EQUIPA DA ADF
Novo relatório mostra como o grupo Estado Islâmico tem financiado as Forças Democráticas Aliadas há pelo menos quatro anos, levando a uma escala crescente de brutalidade.
O relatório de um painel de especialistas das Nações Unidas descreve a mais recente evolução da relação entre um dos grupos terroristas mais mortíferos da África Central e o grupo Estado Islâmico, que procura expandir a sua presença no continente depois de ter perdido terreno no Médio Oriente.
As Forças Democráticas Aliadas, baseadas na República Democrática do Congo (RDC), são acusadas de atacar um dormitório no oeste do Uganda em meados de Junho, provocando 41 mortos. Os atacantes incendiaram o edifício, dispararam descontroladamente e depois usaram catanas para cortar os sobreviventes até à morte. Tratou-se do ataque mais mortífero no Uganda em mais de uma década.
“Continuo a ouvir as vozes daqueles estudantes a implorar pelas suas vidas,” disse uma testemunha à BBC. “Não tenho conseguido comer porque não paro de ouvir os gritos das crianças.”
Formadas em 1995, as Forças Democráticas Aliadas, em 2018, juraram publicamente fidelidade ao grupo Estado Islâmico, que as apelidou de Estado Islâmico na República Centro-Africana (ISCAP) e reivindicou alguns dos ataques do grupo no oeste do Uganda e no leste da RDC.
Desde 2017, o Kivu Security Tracker regista 999 incidentes envolvendo as Forças Democráticas Aliadas nas províncias do leste da RDC que fazem fronteira com o Uganda e o Ruanda. Em Outubro de 2020, o grupo Estado Islâmico tinha reivindicado a autoria de 72 ataques na RDC, 65% dos quais directamente relacionados com ataques verificados das Forças Democráticas Aliadas.
De acordo com o rastreador, um grande número de ataques teve lugar do outro lado da fronteira, na província de Kasese, no Uganda, onde ocorreu o tiroteio numa escola em Junho.
De acordo com o relatório da ONU, o grupo Estado Islâmico tem financiado as Forças Democráticas Aliadas desde 2019 através de uma rede de mecanismos financeiros que passam pelo Quénia, Somália, África do Sul e Uganda. O relatório também observa que as Forças Democráticas Aliadas enviaram combatentes para além da sua base no Kivu do Norte e em Ituri, numa tentativa de expandir as suas operações na região — possivelmente até à capital da RDC, Kinshasa.
“É de notar que o seu objectivo é levar a cabo actos de terror que façam grande publicidade,” disse o porta-voz do governo da RDC, Patrick Muyaya, numa conferência de imprensa após a divulgação do relatório da ONU.
A viragem das Forças Democráticas Aliadas para o grupo do Estado Islâmico foi mais pragmática do que ideológica: um membro do grupo que se opunha à viragem disse aos analistas que a esperança era que o grupo Estado Islâmico os “enchesse de dólares, armas e munições,” de acordo com um relatório de 2021 do Programa sobre Extremismo, da Universidade George Washington.
As Forças Democráticas Aliadas terão matado milhares de civis e centenas de soldados e terão deslocado centenas de milhares de outras pessoas na RDC na última década. Desde 2019, as actividades das Forças Democráticas Aliadas têm merecido destaque nos meios de comunicação social do grupo Estado Islâmico.
“É evidente que o Estado Islâmico está a tirar partido destas actividades para demonstrar que continua a ser um movimento relevante e activo com um amplo alcance transnacional, apesar da perda de controlo territorial na Síria e no Iraque,” escreveram os analistas do Programa sobre Extremismo, no seu relatório “O Estado Islâmico no Congo.”
O relatório da ONU também encontrou ligações entre as Forças Democráticas Aliadas e a milícia Ahlu Sunnah Wal Jama’a em Moçambique, que também declarou lealdade ao Estado Islâmico.
Com filiais formais do Estado Islâmico e grupos pró-Estado Islâmico espalhados por toda a África, o potencial de colaboração transfronteiriça e o movimento de um maior número de combatentes estrangeiros podem ameaçar a estabilidade regional, segundo o relatório.