EQUIPA DA ADF
Em todo o continente, as forças militares perseguem os insurgentes e os extremistas violentos, observando-os através de telémetros e binóculos, miras telescópicas de espingardas e óculos de visão nocturna. Em alguns espaços de batalha, os drones procuram alvos a partir do céu.
As tácticas funcionam até certo ponto, mas os soldados enfrentam ameaças constantes quando não têm uma visão clara do campo de batalha. Os drones podem ser ouvidos, depois vistos, depois abatidos ou evitados.
No entanto, há um tipo de tecnologia que coloca os operadores muito acima da luta, recolhendo informações sobre tudo, desde condições meteorológicas adversas a necessidades de infra-estruturas e movimentos de tropas. Os países de toda a África estão a apostar na tecnologia espacial e de satélite para localizar pessoas, detectar ameaças marítimas, avaliar os efeitos das catástrofes naturais e muito mais.
“As aplicações de teledetecção fornecem uma miríade de produtos e serviços, incluindo a monitorização do estado dos nossos recursos naturais, a observação do tráfego de navios nas nossas zonas económicas costeiras e o fornecimento de informações para a agricultura de precisão, que podem ajudar um agricultor a decidir, por exemplo, quando irrigar e a quantidade de fertilizante a utilizar,” escreveu Val Munsami, reitor da Universidade Espacial Internacional em França, na Chatham House em 2022.
A tecnologia de satélite pode detectar alterações que prenunciam doenças transmitidas pela água, melhorar a navegação marítima e aérea e fornecer dados de posicionamento para serviços médicos, postais, de planeamento urbano, de infra-estruturas e outros serviços públicos críticos, escreveu Munsami, que é o antigo director-executivo da Agência Espacial Nacional da África do Sul (SANSA).
“As aplicações e inovações para a resolução de problemas proporcionadas pelos produtos e serviços espaciais são infinitas.”
Os países africanos começaram a investir mais recursos na promessa da tecnologia espacial como um activo de segurança e desenvolvimento. Pelo menos 21 países espalhados pelo continente criaram uma agência ou organização relacionada com o espaço. Algumas lançaram os seus próprios satélites e estão a construir relações multinacionais através de conferências e acordos.
OS SATÉLITES TRAZEM PERSPECTIVA
O Quénia tem estado muito activo no desenvolvimento do seu programa espacial. Em Abril de 2023, a Agência Espacial do Quénia (KSA) lançou o Taifa-1, o seu primeiro satélite de observação da Terra, a bordo de um foguetão SpaceX na Califórnia. A missão do pequeno satélite é recolher dados agrícolas e ambientais, incluindo sobre inundações, secas e incêndios florestais, para ajudar na gestão de catástrofes e combater a insegurança alimentar, informou a Reuters.
“Temos os desafios provocados pelas alterações climáticas, que o satélite, por ser capaz de captar imagens (poderá ajudar a monitorizar),” Aloyce Were, engenheiro aeronáutico e director-adjunto de Navegação e Posicionamento da KSA, disse à Reuters antes do lançamento. “Podemos monitorizar as alterações florestais; podemos monitorizar as alterações da urbanização.”
Com um custo de construção de 372.000 dólares, o Taifa-1 oferece um valor invejável pelo seu custo, que é pouco mais de um terço do preço médio unitário de um veículo blindado de segurança M1117 Guardian.
Em Junho de 2024, o país realizou a sua segunda Exposição e Conferência Espacial do Quénia em Nairobi, subordinada ao tema “Tecnologias Espaciais para Benefícios Sociais.” A exposição incluiu representantes do governo, do meio académico, das empresas, de grupos internacionais e do público num “diálogo sobre a utilização das tecnologias espaciais para responder às necessidades da sociedade,” de acordo com uma nota conceitual do evento.
Os objectivos eram mostrar as aplicações da tecnologia espacial e a forma como podem beneficiar a sociedade, trocar ideias, incentivar a colaboração, sensibilizar o público, incentivar a inovação e promover o investimento na economia espacial.
Durante a cerimónia de abertura da exposição, Aden Duale, secretário de Estado da Defesa do Quénia, enumerou um vasto leque de efeitos que a tecnologia espacial pode ter no país, como a melhoria da segurança alimentar, a gestão da cadeia de abastecimento, o apoio à produção de energia e a previsão de desastres naturais.
“O Quénia não se pode dar ao luxo de ficar para trás nesta perspectiva favorável para a economia espacial global,” afirmou Duale. “É por isso que, enquanto governo, estamos a levar a sério o nosso programa espacial nacional.”
Os países africanos encaram a tecnologia espacial sobretudo como um instrumento de desenvolvimento. Esta é a abordagem correcta, o nigeriano Temidayo Oniosun, director-geral da Space in Africa, uma empresa de marketing e consultoria sediada em Lagos, na Nigéria, disse ao Le Monde em 2023.
Em 2021 e 2022, Angola, Etiópia, Quénia, Maurícias e Uganda adquiriram novos satélites, informou o Le Monde, o que elevou o número total de satélites africanos para 55 em órbita na altura. Não é um número significativo em termos das dezenas de milhares que circulam pelo mundo, mas a maioria foi lançada num período de cinco a sete anos e muitos mais estavam em desenvolvimento, disse Oniosun.
ESPAÇO E SEGURANÇA
O Uganda lançou o seu primeiro satélite em Novembro de 2022. O PearlAfricaSat-1 entrou na atmosfera terrestre a bordo de uma nave espacial Cygnus da Northrop Grumman, lançada de uma instalação da NASA na Virgínia, Estados Unidos. A nave transportou também o primeiro satélite do Zimbabwe, o ZimSat-1. Ambos foram para a Estação Espacial Internacional, onde acabaram por ser colocados.
Ambos os satélites, criados com a cooperação do Japão, serão utilizados para a observação da Terra. No entanto, o Uganda tem vindo a afirmar publicamente que o espaço exterior é um instrumento de segurança nacional.
Menos de um ano depois do lançamento do PearlAfricaSat-1, o Presidente do Uganda, Yoweri Museveni, disse aos oficiais graduados das Forças de Defesa Popular do Uganda que a nação iria lançar um satélite para melhorar as operações de segurança.
De acordo com um relatório de Setembro de 2023 da Space in Africa, Museveni afirmou que “o exército ugandês está a reforçar a sua capacidade para lidar com todas as ameaças. O lançamento planeado de satélites, que se espera funcionem como olhos para os militares, reforçará a nossa percepção das ameaças à segurança. Nas fases iniciais, tínhamos apenas a infantaria. No entanto, estamos agora a trabalhar no sentido de lançar um satélite.”
O satélite monitorizará as zonas fronteiriças, detectará potenciais ameaças e conduzirá a respostas mais eficazes às violações da segurança.
O espaço tornou-se uma arena essencial para as operações militares e de informação modernas, de acordo com a página da internet Web New Space Economy. Os satélites podem fornecer uma série de funções de segurança, tais como:
• Comunicações: os satélites tornam possível a comunicação segura e encriptada em terra, no mar e no ar.
• Navegação e geolocalização: os sistemas de posicionamento global fornecem uma orientação de navegação fiável em aplicações civis e militares.
• Vigilância e reconhecimento: as câmaras e os sensores de alta resolução podem fornecer informações vitais.
• Sistemas de aviso prévio: os satélites podem detectar lançamentos de mísseis, movimentos de tropas e navios e outras ameaças potenciais, proporcionando mais tempo de resposta.
O FUTURO
Os países africanos não se contentam com o simples lançamento de satélites e com a recolha de dados para si próprios. Em todo o continente, as nações estão a mostrar vontade e capacidade de se envolverem com parceiros internacionais no espírito de fazer avançar a tecnologia espacial a nível mundial e até de apoiar uma maior exploração espacial com tripulação.
Um dos países mais pequenos de África, as Maurícias, implantou o seu primeiro satélite, o MIR-SAT1, em 2021. Em Abril de 2024, as Maurícias realizaram também o seu primeiro Simpósio Espacial Internacional, um evento de dois dias que visava “a partilha de conhecimentos, a exploração, a inovação e a unidade,” de acordo com um comunicado do governo.
Em 2022, a SANSA renovou uma parceria de exploração lunar com a NASA, abrindo caminho para a construção de um novo centro de comunicações que apoiará o projecto Artemis, que pretende levar pessoas à Lua e preparar o terreno para novas explorações espaciais.
Uma nova antena do Lunar Exploration Ground Sites (LEGS) está planeada para Matjiesfontein, África do Sul. Os dois países assinaram também uma declaração conjunta de intenções para formalizar a sua parceria no domínio da exploração espacial. A antena LEGS será a segunda de três dispositivos de 18 a 24 metros colocados em todo o mundo “para assegurar uma conectividade quase contínua entre a Terra e os astronautas a bordo da nave espacial Artemis da NASA, bem como as naves espaciais em órbita da Lua,” informou a NASA. Prevê-se que esteja concluída em 2026.
O programa Artemis é a ambiciosa missão da NASA para colocar a primeira mulher e pessoa de cor na lua, estabelecer uma presença de longo prazo na lua e usar o que for aprendido para enviar os primeiros astronautas a Marte. E um país africano participará na sua concretização.