de armas.
“Armas que datam de décadas ainda estão em serviço em várias forças de segurança da região, o que significa que alguns itens mais antigos podem ter sido desviados da custódia do Estado há relativamente pouco tempo,” afirma o relatório.
Os grupos terroristas do Sahel normalmente mantêm um controlo rigoroso sobre as armas que apreendem e não as redistribuem rotineiramente. No entanto, investigações em curso da CAR sugerem que grupos na área de Liptako-Gourma ocasionalmente vendem armas capturadas para obter receitas, principalmente na forma de ouro. Esses fundos ajudam-nos a pagar militantes ou a adquirir suprimentos e equipamentos.
“A par da procura local em expansão por armas pequenas e ligeiras, bem como de uma indústria artesanal de mineração de ouro em crescimento, esta prática pode levar a um aumento da circulação ilícita de armas desviadas do governo para além dos círculos jihadistas salafistas,” afirma o relatório, acrescentando que são necessárias mais investigações para compreender melhor a questão.
A CAR encontrou poucas evidências de que grupos jihadistas salafistas ideologicamente alinhados que operam em diferentes regiões — como a Província do Sahel do Estado Islâmico (ISSP) e o ISWAP — partilhem armas entre si. Em alguns casos, grupos terroristas que lutam entre si — como Jama’at Nusrat al-Islam wal-Muslimin, ou JNIM, e o ISSP na área de Liptako-Gourma — utilizam armas da mesma série, indicando que dependem de esforços de aquisição semelhantes.
As armas produzidas e exportadas para a região após a queda do regime líbio de Muammar Kadhafi em 2011 representaram apenas 7% das armas apreendidas, de acordo com a CAR.
“Além disso, a CAR não encontrou qualquer evidência de que os grupos jihadistas salafistas no centro do Sahel estejam a depender sistematicamente de fontes de abastecimento de longo alcance, incluindo da Líbia,” afirma o relatório. “Em vez disso, as armas em posse dos jihadistas salafistas que tiveram origem nos stocks [da era Kadhafi] foram provavelmente adquiridas nos mercados locais.”
No entanto, o relatório revelou que mais de metade das munições de pequeno calibre apreendidas aos jihadistas do Sahel foram fabricadas na década anterior à sua recuperação. Grande parte destas munições foi fornecida às forças armadas do Sahel central e redireccionada a partir de lá.