Menos de duas semanas depois de 50 milhões de litros de resíduos tóxicos da mina de cobre da Sino-Metals Leach terem sido despejados no Rio Kafue, três ministros do governo zambiano fizeram uma visita surpresa a outra mina de propriedade chinesa, situada a 11 quilómetros de distância, onde as autoridades já tinham suspendido as operações por incumprimento das normas ambientais.
No dia 1 de Março, na fábrica de processamento mineral Rongxing, encontraram ácido a vazar do mesmo tipo de barragem de rejeitos que ruiu na Sino-Metals a 18 de Fevereiro, causando o pior desastre ambiental do país em anos.
Collins Nzovu, Ministro do Desenvolvimento da Água e do Saneamento, falou com os jornalistas depois de ver a barragem de rejeitos com fugas, onde os efluentes tóxicos das operações mineiras são armazenados numa série de grandes lagos e lagoas rodeados por aterros de terra.
“Durante a nossa inspecção, descobrimos que a fábrica de processamento mineral Rongxing, em Kalulushi, estava a poluir impunemente o nosso sistema fluvial,” afirmou, segundo o jornal zambiano Daily Nation. “Encerrámos as operações, ordenámos uma limpeza imediata e exigimos uma compensação para as comunidades afectadas.
“Estou chocado com o flagrante desrespeito pelos regulamentos ambientais, e isto tem de acabar para que as vidas das pessoas e o ambiente sejam protegidos.”
Os ministros mandaram prender o director da Rongxing e ordenaram que a polícia se deslocasse ao local para fazer cumprir o encerramento, que tinha sido ordenado no início de Fevereiro, depois de um operador da mina ter morrido ao cair num sistema de drenagem cheio de ácido. Segundo um colega de trabalho, o terrível acidente poderia ter sido evitado se a empresa tivesse fornecido equipamento de protecção individual adequado.
O derrame da Sino-Metals e o seu impacto catastrófico no Rio Kafue e nas comunidades vizinhas chamaram a atenção para as empresas mineiras de propriedade chinesa na Zâmbia, para os seus abusos ambientais e laborais e para a sua negligência sistemática.
Desde funcionários do governo a grupos ambientalistas e da sociedade civil, existe uma preocupação generalizada de que o enorme derrame da Sino-Metals contamine as águas subterrâneas. O Ministério do Desenvolvimento da Água e Saneamento de Nzovu disse que as “consequências devastadoras” também incluíam a destruição de culturas ao longo das margens do rio.
“Eu costumava vender no mercado de Chisokone, mas fechei a loja porque não havia negócio,” Margaret Musongole, uma agricultora da zona de Mwambashi, disse ao The Africa Report em Março. “Agora, estes chineses vieram destruir os meus campos de milho. É como se estivessem a matar-me duas vezes.”
A resposta da Sino-Metals ao derrame só surgiu depois de os grupos da sociedade civil e os meios de comunicação social locais terem registado a história. A empresa terá pago várias toneladas métricas de cal para serem despejadas nos cursos de água afectados, mas os especialistas dizem que a cal apenas contraria os impactos dos níveis extremos de acidez e nada faz em relação a outras toxinas e metais pesados ainda presentes na água.
“Há uma grande preocupação com os esforços de remediação,” Luwi Nguluka, director de comunicações da organização Wildlife Crime Prevention na Zâmbia, disse à ADF. “Mesmo que os níveis de acidez normalizem, os metais pesados persistirão no sistema fluvial, envenenando os peixes e outras formas de vida aquática durante anos. Algumas espécies podem adaptar-se às condições ácidas, mas esta mudança seria desastrosa para a biodiversidade e para as pessoas que dependem da pesca.”
Nguluka disse que o maior problema agora é a falta de transparência e responsabilidade no processo de limpeza.
“Sem uma monitorização adequada, é difícil garantir que os esforços de remediação são eficazes e que as declarações públicas correspondem à realidade no terreno,” disse. “Os relatórios indicam que as comunidades afectadas não estão a receber água ou alimentos adequados, o que levanta mais dúvidas sobre o empenho da mina numa intervenção significativa.”
De acordo com um inquérito do Afrobarometer de 2024, a favorabilidade da China na Zâmbia diminuiu 30% desde 2014. Os sentimentos anti-chineses têm vindo a crescer devido às práticas de empréstimo chinesas e ao incumprimento da dívida da Zâmbia.
Actualmente, a China detém mais de 4 bilhões de dólares da dívida externa da Zâmbia e prometeu 5 bilhões de dólares de investimento em cobre até 2031. No entanto, vários defensores proeminentes da sociedade civil, como Maggie Mwape, estão preocupados com o facto de a China ter prendido a Zâmbia numa armadilha da dívida, o que poderia afectar os esforços para remediar estes derrames tóxicos e proteger o ambiente.
“A influência económica e política significativa da China na Zâmbia poderia potencialmente minar os esforços para responsabilizar a Sino-Metal pelo derrame de poluição,” disse à ADF. “O governo da Zâmbia pode ser pressionado a dar prioridade aos interesses económicos em detrimento das preocupações ambientais e sociais.
“É essencial que a sociedade civil, as comunidades locais e as organizações internacionais mantenham a pressão sobre o governo e a Sino-Metal para garantir que os culpados sejam responsabilizados e que sejam tomadas medidas para evitar desastres semelhantes no futuro.”
Emmanuel Matambo, director de investigação do Centro de Estudos África-China da Universidade de Joanesburgo, disse que os últimos derrames vão reavivar o debate de longa data sobre os danos ambientais que, historicamente, têm vindo a ser causados pela exploração mineira chinesa em África.
“Embora esta preocupação tenha desaparecido por volta de 2010, o derrame de Kafue vai reavivá-la e vai lançar uma luz muito pouco lisonjeira sobre o investimento chinês na Zâmbia,” disse ao jornal South China Morning Post. “Vai fazer retroceder as relações entre a Zâmbia e a China de uma forma muito prejudicial.”
Iva Pesa, professora assistente de história contemporânea na Universidade de Groningen, nos Países Baixos, classificou o derrame da Sino-Metals como um dos “maiores desastres mineiros da história da Zâmbia.” Preocupa-a o facto de ser indicativo de um sistema de redução de custos entre as empresas mineiras.
Acredito que é um sinal de “corte de custos” sistémico em termos de investimento mineiro chinês na Zâmbia,” disse ao the Post. “Acredito que as empresas chinesas querem cortar custos ao máximo — uma espécie de ‘corrida para o fundo’ — e as precauções ambientais nem sempre são respeitadas.”