Grupos Terroristas Aproveitam a Raiva dos Fulani para Recrutar Combatentes

EQUIPA DA ADF

Em meados de Agosto, um ataque a uma comunidade Fulani no centro do Mali fez 23 mortos e 300 desaparecidos.

Depois de invadirem a aldeia de Saran, os atacantes não identificados dirigiram-se para a aldeia Fulani de Bidi, mas as pessoas já tinham fugido, disse Harouna Sankare, edil da vizinha Ouenkoro.

“Como não encontraram ninguém (em Bidi), queimaram a aldeia e as casas e atacaram o gado,” Sankare disse ao Africanews.

Os Fulani são um grupo étnico com uma população de cerca de 30 milhões de pessoas que se estende pelo Sahel, do Senegal ao Sudão. São frequentes os ataques às comunidades Fulani, tradicionalmente pastorais, em toda a região. Os ataques são normalmente cometidos por outros grupos étnicos durante disputas de terras, pelas forças de segurança do Estado, por milícias locais e por mercenários russos que apoiam regimes militares no Burquina Faso, no Mali e no Níger.

Descritos como seminómadas, muitos Fulani ainda seguem tradições antigas, pastoreando o gado durante centenas de quilómetros em busca de terras de pastagem. Isso leva a confrontos entre pastores Fulani e comunidades agrícolas, alimentando o ódio e dando origem a uma violência mais vasta.

Os Fulani também desempenham um papel nos grupos terroristas. Um pregador Fulani fundou o grupo terrorista maliano Frente de Libertação de Macina, tal como o grupo Ansaroul Islam no Burquina Faso. Os Fulanis estão bem representados nas fileiras do Estado Islâmico do Grande Sara, Ansar Dine e Jama’at Nusrat al-Islam wal-Muslimin (JNIM).

As forças armadas do Burquina Faso são acusadas de atacar especificamente os Fulanis na sua tentativa de erradicar os grupos terroristas.

“Os Fulanis … estão a ser atacados e perseguidos pelo governo local e pelas milícias,” Wassim Nasr, investigador sénior do Centro Soufan, disse à France 24. “E sabemos que, entre as comunidades Fulani, temos castas. Assim, as castas mais baixas estão a ver uma espécie de vingança ao juntarem-se aos jihadistas, mas as classes mais altas continuam a ser leais ao governo. Portanto, não é apenas religioso, é também um jogo com a estrutura social.”

A situação é semelhante no Mali e no Níger. O golpe de Estado mais recente do Níger ocorreu em Julho de 2023. No primeiro ano de governo da junta, o número de civis mortos por grupos islâmicos armados no Níger aumentou, numa altura em que os ataques se tornavam mais letais mas menos frequentes. De acordo com a análise do projecto de Localização de Conflitos Armados e Dados de Eventos, as forças de defesa e segurança nigerinas mataram três vezes mais civis desde o golpe de Julho de 2023, em comparação com os 12 meses anteriores, e prenderam arbitrariamente civis, principalmente Fulanis.

Nasr comunicou-se recentemente com Amadou Koufa, um pregador Fulani que é o segundo no comando da JNIM. Koufa disse a Nasr que as tácticas de mão pesada utilizadas pelas juntas militares estavam a levar mais pessoas a aderir à JNIM.

“Os abusos dos direitos humanos cometidos pelo Grupo Wagner e pela junta maliana no centro do Mali fizeram com que muitos Fulanis se juntassem aos jihadistas,” disse Nasr. “E Koufa disse que as violações dos direitos humanos perpetradas pelo Grupo Wagner e pelos malianos excederam em muito as violações dos direitos humanos perpetradas pelos franceses quando lá estiveram. Portanto, o factor das violações dos direitos humanos que levam a um maior recrutamento da al-Qaeda é hoje um facto, e ele também o admitiu.”


No final de Agosto, a JNIM reivindicou a responsabilidade de um ataque que matou 200 pessoas, incluindo mulheres e crianças, e feriu 140 na cidade de Barsalogho, no centro-norte do Burquina Faso, um ponto estratégico que alberga a última força militar permanente entre os combatentes da JNIM e Ouagadougou, a capital do país. A junta estava ciente de um possível ataque e apelou os civis a ajudarem os militares a cavar trincheiras destinadas a impedir a entrada de terroristas na cidade, noticiou a Al Jazeera.
Num relatório da Human Rights Watch, Ben Saul, Relator Especial da ONU para a Promoção e Protecção dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais no Combate ao Terrorismo, instou o governo do Burquina Faso “a investigar os relatos de que os civis de Barsalogho foram coagidos a abrir valas para defender a cidade antes do ataque. A ser verdade, a coacção [violaria] o direito internacional.”

Fulanis e outros civis burquinabês poderão ter algum alívio em relação aos mercenários russos, numa altura em que a Agence France-Presse noticia que cerca de 100 desses mercenários foram destacados para a Crimeia, a península ucraniana do Mar Negro anexada pela Rússia, após um ataque ucraniano à região russa de Kursk. Viktor Yermolaev, chefe de uma unidade paramilitar conhecida como Medvedi (Ursos) na Rússia e a Brigada Urso no Ocidente, disse à AFP que havia cerca de 300 combatentes da Brigada Urso no Burquina Faso antes da incursão de Kursk.

“Alguns ficam [no Burquina Faso], claro, temos bases e bens, equipamento e munições, não vamos levar tudo isso para a Rússia,” disse à agência noticiosa.

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