Campanhas de Desinformação Estrangeiras à ‘Escala Industrial’ Alimentam a Raiva e a Confusão

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EQUIPA DA ADF

As campanhas de desinformação que visam manipular os sistemas de informação africanos aumentaram quase quatro vezes desde 2022.

De acordo com o Centro de Estudos Estratégicos de África (ACSS), as campanhas de desinformação estão associadas ao aumento da violência, ao apoio a golpes de Estado, à expansão da retórica antiocidental e à disseminação da confusão sobre os cuidados de saúde. Estas campanhas também contribuem para diminuir a confiança nos meios de comunicação tradicionais.

Cerca de 60% das campanhas de desinformação em África estão ligadas a países fora do continente. Os esforços, apoiados por tecnologias emergentes, são sobretudo conduzidos pela Rússia, embora a China, o Qatar, a Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos também promovam narrativas falsas, na tentativa de espalhar a sua influência. Estas narrativas artificiais estão a florescer, numa altura em que África conta actualmente com mais de 400 milhões de utilizadores activos das redes sociais e 600 milhões de utilizadores da internet.

Das actuais 23 campanhas transnacionais de desinformação em África, 16 são patrocinadas pela Rússia, que também enviou milhares de mercenários para zonas de conflito. De acordo com o ACSS, dois importantes influenciadores da desinformação ligados à Rússia têm, em conjunto, mais de 28 milhões de utilizadores nas redes sociais.

“Aqui, as notícias falsas russas são produzidas à escala industrial,” Abdoulaye Guindo, coordenador do Benbere, um site de verificação de factos sediado no Mali, disse ao jornal The New York Times. “A proeza das contas pró-russas é inegável.”

No Mali, uma estação de rádio sediada em Bamako emite agora um podcast de notícias russas todas as noites.

“Esta é a forma de Moscovo se expandir em África,” Séga Diarrah, um jornalista maliano, disse ao jornal. “Com mercenários e meios de comunicação social.”

Quase 40% das campanhas de desinformação registadas no continente situam-se na África Ocidental, sendo a Rússia responsável por cerca de metade delas. Um vídeo animado online mostrava um mercenário russo a juntar-se aos soldados da África Ocidental para derrotar uma horda de zombies franceses invasores. A Rússia enviou milhares de mercenários para apoiar governos africanos amigos e para extrair ouro e outros recursos naturais.

“Estamos a enfrentar um colosso,” o General Pascal Ianni, um oficial militar francês encarregue de combater as operações de desinformação da Rússia na África Ocidental, disse ao The New York Times. A Rússia também inundou durante anos a região do Sahel com esforços de desinformação, sobretudo o Burquina Faso, o Mali e o Níger. A Rússia começou por instigar, e depois aplaudiu, quando os líderes militares derrubaram os governos dos três países. Após o golpe de Outubro de 2022 no Burquina Faso, por exemplo, as redes de desinformação ligadas ao Grupo Wagner da Rússia procuraram alimentar rumores de um golpe no Níger.

A tomada de poder pelos militares do Níger ocorreu em Julho de 2023. Os esforços de desinformação russa elogiaram o golpe como uma bênção para os nigerianos e encorajaram a repressão violenta de manifestantes pró-democracia em Niamey, afirmando que o golpe era uma expressão da soberania popular.

Dois importantes meios de comunicação franceses foram suspensos no Mali e no Burquina Faso, onde os dirigentes alinhados com a Rússia expulsaram repórteres franceses. No dia 8 de Outubro, o Burquina Faso suspendeu as emissões da Voz da América durante três meses devido à sua cobertura dos ataques de militantes no país e no vizinho Mali, de acordo com a The Associated Press.

Este tipo de acções “criou espaço para os meios de comunicação social favoráveis a uma narrativa pró-russa,” a Repórteres sem Fronteiras disse num estudo recente. Outras mensagens russas têm angariado apoio para a sua guerra com a Ucrânia e têm levado à desconfiança em relação aos esforços de combate à malária.

O relatório do ACSS concluiu que os países africanos que mantêm limites de mandatos presidenciais
estão menos expostos a campanhas de desinformação patrocinadas por estrangeiros. Estes países democráticos têm actualmente uma média de 1,5 campanhas de desinformação, em comparação com uma média de mais de três campanhas nos países sem limites de mandatos.

“Isso sublinha o objectivo comum da desinformação estrangeira de apoiar os actores autoritários,” escreveram os analistas do ACSS.

O The New York Times também encontrou provas de que empresas chinesas estão a ajudar a difundir conteúdos russos no continente. A StarTimes, um fornecedor chinês de meios de comunicação social e de televisão por satélite, disponibilizou o canal Russia Today, ou RT, apesar de outras empresas o terem abandonado.

De acordo com Kenton Thibaut, investigador residente da China no Laboratório de Investigação Forense Digital do Atlantic Council, os esforços de propaganda externa da China têm registado um rápido crescimento ao longo dos anos. No Zimbabwe, onde a China apoia o partido político no poder, a União Nacional Africana do Zimbabwe-Frente Patriótica (ZANU-PF), os jornais estatais são vistos como altamente favoráveis a Pequim.

O jornal Zimbabwe Herald, controlado pelo Estado, produz propaganda antiocidental que a China apoia, como a divulgação de narrativas segundo as quais a expansão da Organização do Tratado do Atlântico Norte causou a guerra na Ucrânia e que as críticas ocidentais às políticas chinesas em matéria de direitos humanos são inexactas.

Os meios de comunicação social estatais chineses também utilizam as matérias do Herald no seu próprio conteúdo, muitas vezes, definindo as narrativas chinesas como reportagens originais do Zimbabwe. O conteúdo dos meios de comunicação social estatais chineses é também desproporcionadamente utilizado nos noticiários locais, tornando difícil distinguir o que é propaganda estatal, conteúdo de acordos de partilha de notícias ou reportagens independentes, segundo Thibaut.

“No caso do Zimbabwe, a China deu cobertura política à ZANU-PF para reprimir os jornalistas e os actores da sociedade civil, espalhando uma narrativa que afirmava que as figuras da oposição eram apoiadas por potências estrangeiras que procuravam minar o governo,” escreveu Thibaut.

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