EQUIPA DA ADF
Os confrontos entre os primeiros-ministros civis e os líderes das juntas militares no Sahel estão a pôr em evidência a natureza instável dos governos liderados por militares numa região onde os ataques terroristas se multiplicam.
No dia 6 de Dezembro, o Capitão Ibrahim Traoré, do Burquina Faso, demitiu o Primeiro-Ministro, Apollinaire Kelem de Tambela, que tinha nomeado para o cargo dois anos antes. Traoré também dissolveu o governo. A medida foi tomada numa altura em que o Burquina Faso enfrenta uma situação de deterioração da segurança, com 13.500 pessoas mortas pela violência extremista desde que os militares tomaram o poder num golpe de Estado em 2022. Os grupos armados controlam actualmente mais de metade do país.
Num processo rápido de remodelação, o antigo ministro burquinabê da comunicação e aliado próximo de Traoré, Rimtalba Jean Emmanuel Ouédraogo, foi nomeado Primeiro-Ministro dois dias depois e fez várias nomeações importantes para formar um novo governo. Não foi dada qualquer explicação desta alteração.
“O despedimento de [de Tambela] levanta muitas questões nas mentes dos observadores,” Franck Koffi escreveu para o Afrik.com. “Os analistas perguntam se esta saída está ligada a divergências no seio do governo, a tensões com o Presidente Traoré ou a divergências sobre a forma como a transição deve ser gerida.”
A medida seguiu-se a uma acção semelhante no Mali, onde uma junta substituiu o Primeiro-Ministro civil, Choguel Maiga, pelo General das Forças Armadas do Mali, Abdoulaye Maiga, em Novembro. Antes de ser demitido, o líder civil tinha criticado o prolongamento do regime militar, afirmando que a não fixação de uma data firme para as eleições poderia causar ao país “sérios desafios e o risco de retrocesso.”
Os despedimentos mostram que as juntas estão a ter dificuldade em encontrar aliados civis dispostos a apoiar a sua agenda e a ajudá-las a manter o poder. O Dr. Olayinka Ajala, professor associado da Universidade Leeds Beckett, que estuda a segurança e a governação no Sahel, disse que as juntas de toda a região tentaram convencer o público da necessidade de adiar as eleições até que a ameaça à segurança tenha passado. Esta situação cria uma tensão natural com as autoridades civis que, muitas vezes, defendem um regresso mais rápido à ordem constitucional.
“Eles sabem que o facto de os civis fazerem parte da organização dificultará a continuação da venda destas narrativas, porque os civis continuarão a pressioná-los para fazerem a transição,” Ajala disse à ADF. “Mas parece que não têm pressa em fazer a transição; estão a reforçar as suas garras.”
A junta governativa do Mali tinha inicialmente prometido realizar eleições no início de 2024, mas adiou-as indefinidamente. O exército do Burquina Faso tinha-se comprometido a realizar eleições em Julho de 2024, mas prolongou o seu mandato por mais cinco anos.
Por enquanto, segundo Ajala, uma grande percentagem do público está disposta a aceitar o regime militar devido à raiva contra a classe política que governou os países anteriormente e ao medo de uma escalada de violência. As juntas militares utilizam a insegurança para justificar a manutenção do poder.
“Conseguiram criar a narrativa de que vai demorar algum tempo a resolver algumas das questões prementes dos países,” disse Ajala. “A insegurança tem sido uma forma muito boa de dizerem ‘Bem, ainda não podemos fazer a transição para a democracia por causa da insegurança’ … a questão é saber até que ponto é que isso vai continuar a funcionar? Não sabemos.”
Os primeiros resultados da abordagem militar da luta contra o extremismo violento não foram positivos. Mais de 11.000 pessoas foram mortas nos países do Sahel em 2024, o triplo do total registado em 2020. Ao mesmo tempo, tanto as forças armadas do Burquina Faso como as do Mali são acusadas de abusos e de execuções extrajudiciais. A maior parte dos peritos acredita que uma abordagem pesada e exclusivamente militar da luta contra o terrorismo não será bem-sucedida e poderá mesmo agravar o problema.
“Enquanto não forem resolvidas as questões socioeconómicas, incluindo a pobreza, que levam os jovens a aderir a grupos terroristas, estas questões não desaparecerão,” disse Ajala. “Independentemente das conquistas militares, estas serão efémeras, porque é necessário resolver estas questões subjacentes.”