EQUIPA DA ADF
Após anos a apoiar o déspota sírio Bashar al-Assad com uma combinação de poder militar e mercenário, a Rússia acabou por não conseguir protegê-lo de uma ofensiva rebelde que rapidamente derrubou o governo em Dezembro.
Embora a queda de Assad tenha implicações geopolíticas a nível mundial, teve um impacto particularmente forte em África, onde a Rússia apoia juntas militares e líderes autocráticos.
“É uma derrota política estratégica para Moscovo e lançou o Kremlin numa crise,” escreveu o Instituto para o Estudo da Guerra, no dia 8 de Dezembro. “A incapacidade ou a decisão da Rússia de não reforçar o regime de Assad, numa altura em que a ofensiva da oposição síria obteve ganhos rápidos em todo o país, também prejudicará a credibilidade da Rússia como parceiro de segurança fiável e eficaz.”
Longas colunas bloquearam as estradas da Síria à medida que as tropas e os meios militares russos se retiravam para os seus dois principais postos — a base aérea de Khmeimim e a base naval de Tartus. Navios de guerra, cargueiros, caças e aviões de transporte regressaram à Rússia para evitar o caos, pois tornou-se evidente que o presidente russo, Vladimir Putin, tinha apoiado o lado perdedor na longa e sangrenta guerra civil da Síria.
“Isto será humilhante para o Kremlin e potencialmente prejudicial também,” disse o correspondente da Sky News, Ivor Bennett, numa reportagem a partir de Moscovo. “Depois de terem feito tanto para manter Assad no poder durante a última década, perderam um aliado estratégico fundamental, o que, por sua vez, pode prejudicar seriamente a influência regional da Rússia.”
As duas bases principais serviam de centros logísticos cruciais entre África e a Rússia. Os especialistas dizem que não está claro se os novos líderes da Síria permitirão que as forças russas as mantenham.
“Sem uma ponte aérea fiável, a capacidade da Rússia para projectar poder em África entra em colapso,” Anas el-Gomati, director do Instituto Sadeq, sediado na Líbia, disse à Bloomberg. “Toda a estratégia operacional da Rússia no Mediterrâneo e em África está por um fio.”
A base aérea de Khmeimim era uma paragem essencial para os aviões militares e de carga que reabasteciam a caminho de África. De acordo com Rybar, um conhecido canal de blogues militares russos no Telegram, os aviões de carga só podem chegar à Líbia directamente da Rússia se estiverem vazios. Rybar disse que o Kremlin precisará de “opções alternativas,” incluindo o reforço da sua presença na Líbia e no Sudão.
John Foreman, antigo adido de defesa britânico em Moscovo, disse que a perda das bases russas na Síria tornaria muito mais difícil apoiar os cerca de 20.000 mercenários baseados principalmente no Burquina Faso, na República Centro-Africana, na Líbia, no Mali e no Níger.
“A sua provável perda é um revés estratégico significativo para a Rússia no seu flanco sul,” disse ao jornal britânico The Telegraph. “A Rússia não tem bases permanentes em geral, pelo que ambas são importantes e ambas tiveram investimentos significativos nos últimos sete anos.”
Com Assad agora exilado em Moscovo, muitos dos investimentos mais importantes da Rússia no Médio Oriente e em África estão em perigo. Mas são os danos à reputação que poderão ter mais peso no continente. Quando Assad fugiu de casa, poucas horas antes de Damasco ser invadida, a 8 de Dezembro, ele e a sua família foram os únicos beneficiários do mesmo “pacote de sobrevivência do regime” que a Rússia oferece aos governantes das juntas militares em África.
Os peritos dizem que o fracasso da Rússia ficará provavelmente na mente dos seus parceiros na África Subsariana.
“As autoridades no poder no Mali, na República Centro-Africana e noutros países que dependem das forças de segurança russas podem começar a questionar se Moscovo tem a capacidade — ou a vontade — de os ajudar em tempos de crise,” Federico Manfredi Firmian, investigador associado do Instituto Italiano de Estudos Políticos Internacionais, disse ao The Africa Report.
“A preocupação do Kremlin com a Ucrânia já limitou a sua capacidade de actuar noutros locais. Perder a Síria amplifica ainda mais as dúvidas sobre a capacidade da Rússia para cumprir as suas promessas, sinalizando aos parceiros actuais e potenciais que poderão ter de procurar apoio noutro lado.”