EQUIPA DA ADF
A rápida evolução do ambiente online em África está a ultrapassar os esforços de segurança cibernética do continente, criando o potencial para um evento que os especialistas designam por “cibergedom.” O pior cenário possível incluiria um ataque às redes informáticas que poderia afectar os sistemas de energia e de água, as redes financeiras e, em última análise, a segurança nacional de um país.
A boa notícia é que, actualmente, o risco de um ataque deste tipo nos países africanos é relativamente baixo. A má notícia é que a ameaça aumenta com cada novo terminal de computador e ligação de telemóvel.
De acordo com Noelle van der Waag-Cowling, responsável pela estratégia e inovação do Instituto de Segurança Cibernética da África do Sul, um plano de defesa contra o cibergedom deve fazer parte da estratégia cibernética de cada país.
Até agora, a guerra cibernética resume-se a 90% de espionagem e 10% de ataques directos destinados a causar danos, segundo van der Waag-Cowling. No entanto, à medida que mais e mais infra-estruturas cruciais se ligam à internet, aumenta a probabilidade de o rácio se alterar.
“A principal utilidade da guerra cibernética é perturbar e degradar as competências do adversário, ganhando tempo e espaço, o que é fundamental num campo de batalha,” van der Waag-Cowling disse aos participantes na Conferência Africa Aerospace and Defence (AAD) 2024, na África do Sul. “A maior ameaça cibernética é aquela que faz cair as infra-estruturas críticas, atacando pontos de risco únicos que causam falhas de energia, água ou transportes.”
A rápida expansão da internet em África significa que a comunidade online do continente mais do que triplicou numa década, passando de 181 milhões em 2014 para 646 milhões em 2024. É provável que este número duplique para mais de 1,1 bilhões nos próximos cinco anos, de acordo com a Statista.
Este crescimento ultrapassou largamente a capacidade dos especialistas em segurança cibernética para o acompanhar. Actualmente, o continente conta com cerca de 20.000 profissionais formados em segurança cibernética, muito aquém dos 100.000 de que necessita com base na sua população.
África no seu conjunto gastou 2,3 bilhões de dólares em segurança cibernética em 2024, um valor que deverá duplicar para 4,6 bilhões de dólares este ano.
De acordo com van der Waag-Cowling, os países devem analisar atentamente a sua ciberdependência e o grau em que estão preparados para recuperar de um ataque catastrófico contra infra-estruturas públicas fundamentais.
A primeira coisa a compreender é “o que estamos a construir e como está ligado?,” van der Waag-Cowling disse num webinar organizado pelo Centro de Estudos Estratégicos de África.
Muitos dos principais projectos de infra-estruturas de África são desenvolvidos sem ligações à internet. Mas esta situação está a mudar rapidamente, acrescentou.
Nos últimos anos, os países africanos com maior utilização da internet registaram centenas de milhões de ataques. Só em 2024, esses ataques conseguiram fechar bancos no Uganda, serviços de saúde na África do Sul e agências governamentais no Quénia e na Nigéria.
À medida que os ataques cibernéticos se tornam uma arma nas lutas geopolíticas, as nações devem estar preparadas para se defenderem no espaço cibernético e no campo de batalha, van der Waag-Cowling disse na conferência da AAD.
Os especialistas em segurança cibernética afirmam que uma boa defesa cibernética exige cooperação internacional, mas que esta pode entrar em colapso quando surgem conflitos transfronteiriços. Exige também estruturas jurídicas nacionais e sistemas de segurança que possam responder rapidamente aos ataques.
No Quénia, por exemplo, a equipa nacional de resposta a incidentes informáticos (CIRT) emitiu 9,6 milhões de avisos de segurança cibernética entre Julho e Setembro de 2024. Durante esse mesmo período, o número de ataques cibernéticos contra alvos quenianos diminuiu 42%, de 1,13 bilhões para 657,8 milhões, em comparação com os três meses anteriores, de acordo com a Autoridade das Comunicações do Quénia.
Para evitar um potencial evento de cibergedom, é crucial que os países africanos prestem muita atenção à segurança do seu sistema nacional de internet e dos utilizadores a ele ligados, van der Waag-Cowling disse na conferência da AAD.
“Temos de entrar no jogo cibernético, mas precisamos de uma estratégia de guerra cibernética ligada à estratégia de segurança nacional,” afirmou. “Uma estratégia cibernética não se pode sustentar por si só.”