EQUIPA DA ADF
A Argélia e o Mali estão envolvidos numa polémica diplomática. Bamako acusa Argel de apoiar os grupos separatistas malianos, enquanto a Argélia critica o Mali por não ter respeitado o acordo de paz com os rebeldes Tuaregues.
A contenda explodiu recentemente quando o Ministro dos Negócios Estrangeiros da Argélia, Ahmed Attaf, se opôs aos planos do Mali para reclassificar certos grupos separatistas do norte como organizações terroristas. Attaf também criticou a ineficácia dos esforços de combate ao terrorismo do Mali.
“Uma solução militar é impossível no Sahel e no Sahara, em particular no Mali, visto que já foi tentada três vezes no passado e falhou,” Attaf disse num comunicado de Dezembro.
A Argélia defende os movimentos da oposição maliana que tinham assinado o acordo de paz dos Acordos de Argel em 2015. O acordo tinha por objectivo dar mais voz aos grupos do norte no governo do Mali, após a rebelião Tuaregue de 2012. O Mali terminou o acordo em Janeiro de 2024.
Bamako considerou os comentários de Attaf como uma intromissão nos seus assuntos internos. O Ministério dos Negócios Estrangeiros respondeu no início de Janeiro com uma declaração em que afirmava que as suas opções estratégicas contra grupos terroristas armados são da sua exclusiva competência.
“A este respeito, o Mali não pede nem recebe lições da Argélia, que, num passado recente, conduziu a sua luta contra o terrorismo em plena soberania,” refere o comunicado maliano.
O comunicado também alega que as autoridades argelinas têm “uma simpatia indisfarçável pelos grupos terroristas” que actuam no Mali e na região do Sahel.
“Por conseguinte, o Ministério apela à Argélia para que redireccione as suas energias para a resolução das suas próprias crises e contradições internas, incluindo a questão da Cabília, e para que deixe de utilizar o Mali como uma alavanca para o seu posicionamento internacional,” refere o comunicado maliano.
Cabília é um grupo étnico das regiões montanhosas do norte da Argélia. O Movimento para a Autodeterminação de Cabília (MAK, na sigla ingelsa) procura a autonomia e a independência da região argelina de Cabília e as autoridades argelinas classificaram o MAK como uma organização terrorista.
Em Janeiro, o antigo presidente do MAK, Ferhat Mehenni, pediu a Amar Benjamaa, embaixador da Argélia nas Nações Unidas, que iniciasse um debate no Conselho de Segurança da ONU sobre o direito do seu povo à autodeterminação. Mehenni acusou o governo argelino de reprimir violentamente as aspirações independentistas da Cabília desde Junho de 2021.
“Mais de 13.000 activistas foram presos, sujeitos a tortura e, em alguns casos, a violência sexual durante os interrogatórios,” escreveu Mehenni, alegando que 38 cabilas estão no corredor da morte por crimes que não cometeram.
As relações entre a Argélia e o Mali têm vindo a deteriorar-se desde Dezembro de 2023, altura em que os dois países chamaram os seus embaixadores.
“A Argélia receia que esta escalada de tensões possa conduzir a um movimento separatista Tuaregue bem-sucedido, que inspiraria grupos étnicos marginalizados na Argélia, no Níger e na Líbia a procurar a sua autonomia,” o analista Assala Khettache escreveu para o Royal United Services Institute. “Uma fuga dos Tuaregues no Mali pode desestabilizar uma região do Sahel já de si frágil, sendo as fronteiras meridionais da Argélia especialmente vulneráveis.”
Em meados de Janeiro, um espanhol foi raptado no sul da Argélia e mantido em cativeiro durante vários dias até ser liberto pela Frente de Libertação de Azawad (FLA), uma coligação de grupos separatistas do norte do Mali, predominantemente Tuaregue.
A FLA afirmou que Gilbert Navarro foi raptado por uma “máfia transnacional,” sem nomear o grupo. Estava de boa saúde quando foi entregue às autoridades argelinas.
A FLA afirmou, numa reportagem do The New Arab, que Navarro e os seus raptores se encontravam perto de Tinzawaten, na fronteira com a Argélia.
Em Julho de 2024, Tinzawaten foi o local de três dias de violência, durante os quais 47 soldados malianos e 84 mercenários russos foram mortos por combatentes do grupo terrorista Jama’at Nusrat al-Islam wal-Muslimin, ligado à al-Qaeda, e de um grupo rebelde Tuaregue recém-formado. Tartou-se da maior derrota da Rússia desde que foi destacada para o Mali em 2021 e a pior derrota das FAMa desde que as hostilidades recomeçaram em 2023.
A junta militar do Mali comprometeu-se repetidamente a restaurar a segurança no país, depois de ter utilizado a ameaça terrorista como justificação para os golpes de Estado de 2020 e 2021. Pelo contrário, a violência agravou-se. As suas forças sofreram perdas militares e o governo expulsou as forças de manutenção da paz da ONU e da França do país.
Após a partida da Missão Multidimensional Integrada de Estabilização das Nações Unidas no Mali (MINUSMA), em Dezembro de 2023, os ataques terroristas aumentaram. Desde então, até Novembro de 2024, os ataques de grupos extremistas mais do que duplicaram, de acordo com o Global Conflict Tracker.