EQUIPA DA ADF
O recente motim do Grupo Wagner da Rússia e as potenciais alterações às operações do grupo de mercenários em África podem abrir espaço para a China expandir a sua própria pegada de segurança privada no continente, segundo os especialistas.
Desde 2010, a China tem destacado um pequeno, mas crescente, número de empresas militares privadas (EMP) em África, principalmente para proteger projectos construídos no âmbito da sua Iniciativa do Cinturão e Rota. Embora seja difícil obter números exactos, os especialistas estimam que 20 a 40 EMP chinesas operam fora da China. Foram documentadas em 14 países africanos, a maioria das quais na África Oriental ou na África Austral.
Apesar da palavra “privadas” no seu nome, as EMP chinesas são empresas estatais e operam segundo regras estritas, incluindo a proibição do porte de armas. As EMP chinesas não participam directamente em combates e, em vez disso, contratam habitantes locais armados para esse efeito, enquanto treinam a polícia e outro pessoal de segurança nos bastidores.
Os observadores dizem que essas regras podem mudar.
“Embora o crescimento das EMP chinesas ainda esteja limitado pelas restrições que proíbem a posse de armas letais, dada a sua natureza de empresas públicas (SOE) — e a possibilidade de o aumento contínuo da sua dimensão e das suas operações conduzir a intervenções mais combativas num futuro próximo — essas restrições podem ser alteradas ao longo do tempo,” escreveram recentemente os investigadores Jong Min Lee e Samuel Wittman para a revista The Diplomat.
Os dirigentes russos afirmaram que o Grupo Wagner permanecerá em África. No entanto, um vídeo recente de Bangui, na República Centro-Africana (RCA), do início de Julho, mostra centenas — alguns relatos dizem que até 600 — de mercenários do Grupo Wagner a embarcar em aviões para sair do país.
O Grupo Wagner tornou-se uma força dominante na RCA, servindo de conselheiro e guarda-costas do presidente do país e, através de filiais, explorando minas de diamante e de ouro, promovendo as suas próprias marcas de cerveja e de vodka e promovendo o apoio à Rússia através de uma variedade de métodos de propaganda.
O estatuto do Grupo Wagner parece poder mudar após o motim de alto nível do proprietário Yevgeny Prigozhin e a ameaça de marcha em Moscovo em Junho. Desde então, a Rússia tem procurado exercer um controlo directo sobre o Grupo Wagner e as suas filiais, que tinham sido mantidas à distância até ao motim de Prigozhin.
Uma redução da presença do Grupo Wagner em África pode deixar os seus clientes actuais e potenciais à procura de um substituto. O massacre de nove cidadãos chineses na mina de Chimbolo, na RCA, no início deste ano, fez parte de um padrão de crescente violência contra a China que poderá levar as EMP da China a adoptar uma abordagem mais militarizada do seu trabalho.
“Os indicadores sugerem que os planificadores chineses vêem vantagens em expandir e amadurecer o uso de empresas privadas, o que cria o potencial para resultados perigosos para a China e para o resto do mundo,” escreveu recentemente o analista Cortney Weinbaum num estudo sobre as EMP chinesas para a RAND Corporation, uma organização sem fins lucrativos e apartidária.
De acordo com Weinbaum, a China está a considerar a possibilidade de utilizar o Grupo Wagner como modelo para expandir as suas equipas de EMP com reformados do Exército de Libertação Popular. A experiência que as EMP chinesas adquiriram com a guarda das minas chinesas no Afeganistão pode desempenhar um papel importante no reforço das suas posições em África, segundo Weinbaum.
“Em última análise, a retirada gradual do Grupo Wagner de África devido à guerra na Ucrânia e o crescimento das EMP chinesas permitirão à China expandir ainda mais a sua presença no continente africano,” escreveram Lee e Wittman.
No entanto, é pouco provável que a transição seja imediata.
“As EMP chinesas ainda não desenvolveram capacidades equivalentes às dos actores tradicionais na região africana,” escreveram Lee e Wittman.