EQUIPA DA ADF
Mais de 500 dias depois de ter começado, a sangrenta guerra do Sudão entre generais rivais parece não ter fim, uma vez que ambas as partes se recusam a discutir a paz e, pelo contrário, prometem continuar a lutar.
“Não vamos baixar as armas enquanto a rebelião continuar. Não coexistiremos com os rebeldes e não lhes perdoaremos,” declarou em Agosto o chefe das Forças Armadas do Sudão (SAF), General Abdel Fattah al-Burhan, chefe de facto do país, ao denunciar a última tentativa internacional de negociar o fim dos combates.
Desde o início dos combates, em Abril de 2023, entre as SAF de al-Burhan e as Forças de Apoio Rápido (RSF), controladas pelo seu rival, o General Mohamed Hamdan “Hemedti” Dagalo, vastas zonas do Sudão foram devastadas. Infra-estruturas cruciais foram danificadas ou destruídas. A produção agrícola registou uma quebra de 60% ou mais. Mais de 10 milhões de pessoas estão deslocadas, muitas das quais correm o risco de morrer à fome.
Enquanto os generais se recusam a ceder, os cidadãos sudaneses estão a escolher um lado. Mohamad Awadallah, um comerciante, juntou-se recentemente a um grupo de novos recrutas para treino num antigo estádio de futebol em território controlado pelas SAF.
Awadallah juntou-se às SAF depois de os combatentes das RSF terem tomado o controlo do seu Estado natal, Sennar.
“Em Sennar, eu vi a morte,” Awadallah disse à PBS News. “Houve violações. As RSF estavam a matar qualquer pessoa que encontrassem pela frente. A situação no país está a piorar e temos medo de ser novamente deslocados para um outro Estado.”
Awadallah faz parte da tentativa das SAF de fazer recuar as RSF, que capturaram alguns dos territórios mais importantes do ponto de vista económico do Sudão. As RSF controlam a maior parte do Darfur, onde se situam as principais minas de ouro, a região do Cordofão, rica em petróleo, grande parte da região da capital e terras agrícolas importantes no sudeste. No início de Agosto, as RSF fizeram a sua primeira incursão no Estado do Nilo Azul, controlado pelas SAF.
As SAF controlam a costa do Mar Vermelho e os seus portos, o corredor do Rio Nilo e as terras agrícolas do Estado de Gedaref. Este ano, as SAF retomaram a emissora nacional em Omdurman. No início de Setembro, as RSF defenderam-se de um ataque a uma instalação das SAF em Khartoum Bahri.
Com a ajuda de milícias aliadas, as SAF continuam a controlar o Dafur do Norte, impedindo as RSF de se deslocarem para o norte e para o leste, em direcção a Port Sudan. O Darfur do Norte alberga três campos de pessoas deslocadas e cerca de 500.000 pessoas que fugiram dos combates mais recentes. Os ataques aéreos das SAF e os bombardeamentos das RSF destruíram grande parte da capital, el-Fasher, e das comunidades vizinhas.
“A situação em el-Fasher é caótica,” Michel-Olivier Lacharite, director do programa de emergência da organização Médicos Sem Fronteiras, disse à Al Jazeera.
Desde Abril de 2023, mais de 7,1 milhões de sudaneses fugiram dos combates, alguns mais do que uma vez. Juntam-se a quase 3 milhões de outras pessoas deslocadas que já vivem no país.
Mais de 2 milhões de sudaneses fugiram completamente do país. Muitos vivem em campos na República Centro-Africana, no Chade, no Egipto e no Sudão do Sul. A ONU descreve a situação do Sudão como a pior crise de deslocações do mundo.
Todos os 18 Estados do Sudão registam deslocações. Embora os números sejam mais elevados na região de Darfur, os Estados de Gedaref, Sennar e Nilo Branco viram as suas populações deslocadas aumentar para 10 vezes o seu tamanho antes do conflito, de acordo com a Organização Internacional para as Migrações (OIM) das Nações Unidas.
“Imaginem uma cidade do tamanho de Londres a ser deslocada. É assim que as coisas são, mas estão a acontecer com a ameaça constante de fogo cruzado, com fome, doenças e violência étnica e de género brutal,” Amy Pope, Directora-geral da OIM, disse num comunicado recente.
Até ao mês passado, as RSF e as SAF bloquearam os carregamentos de alimentos e medicamentos por receio de que o material beneficiasse os seus inimigos. Os bloqueios colocam milhões de sudaneses em risco de morrer à fome. As más condições das estradas durante a estação das chuvas têm dificultado a distribuição de alimentos desde que as partes beligerantes abriram as fronteiras às colunas de ajuda.
Apesar do sofrimento do povo sudanês, nenhum dos generais parece disposto a ceder. No final de Agosto, al-Burhan recusou-se a enviar negociadores para uma nova conferência de paz na Suíça. Declarou que as suas forças lutariam contra os seus rivais por “100 anos.”
As anteriores conferências de paz realizadas na Arábia Saudita e no Bahrein não conseguiram pôr termo aos combates, tal como o Painel de Alto Nível da União Africana sobre o Sudão, lançado este ano.
Ambos os lados continuam a receber apoio do exterior — os Emirados Árabes Unidos e o Marecharl Khalifa Haftar, da Líbia, no caso das RSF, o Egipto e a Arábia Saudita no caso das SAF.
Na mesa de negociações em Genebra, o coordenador-chefe da ONU para o Sudão, Mukesh Kapila, resumiu a situação da seguinte forma: “Não me parece que os dois beligerantes estejam interessados em falar um com o outro.”