A expansão pela China da sua rede de empresas de segurança privada em África está a desenrolar-se numa zona cinzenta do ponto de vista legal, segundo os analistas.
Estas empresas, conhecidas como ESP, estão a alargar o seu alcance sem um quadro regulamentar forte, o que apresenta riscos como a falta de transparência, controlos nacionais fracos e influência indevida sobre os governos, de acordo com Habib al-Badawi, professor da Universidade Libanesa.
“As leis nacionais na China não têm jurisdição sobre as ESP que operam no estrangeiro e a aplicabilidade das leis internacionais continua a ser um desafio formidável,” al-Badawi escreveu na revista Journal of Afro-Asian Studies. “A ausência de um quadro regulamentar robusto levanta preocupações sobre a necessidade de uma maior responsabilização nas operações das ESP chinesas no continente africano.”
Apesar de se descreverem como privadas, todas as ESP chinesas são controladas pelo Estado e povoadas por antigos membros do Exército de Libertação Popular e da Polícia Armada Popular — uma extensão do princípio Partido Comunista Chinês de que “o partido controla as armas.”
As ESP estão em África para proteger dezenas de milhares de chineses que trabalham nos projectos da Iniciativa do Cinturão e Rota de Pequim, que geram mais de 50 bilhões de dólares de receitas por ano para empresas estatais chinesas, segundo o Centro de Estudos Estratégicos de África.
Entre 2007 e 2020, a China investiu 23 bilhões de dólares em projectos de infra-estruturas em África. Os projectos da iniciativa aumentam a presença de Pequim no continente e a utilização de ESP para os proteger é “uma manobra inteligente da China para manter uma presença militar discreta em África e evitar ser vista como outra potência colonial,” o analista Valerio Fabbri escreveu para a página da internet geopolitica.info.
Os trabalhadores chineses em África enfrentam a violência, por vezes. Em Julho de 2024, milícias mataram nove cidadãos chineses numa exploração mineira ligada à China na província de Ituri, no nordeste da República Democrática do Congo. Os analistas dizem que incidentes como este — e um ataque em 2023 que matou nove cidadãos chineses numa mina de ouro na República Centro-Africana — resultaram no destacamento de mais empresas de segurança chinesas.
De acordo com a legislação chinesa, a maioria das ESP está proibida de usar armas, mas as empresas encontram formas de contornar as restrições. Muitas vezes, colaboram com empresas de segurança privadas locais ou com milícias locais para garantir a segurança. “Ao colaborar com milícias locais, está-se basicamente a tomar partido” em conflitos locais, Jasmine Opperman, consultora de segurança independente baseada na África do Sul, disse à Voz da América.
Apesar das restrições ao armamento, as empresas de segurança chinesas têm estado envolvidas em tiroteios e outros incidentes violentos no Quénia, Uganda, Zâmbia e Zimbabwe. Estes acontecimentos “sublinham os riscos potenciais e os dilemas éticos associados às operações das ESP chinesas, suscitando debates sobre a sua adesão a normas internacionalmente aceites,” escreveu al-Badawi
A presença crescente de empresas de segurança chinesas “pode potencialmente levar a uma maior interferência chinesa em África, para além da violação de direitos humanos e do aumento das actividades ilegais,” escreveu Fabbri. “Nos próximos tempos, as ESP de Pequim, apoiadas pela crescente presença militar chinesa em África, estão a caminho de se transformarem em ‘Empresas Militares Privadas.’”
As ESP e empresas militares privadas (EMP) não são a mesma coisa, visto que as EMP prestam principalmente serviços relacionados com as forças armadas, como formação, apoio de combate e logística a governos e clientes privados, muitas vezes, em zonas de conflito. Alguns críticos afirmam que a utilização pela China de empresas de segurança privadas em África viola o seu próprio princípio de não interferência e estas são usadas “como um representante para promover os interesses estratégicos e a influência [de Pequim] em África,” escreveram os analistas da Military Africa. “Outros alertam para o facto de as EMP da China poderem constituir uma ameaça à soberania e estabilidade dos países africanos e de poderem envolver-se em conflitos ou violações de direitos humanos.”
As empresas privadas chinesas têm estado directamente envolvidas em operações militares no Sudão, onde uma guerra civil dura desde Abril de 2023, e no Sudão do Sul, onde paira o espectro de uma guerra civil.