‘Ofensivas Mediáticas’ Chinesas Visam Público Africano

EQUIPA DA ADF

Durante uma visita à Tanzânia em 2023, Paul Nantulya não pôde deixar de reparar nas antenas parabólicas de televisão StarTimes que estavam a ser instaladas em casas e empresas por todo o país. Ele referiu ainda a prevalência de equipamento de banda larga da Huawei e da ZTE.

Especialista em política externa chinesa, Nantulya iniciou uma conversa com alguém sobre a plataforma StarTimes e o domínio das infra-estruturas de comunicação digital chinesas no seu país.

“Perguntei-lhe se sabia se se tratava de um serviço chinês e ele disse que não sabia,” Nantulya disse numa entrevista concedida a 25 de Abril ao China-Global South Project.

O homem explicou que a StarTimes é popular porque oferece instalação gratuita e não tem taxas de subscrição. O nível mais barato do seu pacote de televisão custa cerca de 1 dólar por mês e oferece aos clientes 30 canais, mas os seus únicos canais de notícias internacionais são dois meios de comunicação social de 24 horas que pertencem e são operados pelo Partido Comunista Chinês (PCC).

“Isso é apenas uma ilustração para mostrar o tipo de penetração, o tipo de pesquisa de mercado que estas empresas de comunicação social fizeram,” disse Nantulya, um investigador do Centro de Estudos Estratégicos de África (ACSS).

A maioria dos consumidores africanos de meios de comunicação social não sabe que está a ser exposta a meios de comunicação social financiados pela China. Nantulya disse que isso é intencional, o produto de décadas de estratégia de guerra de informação que continua a ser aperfeiçoada de forma cada vez mais furtiva. Num relatório recente para o ACSS, classificou as tácticas da China de “ofensivas mediáticas.”

“Esta perspectiva combativa da influência dos meios de comunicação social é um elemento essencial do pensamento oficial chinês,” afirmou. “É dada muita atenção ao assunto. O domínio dos meios de comunicação social é visto como um campo de batalha.

“Isso não é novidade. Isso remonta à década de 1950, quando as agências de comunicação chinesas tinham este enquadramento de combate.”

A investigação demonstrou que a China gasta bilhões de dólares por ano em campanhas de desinformação a nível mundial. Fez enormes investimentos em África e utiliza uma série de abordagens para espalhar a sua influência e reprimir as críticas às suas políticas.

A StarTimes, empresa estatal chinesa, tornou-se o segundo maior fornecedor de televisão digital em África, com mais de 13 milhões de assinantes de televisão digital e 20 milhões de assinantes de streaming.

A Xinhua, a agência noticiosa oficial da China, conta com 37 gabinetes em África — muito mais do que qualquer outra agência noticiosa — um aumento dramático em relação aos poucos gabinetes de há duas décadas.

Os peritos dizem que a grande presença de meios de comunicação social estatais chineses no continente não tem provavelmente um impacto significativo na opinião pública, mas os meios de comunicação social chineses representam apenas os fluxos oficiais de informação que Pequim coloca estrategicamente em África.

“O que é mais interessante são todas as outras coisas que o PCC está a fazer para tentar influenciar este espaço de informação, e é nesses outros espaços que as coisas estão a tornar-se um pouco mais criativas e um pouco diferentes,” Dani Madrid-Morales, professor de jornalismo global da Universidade de Sheffield, disse durante uma edição de 26 de Outubro de 2023 do podcast China in Africa.

Madrid-Morales, especialista em desinformação em África, destacou várias das estratégias recentes da China no continente.

Acordos de partilha de conteúdos: O conteúdo gratuito que a Xinhua oferece a muitas operações noticiosas africanas mal financiadas pode parecer uma tábua de salvação. Mas os leitores raramente se apercebem de que grande parte desse conteúdo foi originalmente produzido em redacções chinesas.

“Está a haver alguma lavagem de informação, em que a fonte original do artigo desaparece e depois é apresentada ao público como se viesse de um jornalista local ou de uma organização noticiosa local,” disse Madrid-Morales.

Infra-estrutura gratuita: As empresas chinesas forneceram equipamento gratuito e reconstruíram as instalações de radiodifusão para a transmissão digital.

Meios de comunicação pagos: A China assinou contratos de longo prazo para fornecer conteúdos a vários jornais africanos, criando um fluxo de receitas que, nalguns casos, têm sido utilizadas para manipular a cobertura.

Excursões de comunicadores: A China paga a visita de milhares de jornalistas e influenciadores de conteúdos africanos para uma formação alargada. Só no Quénia, as agências de comunicação chinesas empregam centenas de jornalistas africanos.

Segundo Nantulya, estes meios de comunicação quenianos produzem cerca de 1.800 notícias por mês.

“Não há um único jornalista chinês ou um único rosto chinês nessas reportagens,” disse Nantulya. “Estas são reportagens que estão a ser publicadas por jornalistas africanos que são pagos por estas diferentes entidades.”

Joseph Odindo, um jornalista queniano formado na China, é um antigo director editorial do maior conglomerado de meios de comunicação social da África Oriental e Central, o Nation Media Group. Afirmou que era difícil manter o controlo da sua força de trabalho.

“Tivemos de elaborar uma tabela que nos permitisse ver quem estava em formação na China num determinado momento, quem deveria regressar e quem seria o próximo — caso contrário, metade da nossa redacção poderia estar em Pequim a receber formação,” disse ao ACSS.

Nantulya receia que todo o panorama mediático de África tenha sido dominado pelas ofensivas sistemáticas da China.

“Para um público africano normal, propaganda é uma palavra suja,” disse. “Estão a doutrinar as pessoas. Porém, no contexto chinês, a propaganda é, de facto, um instrumento de política.”

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